A imagem do homem derrubando as cruzes em Copacabana ilustra o círculo vicioso de negação (no sentido psicanalítico) que compõe o bolsonarismo. O crescimento das expectativas das classes baixas, a ascensão de uma jovem intelectualidade e movimentos negros, feministas, indígenas +
fizeram uma parte da população brasileira se ver no espelho e enxergar aspectos bastante desagradáveis da estrutura social brasileira, sua posição dentro dela, suas crenças e valores... Diante da feiúra que viram, muitas preferiram acreditar que havia algo errado: não eram elas +
que eram feias, era o mundo que estava errado. Muito da eficácia do discurso olavista vem daí: oferecer a quem sentia o desconforto de se descobrir opressor a possibilidade de se conhecer como vítima, com um direito de legítima defesa contra um mundo invertido. +
O problema é que, se a negação da imagem de si que você descobre leva a apostar no horror, e o horror devolve uma imagem desconfortável de si, a tendência é que você se veja obrigado a dobrar a aposta. Para aquele senhor, as cruzes na praia eram uma afronta pessoal, uma acusação.
Elas eram um espelho incômodo refletindo a própria feiúra. Daí a necessidade de negá-las, de fazê-las desaparecer, de botar quem organizava o protesto na posição de algoz e a si mesmo, e aos outros como ele, na posição de vítima.
Desarmar esse mecanismo vai levar muito tempo.
Desarmar esse mecanismo vai levar muito tempo.
