"O coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, captou investimentos de grandes empresários para financiar o Instituto Mude – Chega de Corrupção, criado para promover, além da própria operação, as dez medidas de combate à corrupção e suas opiniões políticas. +
Mensagens trocadas entre o procurador e membros do Instituto Mude no Telegram, revelam que ele se reuniu com empresários, às vezes a portas fechadas, na sede da Procuradoria, para arrecadar verbas para a entidade. +
Uma empresária que foi “investidora anjo” da organização: a advogada Patrícia Tendrich Pires Coelho seria depois investigada pela Lava Jato, mas não foi denunciada pela operação.
Apesar de saber que a empresa de Patrícia, a Asgaard Navegação S. A., fornecia navios para a +
Petrobras e ter conhecimento de sua proximidade com o empresário Eike Batista e com o banqueiro André Esteves, fundador do BTG Pactual (dois alvos da força-tarefa coordenada por Dallagnol), o procurador não só aceitou a sua ajuda financeira como fez a ponte da empresária com +
os membros oficiais do instituto e se reuniu com ela para tratar da doação.
Em um diálogo com a integrante do Mude, Patrícia Fehrmann, em 29 de junho de 2016, Deltan diz que conheceu Patrícia Coelho em uma viagem (ele não diz para onde) no dia anterior à conversa: +
“Caramba. Essa viagem de ontem foi de Deus. Além dela, estava um deputado federal que se comprometeu a apoiar rs”, escreveu, não revelando quem seria o parlamentar a apoiar a entidade que se define como “apartidária”. +
Enquanto discutiam a formalização do Mude no chat #Mude Delta,Fáb,Pat,Had,Mar, (formado por membros da organização, incluindo Deltan Dallagnol), um dos fundadores do instituto, Hadler Martines, escreveu em 29 de agosto de 2016: +
“Talvez vocês já tenham feito isso mas sobre nossa investidora anjo, dei uma boa pesquisada sobre seu histórico e realmente ela parece ser uma grande empresária multimilionária e com grande trânsito com grandes empresários nacionais. +
Hoje ela é sócia de empresa de frotas de navios (Aasgard) e de mineração e portos (Mlog). Algumas coisas que me chamaram atenção: – sua empresa fornece navios para a Petrobras; – ela é ex-banco Opportunity (famoso Daniel Dantas) – +
ela foi ou é muito próxima do Eike Batista e também do André Esteves (BTG)”
Dallagnol não respondeu ao comentário.
Ele e os integrantes do Mude que participavam do chat (Fábio Oliveira, Patrícia Fehrmann, Hadler Martines e o pastor Marcos Ferreira) +
se encontraram com Patrícia Coelho dia 8 de setembro daquele ano no Rio de Janeiro, de acordo com os diálogos no Telegram.
No dia 11, Hadler voltou a levantar suspeitas sobre a “investidora anjo”: +
“Sobre nossa reunião com o Anjo, ainda estou com uma pulga atrás da orelha tentando entender a razão do apoio financeiro tão generoso (sendo cético no momento)”, escreveu.
“Me pergunto se ela quer ‘ficar bem’ com o MPF por alguma razão… +
Ela já foi conselheira do Eike e pelo que li dela, ela o representava em algumas negociações.
Sugestão: fiquemos atentos. Desculpem o provérbio católico, mas quando a esmola é demais, o santo desconfia…”. +
Ele enviou no grupo um link com a reportagem da revista Exame: “Eike tenta sacar uns US$ 100 milhões, mas André Esteves barra”.
A matéria informa que Patrícia Coelho era apresentada por Eike Batista como sua consultora. +
A reportagem também diz que Patrícia é egressa do banco Opportunity e sócia da companhia de navegação Asgaard.
webcache.googleusercontent.com/search?q=cache…

Dessa vez, Deltan respondeu ao colega:
“Boa Hadler. Mais cedo ou mais tarde descobriremos isso”. +
Minutos depois, Deltan enviou uma mensagem para o procurador Roberson Pozzobon questionando se o nome de Patrícia havia aparecido nas investigações: +
O nome da consultora de Eike Batista e “investidora anjo” do Instituto Mude, Patrícia Coelho, apareceu nas investigações da Operação Lava Jato, e foi Deltan Dallagnol quem deu a notícia para os colegas, no dia 25 de outubro de 2017: +
“Caros, uma notícia ruim agora, mas que não quero que desanime Vcs. A Patricia Coelho apareceu numa petição nossa e me ligou. Ela disse que tinha sociedade com o grego Kotronakis (um grego que apareceu num equema de afretamentos da petrobras e que foi alvo de operação nossa), +
mas ele tinha só 1% e ela alega que jamais teria transferido valores pra ele…Falei que somos 13, cada um cuida de certos casos, que desconheço o caso e que a orientação geral que damos para todos que procuram é: se não tem nada de errado, não tem com o que se preocupar; se tem,+
melhor procurar um advogado rs. Ouvindo sobre o caso superficialmente, não posso afirmar que ela esteve envolvida ou que será alvo, mas há sinais ruins. É possível que ela não tenha feito nada de errado, mas talvez seja melhor evitar novas relações com ela ou a empresa dela, por+
cautela”, escreveu, e concluiu:
“Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas”.
