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Sobre a imunidade de rebanho e o paper da Science, que foi comentado aqui pelo editor blogs.sciencemag.org/editors-blog/2…
Temos que tomar cuidado com a interpretação do trabalho. Do ponto de vista da geração de conhecimento, o trabalho é interessante. Mostra que para calcular uma possivel imunidade de rebanho natural temos que levar em conta a heterogeneidade da população e comportamento
Considerando que a populacao nao é homogênea e 100% suscetível, e que nem todos tem o mesmo potencial de transmissão. Analisando esses parâmetros, os autores chegam a um numero de infecção natural de 43%, que poderia ser protetora.
Mas os próprios autores fazem a ressalva de que isso só mostra como a heterogeneidade afeta o cálculo. E também alertam para o fato de que partiram do pressuposto de que quem teve a doenca está imunizado, e por um longo período. E essa informacao nao temos na realidade.
é importante portanto, separar os conceitos. Imunidade de rebanho em vacinas nao é a mesma coisa que imunidade de rebanho natural, que daqui pra frente vou chamar de imunidade coletiva natural para diferenciar.
A imunidade de rebanho em vacinas é o percentual da população que precisamos vacinar para impedir a circulação da doenca e proteger os vulneráveis, aqueles que nao podem ser vacinados ou pq nao tem idade ainda, bebes e crianças, ou pq sao imunossuprimidos.
Mas quando fazemos isso com vacinas, temos algumas certezas que nao temos quando tentamos a imunidade natural coletiva. Quando vacinamos, usamos uma formulação igual para todos, que garante, porque já foi testada, que a pessoa ficará imune.
Sabemos quanto tempo essa imunidade vai durar, e sabemos se a transmissão será impedida. Ou seja, podemos prever os resultados da campanha de vacinação. Além disso, se fizermos uma boa campanha, garantimos uma boa cobertura, saberemos que a imunidade estará bem distribuída.
ou seja, que a imunidade alcançada pela vacina será abrangente e homogênea. E assim, garantimos que a transmissão é reduzida ao mínimo, e os vulneráveis estao protegidos. Assim erradicamos a varíola, e quase erradicamos a pólio.
Mas em uma doenca nova, nao sabemos com certeza se quem já teve a doenca está imune. Nao sabemos por quanto tempo. E nossa medida de soroprevalencia nao é muito confiável porque a producao de anticorpos IgG nao tem sido observada de forma consistente.
Algumas pessoas se recuperam e nao produzem IgG, outras produzem mas a quantidade cai após 2 meses. Assim, usar anticorpos como marcador de prevalência nao parecer ser uma boa ideia. E aí como vamos calcular os suscetíveis?
Pois é, no momento nao sabemos. Sabemos que algumas pessoas sao naturalmente imunes, claro. Algumas pessoas se livram do vírus só com resposta inata, outras parecem ter uma boa resposta de células T.
E outras ainda, podem estar protegidas por reações cruzadas de células T com outros Coronavirus de resfriados. Assim, eu concordo com os autores que o numero de suscetíveis talvez seja muito menor do que imaginamos.
mas com os parâmetros que temos, fica muito difícil calcular esse número. E os 43% seriam medidos como entao? Considerando que fosse um numero real? Assim, é possivel que tenhamos uma imunidade coletiva antes do esperado?
é possivel sim. mas isso nao é o mesmo que uma imunidade de rebanho atingida com vacina. Somente essa realmente protege os vulneráveis. Uma imunidade natural no máximo fará com que a doenca seja mais controlável. Menos pandêmica e mais endêmica, com surtos localizados.
ou seja, muita gente ainda morre. Até porque, como a doenca nao se espalha de forma homogênea como uma campanha de vacinação, teremos ilustres de vulneráveis que só vamos conseguir identificar quando aparecerem surtos.
mais ou menos como os surtos de sarampo que apareceram porque a cobertura vacinal caiu, e o virus voltou a circular a atingiu vulneráveis. E veja como isso aconteceu mesmo com vacinas.
é claro que os números sao muito menores. e é bom imaginar que tem menos gente suscetível hoje à doenca, e que grandes cidades que reabriram podem estar vivenciando isso. mas isso nao quer dizer que estamos protegidos e devemos relaxar.
porque ainda temos grupos vulneráveis que precisam de proteção. e imunidade de rebanho de verdade só se alcança com vacina. o que acontece quando morrem os suscetíveis e sobram os resistentes é que o virus circula menos por um tempo. até voltar de forma endêmica e em surtos.
que é provavelmente o que veremos até ter vacinas em numero suficiente para vacinar em massa a populacao. e isso vai demorar. e até lá, vamos deixar os estudos serem estudos. nem tudo que sai na Science deve ser automaticamente usado para nortear politicas publicas.
o conhecimento é sempre útil. e interessante. mas politicas publicas devem ser feitas com cautela, lembrando que mortes evitáveis devem ser evitadas. nao há por que deixar de usar máscaras ou de seguir as medidas de segurança enquanto avançamos nas respostas sobre o virus.
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