Esses papo de que os marxistas sabotaram a "identidade nacional" com suas aulas de história é a mesma ladainha da doutrinação marxista, com verniz de erudição.
50 anos atrás (1972) era ditadura militar, que era insuspeita em seu ufanismo e suas formas de ensinar a História do Brasil por meio das noções apologéticas de nação.do século XIX - e retomando os pressupostos racialistas do Von Martius.
Uma outra tese, essa sim mais embasada do que "os marxistas malvados não deixaram a identidade nacional se formar" é que aqui os pais da nação nunca se preocuparam muito em criar uma concepção popular de nacionalidade.
A premissa de Benedict Anderson de que a cultura literária era a principal correia de transmissão das ideias de nação e nacionalismo até meados do século XX encontra no Brasil um dilema: a elite brasileira não permitiu a formação de uma cultura literária de massas.
Ela não apostou na língua escrita como veículo de popularização de suas ideias. De fato, ela inclusive apostou na ideia de que as classes populares eram pouco afeitas a essa cultura e, portanto, estariam presas na oralidade (aquele cheirinho do racismo europeu mesmo).
Foi só no século XX, com a cultura de massas de meios como o rádio e a televisão que se estabeleceram iniciativas nacionalistas capazes de romper com esse descompasso que as próprias elites concebiam.
Lembrando:
- O Brasil não tinha imprensa até 1808.
- Na época da Constituição de 1891, algo em torno de 5% da população era alfabetizada.
- Fomos o último país das Américas a a abolir a escravidão.
Isso tudo foi muito mais prejudicial para a formação da identidade nacional...
...do que o professor marxista malvado que "ousa" criticar o projeto colonial (aliás, a audácia de criticar um projeto de ocupação territorial responsável por instituir o escravismo colonial, né?).
Mas tem mais do que essa coisa conservadora de denunciar o "professor marxista".
No fundo, tem esse desejo de criar uma identidade nacional típica do século XIX, pautada em grandes nomes, os brasileiros "exemplares" cuja vida e obra possa servir de orgulho e exemplo para o povo.
E aí, claro, todo mundo que já saiu do século XIX vira marxista.
De minha parte, até fico agraciado, pois me considero marxista.
Mas muitos colegas não são. Eles só são críticos da concepção de identidade nacional formulada na época da escravidão.
Que deveria ser o mínimo para uma concepção moderna de cidadania.
Mas esse não é o propósito da Brasil ParaLerdos. E muito menos dos seus apologistas, sócios, ou colaboradores.
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Antes da Revolução Industrial, sem subjugar a natureza por completo, muitas sociedades tinham de organizar a divisão do trabalho de acordo com as estações do ano, os ciclos de luz solar, as cheias dos rios, as chuvas...
O olhar mais comum sobre essas sociedades é que elas trabalhavam mais do que a nossa porque, afinal, não tinham dominado a natureza.
Marromenos. Conforme estudos demonstram, em diferentes épocas e sociedades, o trabalho era inconstante e, em certa escala, menor do que hoje.
Na nossa sociedade, pós-Revolução Industrial, como ensina seu Armando de Belford Roxo, não importa tempo, chuva, enchente, seca...todo mundo tem que trabalhar.
Mesmo todo o avanço tecnológico não fez com que trabalhássemos menos.
Eu gosto muito de brincar com as ideias da expectativa de progresso das pessoas. Via de regra, é uma ideologia tão poderosa que até Marx - sim, o próprio - caiu nela.
Pois é, pega lá o Manifesto Comunista, Marx novinho, todo o início do livro é ele louvando a burguesia, a classe que finalmente tirou todas as amarras da sociedade, substituindo elas por dinheiro.
Os laços comunitários do mundo pré-capitalista escondiam relações de dominação e exploração, mas somente o capitalismo ia transformar essa lógica, criando uma razão a parte de toda a vida social.
Esse papo de que ninguém poderia prever a pandemia (e, portanto, o desastre do governo Bolsonaro), olha... Não cola.
Durante a trajetória dele como deputado e na própria campanha de 2018 ele falava coisas como "matar uns 30 mil" ou "mandar os petistas para a ponta da praia"...
...(em referência a ditadura). No seu voto pelo impeachment de Dilma, em 2016, fez uma saudação a Brilhante Ustra. No final do ano, de 2018, anunciava que ia perseguir os petistas. Judiciário, Legislativo e Executivo, em diferentes instâncias, deram início a essa perseguição.
Quando você diz que não tinha como saber e, ao mesmo tempo, tinha conhecimento dessas inúmeras falas, o que entendo é que você não tinha nenhuma preocupação com as ameaças de perseguição e morte feitas pelo presidente da República. Na melhor das hipóteses, tomava como "piada"...
Tipo, tudo que a gente avançou em direitos humanos, à custa de muita luta, de muito sangue, de muito suor e lágrimas, esbarra sempre nesse sentido: é mais barato escravizar os sujeitos.
Disso decorre um argumento liberal de que a escravidão não amplia o mercado consumidor, que o sujeito sem liberdade e sem renda não compra e por aí vai.
Mas no atual estágio do capitalismo hoje, que a expansão do mercado consumidor não é desejável para muita gente...
Uma das histórias que acho mais interessantes sobre o poder destruidor do colonialismo é a da destruição das cisternas indianas pelos ingleses, os chamados "baoli", criados lá pelo século III depois do JC.
Quando eu estava no Ensino Médio, eu lembro de ficar surpreso com as histórias de secas na Índia. O país cruzado por dois imensos rios, no meio de uma zona de monções... Como podia ter tanta seca e fome?
Anos depois, entendi que as monções são sazonais e que pode, sim, acompanhar longos períodos de seca. Mas mesmo assim, eu fiquei encafifado... Não tinha reservatório de água lá, não?