Hadler lembrou ao procurador das suas desconfianças:
“Delta, sobre essa questão, lembro bem +
como apesar de estarmos felizes com o apoio que estávamos recebendo à época, ficamos com um pé atrás. Especialmente por prestar serviços à petro e por ter sido sócia do Eike. Essa notícia não chega a nos surpreender e também não nos desanima. Obrigado por compartilhar!”. +
Em julho de 2019, a força-tarefa da Lava Jato denunciou os sócios de Patrícia Coelho na Asgaard Navegação S. A., o ex-senador pelo PMDB Ney Suassuna e Georgios Kotronakis (filho do ex-cônsul honorário da Grécia no Rio de Janeiro, Konstantinos Kotronakis), +
pelo envolvimento em esquema de corrupção nos contratos de afretamento de navios celebrados pela Petrobras com armadores gregos.
Eles estavam sendo investigados desde 2015, uma vez que o inquérito policial que embasou a denúncia data daquele ano mas, de acordo com o MPF, +
a primeira menção à Asgaard ou a Patrícia ocorreu em 19 de abril de 2017, quando se verificou que um dos investigados era sócio dessa e de outras empresas.
De acordo com a acusação, o ex-senador “realizou reunião na Petrobras com Paulo Roberto Costa para cooptar o então +
Diretor de Abastecimento da Petrobras, expondo as intenções e colhendo cenários para obtenção de contratos de afretamento”. +
Apesar de as relações de Patrícia Coelho com Ney Suassuna terem sido abordadas na peça assinada por Deltan e outros 15 procuradores da República, Patrícia não foi alvo da denúncia.
As mensagens trocadas por Deltan Dallagnol e os fundadores do Instituto Mude – Chega de Corrupção +
mostram que não foi apenas de Patrícia Coelho que o chefe da força-tarefa se aproximou para conseguir dinheiro para o instituto.
Ele captou recursos de vários empresários, além de ter feito palestras para promover a organização. +
“Caros acho que vou conseguir uma reunião do Flavio bilionário evangélico do WizeUp com o MUDE”, escreveu no dia 3 de março de 2017.
No dia 30 de abril, ele disse que estava agendando um café da manhã com o empresário para 18 de maio: +
“Caros, estou agendando café da manhã com o Flávio do wise-up para o dia 18/5. Ele vai mudar a data da volta dele para estar conosco. Quem pode ir? Têm sugestão de lugar? Impoertante preparar algo bacana pra apresentar a ele”. +
Em outra troca de mensagens, no mesmo grupo, fica claro o interesse de empresários em se aproximarem de Deltan Dallagnol por meio do Instituto Mude: +
A empresária Rosângela Lyra é ex-sócia da Dior no Brasil. A palestra citada na conversa foi realizada na Casa do Saber, dia 13 de setembro de 2016, em São Paulo.
No mesmo dia 13 de setembro, Deltan voltou a escrever no grupo sobre um possível doador do instituto: +
“hoje um mega empresário veio falar comigo no aeroporto, um cara de SC com nome diferente. Passei meu e teu tel Pati. Falei pra ele te contatar. Ele tinha uma empresa que acabou de vender com sede em múltiplos Estados, uns 250 funcionários….”. +
Mais tarde ele mandou outra mensagem:
“Pati passei seu contato para um dono de shoppings (Paulo) e pro dono do coco bambu”, disse, demonstrando mais uma vez sua aproximação com empresários e potenciais patrocinadores do Mude. +
No mesmo chat, Deltan Dallagnol afirmou que poderia pedir recursos para um empresário da Opus Dei e convocou uma reunião com os membros do Instituto Mude na sede da Procuradoria para discutir os rumos da entidade. +
Hadler Martines apontou possíveis riscos para a imagem de Deltan, caso o encontro dele com membros da organização na sede da Procuradoria fosse vazado:
O Código de Ética e de Conduta do MP da União, assinado em setembro de 2017 pelo então PGR Rodrigo Janot, diz que é vedado aos +
servidores do Ministério Público da União “utilizar bens do patrimônio institucional para atendimento de atividades de interesse”.
O documento destaca também que é compromisso de conduta ética dos procuradores “atuar com imparcialidade no desempenho das atribuições funcionais, +
não permitindo que convicções de ordem político-partidária, religiosa ou ideológica afetem sua isenção”.
