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Parte de como o capitalismo funciona é a criação de necessidade constante. Quem tem pouco, necessita para sobreviver e aceitará trabalhar por pouco. A quem tem algum farão sentir que nunca chegará. Quantos de nós estarão confortáveis no mês seguinte se ficarmos sem salário (1/15)
subitamente? E a quem tem muito, igual. Uma empresa manter o seu sucesso e nível de receitas de ano para ano é visto como um falhanço. Para os que têm accionistas então, há a pressão para “cortar gorduras” se as receitas não aumentarem, para haver mais (2/15)
dividendos para distribuir. Vimos isso nos CTT e em dezenas de outras grandes empresas em Portugal. O capital exige retorno, cada vez mais retorno. Isso põe-nos em competição artificial uns com os outros. Artificial porquê? Porque vivemos já numa situação de abundância. (3/15)
Já temos capacidade produtiva para todos. Mas está mal distribuída e restrita a quem pode pagar. Há comida, casa e energia suficiente para todos. Mas o mercado precisa de criar escassez artificial para poder cobrar pelo que concordámos que eram direitos humanos. (4/15)
Esta necessidade constante expansão tem os efeitos nocivos que sabemos no ambiente, na destruição de “natureza” que não dá lucro, mas é essencial para a nossa sobrevivência. Mas como não podia deixar de ser hoje, queria pensar em como o racismo entra neste ciclo. (5/15)
Historiadores saberão explicar melhor como o capitalismo moderno foi essencialmente criado com o comércio de escravos e como o racismo moderno foi criado para o justificar moralmente. As noções de “raça” que ainda nos assombram são construções recentes, que não surgem (6/15)
antes não porque não tivessemos contacto com outros povos (tínhamos) mas porque precisávamos de pretextos para cometer o que já sabíamos que era desumano “entre nós”. Porque se tornou lucrativo fingir que havia categorias diferentes de pessoas. Mas e hoje? (7/15)
O modelo de pensamento da direita é, acima de tudo, hierárquico. Se acreditamos na igualdade, precisa de se justificar então porque não somos iguais na prática. Entre os liberais é o mérito, entre a extrema direita é a biologia ou as “culturas superiores.” (8/15)
Na prática o resultado é o mesmo. Qual a desculpa que usamos para justificar que a hierarquia que queremos manter não é injusta? Como podemos encaixar os benefícios de pilhagens passadas com a nossa moralidade atual? No primeiro caso o racismo serve de engodo que se (8/15)
Auto-alimenta. A pobreza de minoria, despida de história e desculpada com excepções, serve para justificar o mau tratamento das mesmas. São imigrantes que vêm roubar empregos mas são preguiçosos. Vêm roubar quotas na faculdade, mas não querem estudar. E claro, depois de (9/15)
lhes negarmos essas oportunidades, basta uma minoria recorrer ao crime para se justificar violência sobre todos os indivíduos dessa comunidade. Não falamos sobre os patrões que querem pagar menos e querem trabalhadores a competir entre si. Não falamos de sindicatos para (10/15)
proteger todos os trabalhadores, independentemente da sua origem. Não falamos de melhorar as escolas mais pobres, mas de puni-las pelos seus maus resultados académicos. Não falamos de melhorar habitação ou estado social, mas de tirar o RBI aos “subsidiodependentes”. (11/15)
A escassez artificial alia-se à categorização da “meritocracia” e do racismo para dizer às pessoas que têm de escolher entre a sua família e as dos outros. A recusar programas universais e solidariedade para nos elevar a todos em troca de caridadezinha. (12/15)
No fim, o racismo serve para nos pôr a olhar para o lado e não para cima. Estamos todos dentro desta água. Há muito a desconstruir. Temos muito apego aos nossos mitos criadores e ao nosso ego. O mito da invisibilização da raça será usado para esconder injustiças. (13/15)
E a decontextualização (histórica e de poder e pessoal, o “mas eu não sou racista”, “mas eles são mais”, “mas eu tenho um amigo”) servem sempre para não falar do que se deve fazer. E é essa a pergunta. Se deixármos todos de fingir que não há um problema. Se abraçarmos (14/15)
a urgência da solidariedade e do reconhecimento da injustiça sem perguntar “então mas e a minha injustiça?”... podemos perguntar “o que vamos fazer em relação a isto?” e aí a imaginação é o limite. Sejam bons uns para os outros. (15/15)
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