Tipo, tudo que a gente avançou em direitos humanos, à custa de muita luta, de muito sangue, de muito suor e lágrimas, esbarra sempre nesse sentido: é mais barato escravizar os sujeitos.
Disso decorre um argumento liberal de que a escravidão não amplia o mercado consumidor, que o sujeito sem liberdade e sem renda não compra e por aí vai.
Mas no atual estágio do capitalismo hoje, que a expansão do mercado consumidor não é desejável para muita gente...
...qual o problema de colocar pessoas sob a mira de uma escopeta para elas cavarem cebola? Elas não vão comer essas cebolas. Se comerem, vão ter que pagar. E se não tiverem dinheiro, vão trabalhar até pagar. Win-win situation, né não?
O "único" problema é moral. É social. É humano.
Mas todos esses problemas podem ser colocados de lado se o preço da cebola estiver baixo o suficiente para exigir uma mão-de-obra em estado de miséria. Ou de escravidão.
Eu sou Polanyista nessa (não confundir com "poliano"): se a gente separou a economia da sociedade e tá confortável com essa separação, então tudo que é imoral e condenável do ponto de vista social, sempre vai ter um cretino pra dizer que, imoral, ou não, aquela prática dá lucro.
E aí, claro, a tristeza de constatar que os cretinos se disseminam em todos os lugares da vida social exatamente para dizer que é assim, que o "econômico" tem que ser levado em conta. O famoso "veja bem", ou "vou bancar o advogado do diabo".
Gente que acha que o agro é pop ao falar do escravismo colonial na cana de açúcar, que defende que o garimpo ilegal que mata crianças indígenas é atividade econômica como qualquer outra, que acha que venda de órgãos pode gerar distribuição de renda...tá todo mundo aí.
Todo mundo defendendo que existe o econômico e o social. Que o primeiro é tão ou mais importante que o segundo. E que no fundo, é capaz até de perguntar: mas afinal, qual o problema de mandar pessoas cavarem cebolas com suas próprias mãos sob a mira de um fuzil?
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Uma das histórias que acho mais interessantes sobre o poder destruidor do colonialismo é a da destruição das cisternas indianas pelos ingleses, os chamados "baoli", criados lá pelo século III depois do JC.
Quando eu estava no Ensino Médio, eu lembro de ficar surpreso com as histórias de secas na Índia. O país cruzado por dois imensos rios, no meio de uma zona de monções... Como podia ter tanta seca e fome?
Anos depois, entendi que as monções são sazonais e que pode, sim, acompanhar longos períodos de seca. Mas mesmo assim, eu fiquei encafifado... Não tinha reservatório de água lá, não?
Não ando acompanhando a seleção tanto quanto gostaria, mas fiquei feliz com a classificação para a Copa de 2022.
Eu sou fanático por copas do mundo! E apesar de toda a minha raiva da CBF e de tudo que ela representa (e passou a representar), eu torço, sim, para o Brasil em Copa.
2022 também vai ser a primeira copa de Tupaquinho, mas ele certamente não vai lembrar (assim como eu mesmo não lembro nada da Copa de 1986). Mas lá vou eu estimular o gosto pela coisa. Compra álbum, acompanha eliminatórias, vê chaveamento, faz simulação...
Diz que tudo tem origem, né? Meu gosto pra Copa vem em 1990, que meu pai fez pra mim uma tabela dos jogos da Copa na Itália. Eu tinha uma caneta daquelas com várias cores embutidas. Aí ele desenhou as bandeiras e os uniformes para eu identificar os times.
Achei importante aqui trazer uma contextualização. Pessoal rapidamente descobriu que a filmagem ocorreu no Annam, na Indochina francesa. Uma das senhoras é inclusive Blanche Doumer, a esposa do governador-geral da Indochina, Paul Doumer.
O que parece um ato de filantropia carregado de colonialismo ganha outra dimensão quando descobrimos quem são os Doumer. Governador-geral, Paul recebe uma tarefa: tornar a Indochina uma colônia lucrativa.
Isso porque, a colonização francesa na Ásia não ia lá muito bem. Conchinchina, Annam e Tonkim, os principais espaços colonizados pelos franceses, foram alvo de intensa resistência local. O reino do Dai Viet não conseguiu resistir, mas nobres e mandarins locais, sim.
Esse papo de "banalizar a linguagem" é muito doido, porque uns anos atrás se acusava a esquerda de banalizar o termo "neoliberal".
Eu, particularmente, não acho que banaliza. A galera luta por significados e se os termos se tornam moeda corrente e fazem sentido, qual o problema?
Eu sou historiador, acho fundamental a discussão sobre conceitos, eles precisam ser sempre contextualizados e significados. Mas assim: eles não são mortos. Se a galera ressignifica o Aécio como fascista, o erro é menos no conceito e mais no contexto...
Algumas pessoas sabem, mas meu alter-ego vem orientando uma pesquisa sobre saques na região Nordeste entre 1979 e 1994. Orientei três alunos nesse projeto que se encerrou semana passada e olha, gostei muito do trabalho deles.
A gente partiu de um problema político e histórico: os anos 1980 são marcados por um contexto de hiperinflação que ocasionou saques em supermercados no Sul-Sudeste do Brasil. Tem teses e dissertações sobre o tema. O básico: carestia e decadência da ditadura.
No Sul-Sudeste, a explicação era sempre de ordem econômica: a inflação alta, a perda do poder de compra, quando vê, bum! Revolta popular e saque em supermercado.
Contudo, no Nordeste, não teve incidência de saques? E se teve, a hiperinflação era a causa?
Ontem eu finalmente terminei de ouvir a entrevista do Mano Brown e do Lula.
Gostei e tal, me emocionei em algumas partes. Mas o que mais me pegou foi a rememoração do Brown sobre o comício em 2018.
Pra mim, é esse o evento que estrutura a entrevista. As perguntas sobre raça, sobre o que parte da periferia enxerga na direita, sobre alternância de poder, sobre a percepção popular de uma decadência do PT na expressão da revolta...tudo remete ao comício de 2018.
Bom, o próprio Brown fala isso na entrevista e rememora aquele dia, um dia que Lula não estava lá - pois estava preso por conta de um processo que, hoje sabemos, foi flagrantemente ilegal.
É doido que aquele esporro que Brown deu seja ainda o norteador.