Resumo: Este texto mostra como a política de testagem do Brasil possui influência total no controle de possíveis novas ondas de infecções por SARS-CoV-2.
Imagem: incidência de SRAG em Manaus, semana 40. Boletim Infogripe (@marfcg)
Estamos entrando no mês de Outubro de 2020, sétimo mês da epidemia de COVID-19 no Brasil, e estamos passando por discussões de reaberturas e redução de danos, pois estamos verificando uma queda no número de novos casos e óbitos confirmados por dia.
Este debate deve, sim, ocorrer, pois precisamos entender quais as ações e preparações que nos levarão a uma reabertura saudável, mas há um alerta muito importante a se fazer, que deriva da seguinte pergunta: qual o momento ideal da reabertura?
A principal diretriz que nos diz se estamos em um caminho de menor risco para reaberturas é a positividade dos testes, ou seja, a porcentagem de testes positivos em relação ao total de testes realizados.
É importante reforçar que quando falamos de testes, estamos falando de testes RT-qPCR, que são os testes que nos permitem detectar casos ativos, em fase de transmissão. Esta diretriz nos deixa acompanhar se estamos em queda ou se podemos estar iniciando um novo surto/onda.
Aí é que entra a importância da política de testagem: no Brasil, nunca tivemos a política de massificação de testes, que nos permitiria testar um grupo grande de pessoas, mesmo que estas pessoas não procurem os testes,
e assim ter um controle ativo dos casos, como podemos ver nesta figura, extraída do NYC Health, que mostra os testes feitos na cidade de Nova Iorque em relação aos casos positivos:
O que podemos perceber claramente é que mais testes não necessariamente significam mais casos. Basta a epidemia estar sob controle que a positividade permanece baixa. E um dos motivos desta baixa positividade é este “olhar de perto” em cada consequência de cada ação tomada.
A positividade de Nova Iorque está hoje (07/10/2020) em 1,7%, como podemos ver:
O Brasil testa em um formato reativo, ou seja, reage aos doentes que buscam os testes. Isso causa uma positividade muito alta. Não é disponibilizada a positividade de forma explícita nos boletins epidemiológicos,
mas é possível pegar os números de testes totais e testes positivos do boletim, calcular a positividade e traçar em um gráfico, que fica assim:
Com isso conseguimos perceber que estamos testando muito menos do que deveríamos para obter um controle ativo. Um fato importante: Mesmo que o Brasil quisesse tomar a decisão de testar em massa como Nova Iorque, não conseguiria,
pois a quantidade de testes disponíveis não comporta uma testagem assim, ainda mais em um país tão grande.
E o que isso tem a ver com uma nova onda? Pois bem: existe um atraso natural entre as fases de uma infecção, como podemos ver na figura.:
Como testes são reativos, o número de casos não pode ser levado em conta para controle algum. Quando os casos subirem, já será tarde demais. Desta forma, os números mais confiáveis para o controle da epidemia são, infelizmente, o que gostaríamos de evitar: internações e óbitos.
E mesmo assim estaremos olhando para o passado recente, pois a infecção já ocorreu lá atrás, como se viu na figura acima.
Temos mais um fator nessa equação: o comportamento recente que estamos demonstrando, mais voltado à flexibilização, como se a pandemia tivesse repentinamente acabado, pode fazer com que as pessoas deem menos atenção aos sintomas e busquem menos ainda os testes,
criando uma bolha ainda maior de subnotificação, ou seja: quando a curva mudar a tendência de queda para subida, já teremos muito mais infecções não notificadas, gerando um aumento súbito e repentino, similar à primeira onda nos países europeus.
Este fenômeno é totalmente possível de acontecer devido à maneira pouco usual do Brasil para lidar com a pandemia, prolongando o platô por tempo longo demais, mas deixando os casos crescerem a números onde fica inviável fazer rastreamento de contatos (+ de 30.000 casos diários).
