Recomendo bastante cautela ao avaliar a denúncia da PGR contra o governador do Rio, assim como o afastamento cautelar dele do governo. O mesmo vale para algumas medidas cautelares. Neste momento, é, infelizmente, impossível dissociar as razões políticas das razões jurídicas. 🧵
1. Este fio é necessário porque há indícios convincentes de que a PGR de Aras, especialmente por meio da subprocuradora Lindôra Araújo, que cuida desse caso, são aliados do presidente Jair Bolsonaro. Cujo principal inimigo é, ou era, Wilson Witzel.
2. A denúncia e a operação acontecem dois dias após a mesma PGR dar um parecer favorável a Flávio Bolsonaro junto ao Supremo, de modo a mantê-lo com foro privilegiado no TJ do Rio.
3. Por outro lado, por meio de informações junto a múltiplas fontes confiáveis, e, sobretudo, por meio da análise das evidências reunidas pelos procuradores e promotores do Rio, não tenho qualquer dúvida de que havia um esquema pesado de propina no governo do Rio.
4. Esse esquema ultrapassava os contratos de covid e tinha como beneficiário direto, ao menos em dois casos, o próprio governador do Rio. De modo geral, é possível afirmar que a corrupção dos governos anteriores prosseguiu, com outros personagens políticos, na gestão Witzel.
5. Numa análise preliminar, e essa é apenas a minha visão, havia elementos suficientes para uma denúncia contra vários dos envolvidos - mesmo contra o governador, embora fosse mais inteligente produzir mais provas, de modo a tornar a denúncia (bem mais) sólida.
6. Parece-me, enfim, uma denúncia em termos açodados, feita às pressas, como outras peças processuais desse caso, desde o início. No que tange à PGR, é um trabalho amador. Falaremos mais sobre isso nos próximos dias.
7. Quanto ao pedido de prisão (negado) e o afastamento concedido: creio, novamente numa análise preliminar, que se trata de uma medida desproporcional diante dos fatos disponíveis. A medida foi tomada monocraticamente pelo ministro Benedito Gonçalves, relator do caso no STJ.
8. Minha objeção inicial ao afastamento cautelar deve-se a questões processuais, à própria avaliação da proporcionalidade da medida perante os fatos e os crimes do caso - e às suspeitas inescapáveis da existência de razões políticas por trás das decisões, seja na PGR, seja no STJ
9. O ministro Benedito Gonçalves é um eterno candidato a uma vaga no Supremo, embora não tenha credenciais suficientes sequer para estar no STJ. Com todo o respeito ao ministro, a trajetória dele não inspira confiança e transmite credibilidade. Não se pode ignorar isso.
10. A Lava Jato do Rio e o MP do Rio estão avançando na descoberta do esquema de Witzel e de seus aliados. Compreendo que possa parecer implicância com a PGR. Mas, a meu julgar, a atuação dela tende a atrapalhar os resultados do caso sendo construído pela primeira instância.
11. Alguns do procuradores e do promotores estão felizes que haja uma PGR disposta a ir com tudo para cima de Witzel. Sabem com quem lidam em Brasília, mas são pragmáticos. Querem desbaratar organizações criminosas.
12. Contudo, essa disposição seletiva e implacável da PGR contra Witzel - e também contra outros adversários de Bolsonaro - pode, no médio e no longo prazo, servir para anular provas, atos processuais e resultar em impunidade. Ou seja, pode estragar os casos.
13. Caso se queira resultados significativos e duradouros, que possam resistir à avalanche inevitável de recursos num caso dessa magnitude, é fundamental tomar os passos estratégicos necessários.
14. Resultados bons e duradouros não são a destruição de Witzel. Para se chegar a eles, é essencial punir os responsáveis pela atual organização criminosa (quem corrompe e quem é corrompido) - e criar mecanismos para diminuir as chances de um novo esquema semelhante.
15. Falaremos bastante sobre esse caso nos próximos dias.
16. Adendo: eu analisei detidamente os autos do STJ, que estão em sigilo. Por compromisso com fontes, não posso subir no DocumentCloud, como busco fazer, para que todos formem suas opiniões. Os autos, porém, serão atualizados hoje ou nos próximos dias com mais documentos.
