Para entender como normalizamos 100 mil (nós, não o governo) é preciso pensar que nossa história nunca se redimiu de nenhum massacre, genocídio e extermínios de povos ou indivíduos. Nós nunca impusemos isto ao Estado e ele sempre nos impôs a morte. Não basta só vontade.+
Nunca houve reparação para os etnocídios indígenas, tampouco para o extermínio causado pela escravidão. Nós nunca passamos esta conta para a elite escravocrata que pôde deixar lucros e terras de herança, mas não pagaram pelos crimes.+
Então estou falando que nós temos um problema de formação real. A nação é uma engenharia de extração de riquezas daqui para enriquecimento de pessoas de fora do país. E o povo nunca se formou enquanto tal. Como agora o povo poderia reagir?+
Nós temos que aprender a não confundir o desejo (de ter povo) com a realidade (de ser massa explorada). Mesmo esta dor intensa não separa realidade e desejo e seguimos numa confusão. Então o povo não poderá (salvo numa luta revolucionária), de forma alguma, resolver os 100 mil. +
Quem há de resolver é quem criou: a cisão das elites brasileiras que impuseram um golpe no PT. Eles estão numa guerra como nunca. Porém dois setores fundamentais vivem em paz nesta cisão: bancos e latifúndio. São estes nossos inimigos claríssimos.+
E como o povo pode se meter nisto? Nós estamos atrasados no processo de organização e de enfrentamento. Seja pelo estrago feito pelos governos progressistas, seja por falta de programa revolucionário no seio do povo. O fato é que não há dúvida: faltamos com o trabalho de base.+
E se queremos, de alguma forma, construir organizações capazes de enfrentar os dois grandes inimigos (banco + latifúndio) só há um caminho, reconstruir o trabalho na base, reconstruir laços perdidos, ampliar as alianças e marchar onde o lucro deles estão.+
Nós temos que falar com clareza: ou tomamos os meios de produção e congregamos os povos em uma relação de menos dependência destes setores, ou vamos ser reféns de governos progressistas que se aliam e são golpeados por estes dois setores em favor do massacre do povo.+
Por fim, uma recordação. Para acabar com a cisão entre as elites Farroupilhas e as elites do Governo Imperial no final daquela revolução no sul do país, eles decidiram matar os Lanceiros Negros para que não tivessem pretos armados e livres no império.+
Com isso quero chamar atenção que a paz entre as frações de elites se dará sob nossos corpos. E eu não estou falando de COVID-19. Estou falando de direitos, de territórios, superexploração ou sujeição de povos. O acordo de paz de cima é a morte dos de baixo. O que nos resta?+
Eu só vejo a aliança entre as organizações que existem, mas não desde a frente ampla discutida pelos dirigentes descolados. Mas desde baixo para construir as maiores retomadas do país, na cidade e no campo. Para as maiores greves do país. E isso é uma tarefa histórica.
