Essa é uma história daquelas impossíveis, de um escravo que se tornou um lendário cantador-rei na Paraíba. Mesmo sem saber ler ou escrever ele revolucionou a vida dos poetas do Sertão, com um pandeiro na mão o negro deixou de ser escravo para se valer como Inácio da Catingueira
Não se sabe muito sobre o começo de sua vida, aliás há muita coisa que se mistura com o imaginário popular. Mas de certo ele viveu em um povoado conhecido como Catingueira no século XIX. Nasceu ali em 1845 de Catarina, africana que foi batizada só com 118 anos de idade
A poética do Cordel foi muito influenciada pelos cantadores africanos (griotes), especificamente dos Bantus. A maior parte dos países Africanos, eram sociedades da palavra. E mantinham não apenas suas histórias, mas as habilidades de contá-las bem guardadas pelos anciãos
Reza a lenda que Inácio era tão preciso nos versos que seu talento foi logo reconhecido pelo dono da fazenda Bela Vista, em que ele vivia. Manoel Luiz, ambicioso que era, percebeu que tinha mais proveito se o escravo saísse da lavoura para se apresentar nos vilarejos vizinhos
Há quem diga que ele se tornou um “escravo de ganho”, daqueles que tinham a liberdade de andar e ganhar dinheiro, mas pagava uma boa parte para seu dono. Dentro do contexto, era uma posição melhor para um negro. De tanto duelar e vencer por aí, o nome do repentista ficou famoso
Quem não gostou dessa fama toda foi um outro repentista, dono de uma pequena fazenda que sustentava seus versos com uma viola ao invés do simples pandeiro. Romano da Mãe D'Água desafiou o escravo para aquele que foi conhecido como Duelo de Titãs na cidade de Patos
Aquele duelo foi um vale tudo pela honra do cantador. Tão intensa a peleja que durou cerca de 8 dias. A provocação foi a essência do desafio nas redondezas da Igreja da Conceição em praça pública. A cidade toda se agitava para assistir, padres e juízes determinariam o vencedor
Romano usou a cor de Inácio para menosprezá-lo. Mas este retribuiu o desafeto com versos convictos de sua força
Seu Romano, eu lhe garanto
Que resisto ao seu martelo;
Ao talho do seu facão,
Ao corte do seu cutelo;
Se eu morrer na peleja,
Lhe vencerei no duelo.
Em uma das versões dessa história o fazendeiro apelou para uma estrofe repleta de mitologia grega que fez Inácio protestar, levando-o a vitória no imaginário dos cantadores na região da Paraíba e do escritor Graciliano Ramos. Alguns dizem que o negro ganhou até alforria
Anos depois Inácio da Catingueira morreu de pneumonia e foi enterrado em uma Praça no centro da cidade que recebeu hoje o seu nome e uma estátua em sua homenagem. Sua peleja com Romano é considerada o maior dos duelos na história dos cantadores.
130 anos depois, seu legado prevalece nas emboladas de coco e na trajetória de outros negros que carregam consigo o poder ancestral das narrativas orais. Mestres da rima e do duelo, caras como o @emicida que trouxe à tona o nome de Inácio da Catingueira em seu novo trabalho
“Inácio parece uma resposta, mas é um convite à reflexão, sobre quem são os reais inimigos dos que dizem lutar por igualdade mas gastam seu tempo, munição e energia dando tiros em espelhos, que refletem a si mesmos”
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Quando os primeiros navegantes se depararam com pessoas negras nos séculos XVI eles as descreveram como "seres imundos e inferiores", muitas vezes relacionavam o mau cheiro à pele negra.
O mito racial que se consolidou nos séculos seguintes defendia uma total distinção das características físicas e mentais entre negros e brancos, mesmo no Brasil os intelectuais do início da República (até alguns abolicionistas) defendiam essa crença
"A Raça Megra no Brasil, por maiores que tenham sido seus incontestáveis serviços à nossa civilização... há de constituir sempre um dos fatores da nossa inferioridade como Povo" - Nina Rodrigues
As vezes me perguntam como eu consigo ter amigos de vários espectros políticos e a resposta está na realidade: minha família é assim, tem todo tipo de gente, de reacionário fã de milico à petista roxo.
Acho que essa dicotomia esquerda vs direita tem contornos mais definidos na internet e também nas capitais, porque no interior é tudo meio nublado e até mesmo candidatos da esquerda exibem um conservadorismo com pautas de "família tradicional" e armamentista 😐
É uma bagunça, que a gente tenta organizar distribuindo informação, conversando sobre assuntos que nem sempre conseguimos aqui nas redes sociais. Tenho um tio que é gado bolsonarista e esses dias tava concordando que a corrupção na polícia é um dos maiores problemas
Saí do painel da UFRJ inspirado por conhecer outras visões sobre #Afrofuturismo. Aliás é interessante perceber que a discussão partindo do pessoal da tecnologia pode ter contornos bem diferentes da arte, pois eles tentam materializar um imaginário afrofuturista em nossa realidade
Enquanto eu, como ficcionista, não me interesso em construir mundos possíveis, mas de fazer a jornada da exploração imaginativa, que pode até explicar uma essência científica, porém pretende extrapolar ela.
Hugo Gernsback, por exemplo, define o SCIFI como "Um romance cativante, entremeado de fatos científicos e uma visão profética"
Hugo dá nome a um dos principais prêmios do gênero, recebido pela mãe do Afrofuturismo, Octavia Butler com a obra Speech Sounds e Bloodchild
A grande substituição é uma teoria criada por supremacistas que teorizam sobre o genocídio branco através da miscigenação e da imigração em países Europeus. Ela foi citada pelo terrorista que matou 51 pessoas em um massacre em duas mesquitas na Nova Zelândia (2019)
"A crise de imigração em massa e níveis sub-reposicionários de fertilidade são um ataque contra o povo Europeu, que se não combatido, resultará na completa reposição racial e cultural do povo Europeu." - Trecho do Manifesto Terrorista
Esse tipo de propaganda é distribuída também por alguns grupos NeoNazistas no Brasil e seu pensamento é bastante compartilhado por membros da extrema-direita.
A abolição da escravatura não pode ser reduzida a uma história da Disney, onde os heróis são simplesmente reis e princesas. Diversos nomes ecoaram como o brado da liberdade, um deles eu conto aqui: Prudhome, o José do Patrocínio #13deMaio
Conhece a expressão "filho do padre", é assim que começa a saga do José. Filho de um vigário que engravidou Justina do Espírito Santo, uma menina de 15 anos, escravizada em Campos dos Goytacazes (RJ). Mesmo sem reconhecer o moleque, o mandou pra viver na sua fazenda
Viveu entre os negros escravizados e assistia de perto cada castigo imposto aos seus iguais. As cenas alimentaram sua alma com um sentimento que ainda não tinha nome, mas que podemos chamar hoje de "liberdade negra".
Criei uma série para contar as histórias dos grupos supremacistas brasileiros e personagens do submundo que agora estão se organizando graças aos sinais emitidos pelo governo Bolsonaro
Listei alguns dos principais episódios pra ficar por dentro dessa conversa
Começando pelos nazistas que estavam escondidos no país (e outros que não precisaram se esconder)