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Pedro Grabois @graboispedro
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Sobre Marielle Franco e o direito ao luto público. No dia 21/03/2018, uma semana depois do assassinato de Marielle e Anderson, rabisquei alguns pensamentos e sentimentos no meu caderninho pessoal. Resolvi agora publicar isso em algum lugar...
"O que aconteceu na última quarta-feira 14 de março de 2018, a execução brutal de Marielle Franco (e de seu motorista, Anderson Pedro Gomes), foi para mim um acontecimento sem precedentes.
Digo 'para mim' porque na minha experiência pessoal pessoal não lembro de...
...ter vivenciado, como agora na morte de Marielle, uma perda que sinto como pessoal e muito próxima e, ao mesmo tempo, como experiência coletiva (nas redes e ruas) de um luto público simultaneamente afirmado e contestado pela sociedade.
A questão da segurança e do racismo, também objeto de pesquisa (em seu mestrado) e intervenção (em longa trajetória trabalhando com Direitos Humanos) de Marielle, me mostrou algo acerca da importância política do luto público. De um lado, as desigualdades (de raça,gênero, classe,
...sexualidade, localização geográfica) estão presentes nas experiências de luto. De outro, a experiência política desse luto pode ser também decisiva na manutenção ou subversão dessas desigualdades.
Aqui, tenho em mente as reflexões de Judith Butler em seu livro 'Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto?'.
Uma coisa tem me incomodado nesse momento subsequente à morte de Marielle: discursos de ódio (circulando no Twitter e no Whatsapp de maneiras distintas) contra
...defensores de Direitos Humanos [DH] e de rejeição à própria pauta dos DH. Esse ódio visível nos discursos me leva a duas considerações:
1) A questão da polícia - que na verdade é a questão do sistema polícia-justiça-prisão-mídias - evocada nesses discurso traz à tona uma...
...oposição taxativa entre dois segmentos sociais: os bandidos são os outros enquanto nós somos os verdadeiros cidadãos ('cidadãos de bem'). Esse discurso parece apostar numa colagem de uma certa 'imagem de bandido' a todos aqueles 'enquadrados' como ligados ao mundo do crime.
Trata-se da manutenção de um estereótipo racial/social com terriveis efeitos que não obedecem nem mesmo a uma suposta proteção institucional. No caso, Marielle era vereadora da cidade do Rio de Janeiro. É, para mim, emblemático o fato de que ela, mesmo depois de morta, ...
tenha sido vítima de um discurso capaz de negar sua trajetória institucional/estatal (primeiro atuante na Comissão de DH da Alerj e depois vereadora da Câmara do Rio) e de diálogo direto com a polícia, incluindo aí ações de apoio a famílias de policiais vítimas da violência e...
discursos em defesa dos direitos dos/as policiais enquanto trabalhadores/as. Esse último ponto encontra(va) divergências fortes no meio das militâncias sociais oriundas de favelas. Mesmo assim,Marielle foi vítima daquele falso discurso de 'direitos humanos=direitos de bandidos'.
2) Cabe reconhecer a perversidade desse discurso falso - facilmente contestável pela própria trajetória de Marielle - sem ver nele traço de ignorância ou falta de caráter individual como no caso de uma simples mentira. Os discursos são armas de guerra.
Os discursos de ódio têm grande poder de destruição, mas seu poder não é absoluto.
Cabe pensar até onde vai esse poder. A sugestão de Butler de 'enquadrar o enquadramento' é aqui bastante útil. Precisamos mostrar os artifícios sociais que legitimam a comoção com a morte e...
a vida de uns é que deslegitimam a comoção pela morte e pela vida de outros."

Marielle Franco enquanto viveu buscou justiça. Hoje, a luta que ela encarnava segue, precisa seguir.
Sigamos!
#MarielleVive
#AndersonPresente
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