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Com muito boa vontade e um tantinho de suspension of disbelief seria possível entender o que o governo quer com a ideia de descentralizar o ensino e investir menos em ciências humanas e mais em disciplinas técnicas ou científicas.
Em tese: ciências exatas ou técnicas “dão resultado”. Humanidades, não. Ocioso me deter nesse ponto, mas as simplificações são perigosas. Humanidades não precisam nem devem ser “úteis” mesmo. O que não é útil, no caso, é o próprio conceito de utilidade.
Também consideremos que no indeterminado universo das ciências técnicas ou científicas já não vivemos mais sob a idade da indústria. De certa maneira é possível defender que as ciências tecnológicas se desmaterializaram. Tornaram-se mais... humanas.
O futuro do trabalho não parece ser o das fábricas e dos grandes projetos de engenharia, mas um mundo menos material, mais informacional – um trabalho mais inteligente e fluido.
Tenho minhas ressalvas a propósito de todos os programas de ensino – este atual e quaisquer outros, passados ou futuros –, porque há algo de muito íntimo, pessoal, no aprendizado. Posso não querer estudar isso ou aquilo, ponto.
No entanto, há senões. Essa minha visão – digamos, libertária – só faria sentido se fosse tentada (em escala) num outro momento histórico-cultural. O Brasil sofre de analfabetismo em sentido estrito e em sentido lato. Os índices de aprendizado em todas as áreas são deprimentes.
Rupturas pedagógicas e realocação drástica de recursos fariam muito mal, e os convocados a revolucionar o ensino não parecem competentes para tanto. É provável que troquem uma ideologia (de esquerda) por outra (bolsonarista, mais até que direitista).
Além disso, não deixa de ser irônico que a mexida nas disciplinas indique, por si só, um tipo de intervenção que deveria ser evitada por quem se diz contra grandes intervenções do Estado na vida das pessoas.
Medicina, engenharia, veterinária (oi?) não são, hoje em dia, o que foram no passado. (Estudemos programação, se for o caso.) Temos médicos e engenheiros demais; o que não temos é investimento inteligente em saúde pública e infraestrutura.
Crianças, jovens e adultos não sabem ler ou escrever. Têm dificuldades para interpretar texto, acompanhar discussões. O presidente e seus filhos são bons exemplos. Descuidar de humanidades, seja lá como esse descuido for institucionalmente representado, não melhora em nada.
Repito: não é o momento propício para grandes revoluções educacionais. Há muitas pautas urgentes, um mandato não dá conta de metade delas, então first things first. Melhora o que existe, ajusta o que tem, imita o que dá certo, corta o que não presta mesmo.
Por fim, se a política, com p maiúsculo, é algo mais do que pragmatismo e tecnocracia, e tem muito de simbólico e valorativo, que mensagem esse governo pretende transmitir, ao desidratar o ensino de humanidades? Pois é isso aí mesmo. Ministério de peixe, peixinho é.
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