1/ Um exemplo de como a mesma técnica é aberta à diferentes interpretações em economia. Considere os empréstimos da União ao BNDES. O custos são fáceis de calcular objetivamente, como o Tesouro faz periodicamente no link abaixo.
tesourotransparente.gov.br/publicacoes/bo…
tesourotransparente.gov.br/publicacoes/bo…
2/ Por exemplo, no último boletim, o Tesouro calculou que o custo dos empréstimos e equalização via BNDES somaram R$ 262 bi desde 2008 (em preços de fev/20). Como ainda há contratos existentes, o valor sobe para R$ 282 se incluirmos o valor presente do custo futuro.
3/ O cálculo do custo passado é consensual. Pega-se o valor, a taxa de captação do Tesouro, o juro pago pelo BNDES, a equalização dada pelo Tesouro e traz tudo a preços atuais usando o IPCA. Nenhuma divergência aqui. Já o VP do custo futuro envolve algumas hipóteses...
4/... como a evolução da taxa de captação do Tesouro. Pode ter divergência, mas ainda é questão mais "técnica" do que "teórica". Voltando à questão original, utilizemos o número do Tesouro, os empréstimos e equalização via BNDES custaram/custarão R$ 282 bi de 2008 a 2041.
5/ Diante deste número alguns colegas, mais ideólogos do que economistas, se empolgam e dizem que gastamos um "Plano Marshall" (sic) no BNDES. Além da comparação histórica falha (este pessoal normalmente não faz curso de história) a observação tem um problema teórico. Qual?
6/ Dizer que o combo empréstimo+equalização ao BNDES custou R$ 282 bi traz implícita a hipótese de que a medida não teve qualquer impacto na economia, de que os empréstimos não elevaram o PIB e arrecadação em sequer um real. Seguindo a técnica, tudo tem custo e benefício. Logo...
7/ O custo estimado foi de R$ 282 bi, mas qual foi o benefício? Neste ponto não há metodologia comum, pois depende de suas hipóteses de como funciona a economia. Por exemplo, se você acha que evolução do produto potencial da economia é dada, não importa o que o governo faça...
8/... então não houve qualquer benefício. Já se você acha que a ação do Tesouro+BDNES pode aumentar o produto potencial da economia, via mais investimento, o benefício pode ser positivo. Talvez não de R$ 282 bi, mas certamente acima de zero.
9/ Um dos temas de grande debate atual é quanto a demanda efetiva afeta o produto potencial, ou quais são os efeitos permanentes de flutuações econômicas, sobretudo diante da evidência da crise de 2008-09. Esta questão envolve estatística e teoria, evidenciando que...
10/ A mesma técnica quantitativa pode dar resultados diferentes dependendo de como se descreve a evolução do produto potencial (com ou sem histerese no jargão dos economistas). Quem acompanha macroeconomia sabe estas coisas.
11/ Diante da complexidade do tema, há espaço para interpretações mais ideológicas, tipo: "não houve benefício algum" ou "o beneficio excedeu qualquer que seja o custo". Quem fala isto está fazendo mais política do que economia. Nada contra a política, mas é bom separar as coisas
12/ Na prática, como o custo é tecnicamente fácil de calcular (qualquer fiscalista de planilha faz isso), alguns colegas esquecem de estimar o benefício, que é tecnicamente mais difícil de estimar. É justamente o calculo do benefício que ilustra as diferentes visões sobre como...
13/... funciona a economia. Dois economistas com a mesma técnica estatística (sim heterodoxos sabem fazer econometria) podem chegar à conclusões diferentes.
Mas escrevi demais. Este fio foi só para dar um exemplo onde a técnica não resolve tudo e teoria importa em economia.
FIM
Mas escrevi demais. Este fio foi só para dar um exemplo onde a técnica não resolve tudo e teoria importa em economia.
FIM
