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Prometi, ontem, que faria um resumo da pesquisa "Bolsonarismo em Crise?" realizada por Camila Rocha e Esther Solano e recém divulgada. Então, lá vaí (segue o fio):
1) Trata-se de uma pesquisa qualitativa, ou seja, não se presta para buscar padrões estatístico de comportamento, mas identificar valores e orientações subjetivos para tomada de decisão. Foram feitas entrevistas em profundidade com eleitores de Jair Bolsonaro de renda C e D
2) Os entrevistados residem na Região Metropolitana de São Paulo. A pesquisa foi realizada entre 9 e 18 de
maio de 2020. Para selecionar os entrevistados, apresentaram uma pergunta inicial : “Você acha que Jair Bolsonaro deve eixar de ser presidente do Brasil?”
3) Com base nas opções de resposta a esta pergunta inicial (“sim”, “não” e “não sei”), foram recrutadas aproximadamente 9 pessoas considerando cada
uma das três opções.
4) Entre as profissões declaradas, havia: vigilante, atendente de gráfica, tatuador, atendente de emergência da Polícia Militar, cuidadora de idosos, manicure, esteticista, promotor de vendas, promotor de eventos, auxiliar administrativo, assistente de vendas, dentre outros
5) Após o encerramento da pesquisa, os entrevistados puderam ser divididos em três grupos diferentes: 1) os fiéis, aqueles que mantêm um apoio constante ao presidente; 2) os apoiadores críticos; e 3) os arrependidos, que se decepcionaram com o presidente
6) Para os apoiadores fiéis de Bolsonaro, sua dificuldade em
governar é atribuída sobretudo ao que percebem como boicotes da mídia e do Congresso ao governo federal.
7) Para os apoiadores críticos, Bolsonaro não está fazendo um governo como era esperado, porém, a desculpa recorrente é a de que ele é honesto, autêntico, sincero e está sendo bloqueado continuamente
8) Vejamos uma passagem da fala de um apoiador crítico: "Colocamos o Bolsonaro porque ele é linha dura, bate de
frente, só que ninguém nunca passou por uma pandemia dessa. O cara tá tentando e não deixam ele governar também. "
9) Como se percebe, o predicado principal para este apoiador crítico é que Bolsonaro "bate de frente".
10) Finalmente, entre os que apoiam a saída do presidente do poder, a ideia de que Bolsonaro vem sendo boicotado perde força, pois argumentam que ele teria perdido o foco de questões vistas como mais essenciais
11) Vejamos uma passagem de um desiludido com Bolsonaro: "Eu cheguei a acreditar que ia melhorar mais na segurança, na educação, mas acho que ele deixou de realizar muitas coisas que ele propôs, parece que ele está priorizando outros assuntos"
12) Mais uma crítica de uma arrependida: ", qualquer pessoa que conteste o governo dele, ele arruma um jeito de remover. "
13) Para este bloco (arrependidos), Bolsonaro estaria perdendo foco e elimina qualquer um que critica. Aqui há algo interessante: não há abandono em relação ao ideário original do discurso bolsonarista, mas há crítica à sua intransigência, o que se opõe à linha dura
14) Mais interessante, ainda: os arrependidos já utilizam argumentos usados contra adversários para criticar Bolsonaro: " têm que parar de mimimi e fazer um governo como nós imaginássemos que seria"
imaginássemos que seria
15) Nos 3 grupos de entrevistados, os filhos são apontados como constante fonte de instabilidade, o que desmancha uma tese inicial que o cuidado paternal cairia bem no seu eleitorado. Não cai.
16) Os filhos de Bolsonaro são caracterizados pelos entrevistados como “moleques” e “despreparados”
17) Contudo, entendem que, ainda que os filhos possam ser corruptos, Bolsonaro seria honesto. A imagem de Bolsonaro construída no ataque aos "corruptos" dos governos anteriores, começou a ser arranhada, mas ainda persiste
18) Além do "mimimi", outra fonte política de instabilidade bastante citada pelos entrevistados é a própria postura do presidente, tida como “rude” e “bruta” e sua falta de decoro. Aqui estaria um veio a ser explorado pela oposição: falta de foco e falta de decoro
19) De alguma maneira, essas críticas sugerem uma percepção em construção de falta de competência política e técnica de Bolsonaro e dificuldade para lidar com adversidades.
20) De outro lado, o jeito rude aparece como sinceridade, como nesta passagem da fala de um entrevistado: "É que ele é o dono da bola, sabe? Meninão, mas é o jeito dele, ele não faz por mal, quer o melhor para o país, o importante é que ele é sincero."
21) Então, a sinceridade seria um predicado positivo, se vinculando ao enfrentamento da "velha política". Ocorre que Bolsonaro acaba de se aliar com o Centrão e já deu cargos para caciques da velha política. Outro veio a ser explorado
22) Entre os apoiadores críticos, seu estilo divide. Para alguns, o estilo violento seria inadequado para o cargo que ocupa, criaria instabilidade e seria indesejável
23) Sobre as demissões de ministros, há uma divisão de opiniões. Uns, acham que ele tem que se cercar de gente de confiança, outros, afirmam que que Bolsonaro seria intransigente em demasia
24) Vejam esta passagem: "O que eu vejo é que os ministros que saíram, existe uma coisa meio de criança: “olha, se você não vai fazer o que eu quero, então tchau”
25) Outra opinião: "Ele é um intransigente. Os dois ministros da saúde saíram porque eles são médicos e não concordavam com as coisas que Bolsonaro fala. Aí, ele, que tem esse jeito militar, não sabe lidar com as críticas e infernizou a vida deles até eles saírem
26) Finalmente, quando questionados sobre um possível fechamento do Congresso, alguns se dizem contrários porque isso significaria uma ditadura: "Não, não, ditadura nunca. Eu já acho ele um pouco ditador. Eu conheci gente que viveu na ditadura e não quero
isso de volta"
27) Contrariando a ideia de que apoiadores de Bolsonaro não estariam preocupados com a pandemia e minimizariam sua gravidade, a grande maioria dos entrevistados afirma estar com medo do vírus
28) Fico por aqui. Deixei de relatar metade da pesquisa. Mas, estes drops já indicam as bases do descongelamento da figura de Bolsonaro. O Covid19 realmente foi o ponto nervoso que, tocado, fez o bolsonarismo começar a desmoronar. (fim do fio)
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