No ano passado, Deltan Dallagnol também usou a sede da Procuradoria em São Paulo para se reunir com empresários convidados pelo instituto. +
“Oi Grazi prazer! para quarta dia 09 temos cerca de 10 empresários de grandes empresas confirmados. Convidados do movimento Mude. Na procuradoria 14h com Dr Deltan. Mas ele disse que podemos ter até 20”, escreveu. E prossegue dizendo que a assessora +
“passou uma lista de pessoas que ele poderia aproveitar a oportunidade de falar”, escreveu Patrícia Fehrmann no dia 7 de maio de 2018, no chat Palestras das Novas Medidas – A Grande Chance, onde eram organizadas as agendas de palestras do procurador. +
Além de captar recursos com empresários, o procurador Deltan Dallagnol tirou dinheiro do próprio bolso para custear despesas do Instituto Mude.
Ele depositou R$ 1,8 mil nas contas do instituto em 8 de fevereiro de 2018. +
“Fiz a transferencia do MUDE amore”, escreveu no chat #Hadler,Deltan,Fábio,Marcos.
O dinheiro foi usado para pagar Patrícia Fehrmann para atuar na gestão da entidade.
Ele participou de uma vaquinha feita pelos integrantes do grupo, de R$ 300 para cada um, por seis meses. +
Mais uma vez, Hadler Martines questionou a postura de Deltan, dessa vez ponderando se era certo, como membro da Lava Jato, ele fazer doação para o Mude, quando o procurador se prontificou a participar da divisão. +
Em outra situação, anos antes, Deltan sugeriu que o dinheiro de suas palestras fosse destinado ao mude:
“Consigo recursos também pelas palestras, mas o ideal era que o Mude virasse PJ [pessoa jurídica]… assim fica mais transparente a destinação e aplicação, porque posso ser +
cobrado em algum momento pela destinação de valores… Quanto antes virar PJ, seria melhor pq há umas palestras engatilhadas”, escreveu no grupo #Mude Reunião no dia 5 de junho de 2016. +
As mensagens trocadas nesse grupo pelo Telegram mostram que a conta da Igreja Batista de Bacacheri (templo evangélico em Curitiba que o procurador frequenta) foi usada para custear o site do instituto: “Marcos e Deltan. Como o valor de oferta entrou na conta da igreja. +
A nota tem que ser pra igreja também. A igreja será o pj no caso do site. Calculo 8mil mas brifei 3 fornecedores e estou esperando o orçamento”, afirmou Patrícia Fehrmann.
E também a igreja, que foi a primeira sede oficial do Mude, financiou viagens dos seus representantes: +
“Pessoal, quais são as próximas viagens para esse mes? Compartilhei com Patricia e Fabio o relatorio financeiro da IBB… Talvez tenhamos que pedir mais algumas ofertas para essas viagens…”, +
escreveu o pastor Marcos no chat #Mude Delta,Fáb,Pat,Had,Mar, no dia 10 de setembro de 2016. “Vc pode olhar na agenda do google MUDE! Esta bem organizado lá. Com detalhes”, respondeu Patrícia Fehrmann. +
Apesar de Deltan Dallagnol não constar oficialmente como membro do Instituto Mude, as mensagens trocadas pelo aplicativo Telegram mostram que era ele quem dava a palavra final nas decisões mais importantes +
da organização registrada no dia 19 de setembro de 2016, conforme dados da Receita Federal.
O instituto foi criado inicialmente para coletar assinaturas a favor das dez medidas contra a corrupção, um pacote de mudanças legislativas que se tornou uma obsessão pessoal de Dallagnol+
No entanto, depois da derrota na votação das dez medidas, o procurador passou a usar a entidade para defender suas posições políticas, conforme já revelado na reportagem “Deltan e Lava Jato usaram Vem pra Rua e Instituto Mude como lobistas para pressionar STF e governo”.+
Deltan Dallagnol chegou a sugerir que o Instituto Mude sondasse a opinião dos parlamentares eleitos em 2018 sobre a execução provisória da pena porque, segundo ele, o então recém-anunciado ministro da Justiça, Sérgio Moro, teria preparado um projeto de lei sobre o assunto: +
O ministro Sérgio Moro incluiu uma mudança sobre a execução provisória da pena em um projeto de lei, que faz parte do pacote anticrime.
Encaminhado em fevereiro ao Congresso Nacional, entre outros pontos, o texto determina que a prisão após condenação em segunda instância se +
torne a regra no processo penal.O projeto acrescenta um artigo ao Código de Processo Penal para estabelecer que um tribunal, ao proferir acórdão condenatório, “determinará a execução provisória das penas privativas de liberdade”. +
Atualmente, isso já acontece por entendimento do Supremo, porém o ministro propôs que essa medida passe a constar em lei para evitar o risco de uma eventual mudança de jurisprudência e a mais alta corte do país voltar a proibir as prisões de condenados +
por tribunais de segunda instância.
De acordo com o projeto, o tribunal poderá “excepcionalmente” não determinar a execução provisória da pena se houver uma “questão constitucional relevante” no caso específico.
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