Brasil e EUA se parecem bastante, mas possuem algumas diferenças importantes. Uma delas é o racismo muito presente em ambas as sociedades. As subjetividades brasileira e americana são racistas, mas elas se estruturam de forma diferente. Explico (1/10):
O Brasil é uma "democracia racial" do ponto de vista da branquitude: aqui existe um conceito ampliado de "branco" que se aplica a descendentes mestiços de índios e a todos os povos fenotipicamente brancos do mundo, salvo asiáticos. O elemento que não cabe nisso é o negro (2/10).
Nos EUA, poucos povos podem ser brancos. Dos latinos, só os descendentes de franceses são "incorporáveis". Descendentes de italianos são ítalo-americanos. Isso não é distinção jurídico-formal, mas é fato e gera efeitos (3/10).
Judeus, cristão árabes, latinos, eslavos, germânicos ou urálicos são brancos no Brasil, mas nos EUA não (4/10).
Por outro lado, o Brasil concentra mais renda, a escravidão negra africana foi mais extensa e intensa e não houve reparações ou políticas de inclusão. Nosso imaginário e nossa constituição psiquíca é programado para excluir o negro (5/10).
Entre o branco e o negro no Brasil há uma escala colorista que modula a discriminação. Mas há pouco que escapa a esses pólos. Só as populações nativas em seu modo de vida tradicional, ciganos etc (6/10).
Nos EUA, contudo, há "sub-brancos", uma categoria na qual seriam enquadrados a maior parte dos brasileiros brancos. Trump, mestiço de alemão com escocesa, é um branco, Bill de Blasio, prefeito de NY é "italiano" (7/10).
Negros vivem materialmente melhor nos EUA do que no Brasil, talvez haja menos desigualdade social e racial, enquanto aqui também mata-se MUITO MAIS pessoas negras -- e não só pelas mãos das polícias (8/10).
Por outro lado, os EUA alijaram praticamente toda sua população negra de sua cultura e tradições pretéritas, de um jeito inimaginável. Isso explica a aproximação do movimento negro americano com o Islã, religião de muitos dos seus ancestrais (9/10).
Isso tudo tem razões econômicas, mas a formatação não é apenas social, política e cultural, mas subjetiva, está nos recônditos da mente de todos os brasileiros e americanos. Essa estrutura racista de opressão/divisão de classe é uma das questões-mestras de ambos os países (10/10)
P.S.: racismo não é apenas questão moral. Embora muitas vezes o discurso moral ajude se modulado nas suas limitações, criando inscrições nesse inconsciente de massas, de modo a retirar elementos racistas/ inserir elementos antirracistas. Isso exige força e paciência.
P.S.B.: o discurso moral antirracista, em si, não produz efeitos. O racismo não é fruto de degeneração transcendente, possessão demoníaca ou ignorância, ele é sistema e opera na nossa sociedade, mas também dentro de nossas cabeças.
