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Vamos de ECG? Nesse post eu vou explicar breve e resumidamente como o complexo QRS (aquele que mostra o ventrículo batendo) se forma e por que ele se alarga.

E te explicar que nem todo QRS largo é bloqueio de ramo, mesmo que pareça. Vamos lá?
Nível: do básico ao muito avançado.
1/n. O QRS é o complexo que representa a atividade elétrica ventricular. Ele pode ter só um vetor, dois, três, quatro… Em algumas derivações tem três, por isso foi chamado de Q, R, S.
Cada letra corresponde a um vetor, portanto, a uma direção de frente de onda.
2/n. Se você treme ao ouvir a palavra “vetor”, não se preocupe, troca por “direção da onda”que tá tudo bem.
Como é o batimento cardíaco normal?
- Após passar pelo nó AV, o estímulo ganha o feixe de His
- Depois os ramos direito e esquerdo (e os fascículos do esquerdo)
- Purkinje
3/n. Purkinje é uma rede de fibras especializadas em condução rápida e entremeia células miocárdicas. Purkinje recebe o estímulo dos ramos e fascículos e distribui rapidamente pelo coração. Células mais longe de Purkinje têm que passar o estímulo de maneira mais lenta: conexinas.
4/n. Então é assim: um estímulo vem pelo His, se divide em três ou quatro (fascículos do ramo esquerdo + o ramo direito), depois em milhões (Purkinje), aí os miócitos mais próximos batem.
Quem tiver mais longe espera sua vez (conexinas).
Ao fim de 70 ms todo o coração se ativou.
5/n. Qualquer coisa que atrapalhe o passo-a-passo do tweet anterior alarga o QRS em maior ou menor monta
-Bloqueio em His ou fascículos: bloqueios fasciculares ou de ramo
-Destruição/mau funcionamento de Purkinje: atrasos inespecíficos de condução ou bloqueios intraventriculares
6/n. O chato é que, por simplificação didática (importante em certas fases do aprendizado de ECG, mas não pra sempre se você se tornar um cardiologista), as pessoas têm dificuldade em considerar a segunda hipótese: “alargou QRS, procuro bloqueio de ramo”. É por isso que fiz o fio
7/n. Bloqueios de ramo: como um dos lados do coração não recebe o estímulo pela via normal, esse lado inteiro vai ter que despolarizar-se através das lentas conexinas (ou simplificando “célula-a-célula”). Por isso o QRS nesses casos é muito muito largo (> 120 ms).
8/n. Mas não basta a duração. Tem que preencher critérios:

BRD:
- Esses critérios são a simplificação das tais “direções de onda” caso o ventrículo direito não receba estímulo nenhum - aí o VE tem que ajudar.
9/n. BRE:
- Mesma coisa: aqui, como o VE não recebe estímulo nenhum, ele tem que depender do VD que vai ajudar enviando seu estímulo através das conexinas dos miócitos do septo. E depois tem o VE inteiro pra ativar.
- Critérios modernos definem BRE apenas quando ≥ 140 ms.
10/n. Os bloqueio fasciculares (BDAS, BDPI e BFM - fibras médias, quando existem) também alargam o QRS, mas alargam menos, dificilmente passando de 120 ms.
- Mas não é porque ultrapassou esse número cabalístico (figura, em V4-V5), que vira bloqueio de ramo! Tem que ter critério.
11/n. E agora o pulo do gato: bloqueio de Purkinje (ou intraventricular).
Basicamente duas coisas podem acontecer para que Purkinje sofra bloqueio:
- algo mexa diretamente em seu funcionamento
- As células ao redor dessas fibras (e elas próprias, porque são entremeadas) sofram.
12/n. - Imagine que algo está mexendo no funcionamento de Purkinje. Se é assim, o efeito dessa alteração será global: desde o começo até o fim do QRS, gerando complexos ultra largos.
- Agora se uma alteração é pontual em uma parte específica do coração, isso vai ser mais sutil.
13/n. O que mexe diretamente em seu funcionamento?
- Acidose e hipercalemia, basicamente.

O QRS abaixo é super largo, mas não fecha critério para nenhum bloqueio de ramo. É apenas um potássio de 9,2.
14/n. O que mexe pontualmente em seu funcionamento?
- Alterações miocárdicas que podem ser pontuais ou difusas. Alguém com sobrecarga importante do VE inteiro, por exemplo, pode acabar tendo um QRS super largo só por Purkinje (figura).
- Vontade de laudar BRE, né minha filha? Sqn
15/n. Infarto do miocárdio (alteração pontual do músculo cardíaco) pode alargar o QRS porque com miócitos, morre Purkinje.
- É a causa desse tenebroso ECG do sinal da “cauda de tubarão”- QRS muito largo invade o segmento ST
- Qualquer cardiomiopatia pode causar alargamento do QRS
16/n. Fique livre para fazer combinações dos níveis de bloqueio.
- BRD + BDAS (comum em Chagas).
- BRE + bloqueio de Purkinje por hipercalemia
- BDAS + bloqueio de Purkinje por infarto (causa de muitos ainda pensarem que BRE por SCA é comum, quando na verdade é raridade).
17/n. Como pode perceber, a marca para perceber bloqueios intraventriculares são: um QRS largo (> 120 ms) que não fecha critérios para bloqueio de ramo; o QRS é globalmente largo (começo, meio e fim - porque em todo o batimento há influência de Purkinje).
18/18. Muitas dessas figuras e a explicação para isso estão presentes em meu livro de ECG, o “Manual de ECG”, que lancei com a Editora Sanar.

E só nele.

sanarsaude.com/livro/manual-d…
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