Thread by @marcosvlqueiroz

Pelo menos há uns 20 anos o discurso do mal menor está na boca da esquerda hegemônica e institucional no Brasil. Engana-se ou tem pouca memória quem pensa que ele nasceu de uma tática para derrotar o bolsonarismo. Chego a dizer que a tática virou estratégia e conteúdo. 👇🏾

Lembro muito bem, no primeiro turno de 2014, durante a campanha, discutindo alianças eleitorais com alguns companheiros e eles dizendo: "veja, Marcos, você não entende que, a despeito dessa flexibilização, com essa tática estamos acabando com a direita no Brasil." 👇🏾

Com foco na superfície, de fato era o que aparentava. Naquele momento, Dilma aparecia em primeiro nas pesquisas, seguida de Marina. Aécio ia desnaturando no terceiro lugar. Belo cenário, não?

Bom, todo mundo sabe a reviravolta e o sufoco que marcaram essas eleições. 👇🏾

A vitória do PT não deu tempo nem de comemorar: balde de água fria já no discurso da vitória, instantes depois da divulgação do resultado. Dilma retomava o conteúdo do "mal menor" e se afastava da pegada adotada pela campanha do PT nas semanas anteriores ao segundo turno. 👇🏾

De lá para cá: um golpe de Estado; a utilização de uma investigação para fins imperialistas e para aniquilar a esquerda nas eleições; PEC do fim do mundo; destruição da CLT; destruição da previdência; um parlamentar caricato e desprezível chega à presidência; e etc, etc e etc. 👇🏾

Depois de tudo isso, em 2020, pessoas insistem na ideia do mal menor. Não se nega que composições táticas podem ser importantes ou que elas não devam ocorrer em hipótese alguma, especialmente em momentos como o de agora. Mas acho que a história recente tem lições para nos dar. 👇🏾

Primeiro, a centralidade política do mal menor não impediu que o mal maior não se realizasse. Hoje temos o pior presidente do mundo e um país que se esvai a cada dia. É necessário refletir como nossas táticas contribuíram para esse Apocalipse. 👇🏾

Segundo: a centralidade que demos ao discurso do "mal menor" foi desnaturando o próprio sentido de esquerda no Brasil. Desde os anos 80, mesmo longe do poder, a esquerda detinha uma incidência e um impacto importante na hegemonia cultural e política no país. 👇🏾

Esquerda estava associada ao novo, à desestabilização da ordem, ao desconforme num país de injustiças, à crítica, à possibilidade de mudança. Obviamente não só por isso, mas o discurso do mal menor contribuiu para que hoje a esquerda seja identificada como o oposto do que era.👇🏾

Não nego que há uma campanha incessante de descredibilização da esquerda no Brasil. Mas isso não é algo novo, sempre existiu. Portanto, acredito que temos que nos perguntar como contribuímos para hoje sermos assimilados à institucionalidade carcomida, à ordem e ao estabelecido.👇🏾

Especialmente: como uma certa tática fagocitou o próprio sentido de ser esquerda no país.

Essa pergunta olha para o passado, mas ela é especialmente sobre o futuro. Diante da mais profunda crise do capital dos últimos tempos, o que a nossa geração tem como tarefa para o Brasil.