Isso levou a um pensamento cada vez mais focado na redução de danos, reduzindo o receio das pessoas em relação à doença (de forma errônea, já que não há vacina e nem tratamento algum) e as fazendo entrar mais em contato umas com as outras, reduzindo o distanciamento.
E por último, temos o fator da faixa etária. Se tivéssemos testes ativos, e um número de infectados por faixa etária disponibilizado diariamente, conseguiríamos aprimorar os modelos para prever um possível surto antes deste chegar aos mais vulneráveis.
Como já mostramos no texto da Rede Análise Covid-19, onde falamos sobre reabertura das escolas, as infecções nas faixas etárias menores possuem duas características:
uma menor taxa de pacientes graves (então os casos aumentam mas as internações e óbitos não) e, justamente pelo fato destes infectados estarem com menos gravidade, ficam mais móveis.
Esse aumento de mobilidade de pessoas jovens infectadas invariavelmente causa um aumento de infecções de pessoas mais vulneráveis, que estão fazendo isolamento físico, mas acabam entrando em contato com estes jovens.
O dado de infectados por faixa etária por dia é um dado que também (infelizmente) não é disponibilizado, e mesmo que fosse, seria de uma maneira na qual não seria possível executarmos a análise correta,
pelos motivos já descritos anteriormente: testes reativos e atraso nas notificações.
Foi feita uma análise da faixa etária por dia, para os casos positivos, para um jornal da minha cidade, Caxias do Sul, e percebi exatamente isso,
o que já havia acontecido nas escolas em Israel: o contágio passou para as faixas etárias mais vulneráveis apenas após um surto inicial nos mais jovens:
Vejam agora quando começou o aumento dos óbitos na cidade:
Agora estamos passando por um período de propostas de reabertura cuja consequência direta será o aumento da mobilidade dos jovens: escolas, eventos, jogos esportivos, enfim,
e por isso acreditamos ser válido o alerta de que a consequência (aumento dos casos e contaminação dos vulneráveis) é muito plausível.
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Edição sobre captura de tela da cerimônia oficial do governo: (tempo de visualização: 20:38)
Estamos em 23/10/2020. Todos os brasileiros devem ter ouvido a palavra “nitazoxanida” nos últimos dias, pois fomos surpreendidos por um anúncio, no dia 19/10/2020, de que este medicamento trazia benefícios no combate à COVID-19, principalmente na redução da carga viral.
Revisores: Amanda Gonzalez (facebook: amanda.gonzalez.5264), Isaac Schrarstzhaupt (Twitter: @schrarstzhaupt)
Neste texto apresentamos alguns dos resultados do preprint [4] que analisou um banco de dados de pacientes com COVID-19 pelo método de unsupervised clustering method,
obtendo seis aglomerados com sintomas característicos, cada aglomerado tendo sintomas que, de acordo com os autores, podem ser utilizados para indicar como o paciente irá evoluir ao longo do tempo,
Revisão: Fernando Kokubun (@fernandokokubun), Rute Maria Gonçalves-de-Andrade (@rutemga2)
Referência artigo original:
T cells take the lead in controlling SARS-CoV-2 and reducing COVID-19 disease severity | La Jolla Institute for Immunology. (2020). Retrieved 19 September 2020, from lji.org/news-events/ne…
Achados podem explicar porque pessoas com 65 anos ou mais enfrentam um risco maior de adoecer gravemente com COVID-19
Desde que o SARS-CoV-2 foi identificado, pesquisadores procuram entender se o sistema imune causa mais mal do que bem durante a fase aguda da COVID-19.
As queimadas de origem humana têm sido utilizadas como prática comum para manejo do solo. Há registros dessa prática pelos povos indígenas, por exemplo, sempre como cuidado de preservar o seu ambiente,
pois se valorizam e se respeitam as áreas da qual eles dependem para a sua existência. O uso indiscriminado da terra, sem preocupações ambientais, tem seu início com a introdução de grandes monoculturas, criação de gado, mineração e outros processos de abertura das matas,