A estratégia de Bolsonaro de atiçar o sentimento anti-chinês está longe de ser inovadora: é um velho truque, usado antes mesmo do país se tornar comunista. 👇🧵
Em 1882, por exemplo, o China Exclusion Act proibiu a imigração de cidadãos chineses para os Estados Unidos em meio a uma onda de sinofobia na Califórnia, que envolveu frequentes ataques contra os recém-chegados.
Apesar de surtir pouco efeito prático (havia uma grande demanda por trabalhadores chineses), a medida foi popular entre americanos que temiam a concorrência de imigrantes chineses. Mais de cem anos depois, a sinofobia foi central para a vitória de Donald Trump em 2016.
Na África, populistas em busca de um bicho-papão usam esse mesmo roteiro há anos. Em 2006, o candidato populista à presidência da Zâmbia Michael Sata atacou a China de maneira tão feroz que o então embaixador chinês ameaçou cortar laços diplomáticos caso ele vencesse.
Em seus discursos, Sata prometia se aproximar de Taiwan e chamava os investidores chineses de “infestadores”. Ele foi derrotado em 2006, mas acabou chegando ao poder em 2011.
No Brasil, foi só em 2018 que um político brasileiro com projeção nacional farejou a oportunidade de pintar a ascensão chinesa como uma ameaça a fim de mobilizar seus seguidores.
Bolsonaro acusou a China de querer “comprar o Brasil” e escolheu ErnestoAraújo como chanceler, q alertou para os perigos da “China maoísta” e de seus planos de dominação mundial. Tais argumentos estão longe de ser recentes e originais,mas ajudam a assustar e mobilizar seguidores
O mesmo vale para os ataques contra a ONU: hipóteses sobre uma suposta ameaça representada pela ONU nada mais são do que uma versão tupiniquim de ideias da John Birch Society, grupo americano de direita radical que argumentava, nos anos 1960, que a ONU atacaria os EUA.
Mesmo se Bolsonaro optasse por parar de demonizar o país asiático, já não haveria volta. A sinofobia será uma ferramenta de mobilização atraente demais para que futuros populistas a deixem de lado.
Esta semana, o monstro despertado por Bolsonaro pressionou o presidente pelo cancelamento da vacina. A franja lunática que compõe parte importante de sua base gostou da moda sinofóbica e já não se deixa controlar nem pelo presidente, nem pela pandemia.
brasil.elpais.com/opiniao/2020-1…

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20 Oct
Se Trump perder, será, acima de tudo, graças às mulheres americanas. A divergência entre o comportamento político de homens e mulheres nas eleições de 2020 tem proporções históricas. 🧵👇
Segundo uma nova pesquisa do Wall Street Journal, Biden tem uma vantagem avassaladora entre as mulheres, obtendo uma diferença de 60% contra 34% de Trump.
Já entre os homens, Trump lidera com 50% das intenções de voto contra 45% do democrata.
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19 Oct
Bolivia's socialist candidate Luis Arce looks set to win the country's presidential election without the need for a run-off, an unofficial counts suggest, which would put Evo Morales's MAS party back into power. A few thoughts: 🧵👇
If the results are confirmed (which should happen today or tomorrow), Arce is likely to be a very different president from Morales: Arce is an uncharismatic & ultrapragmatic technocrat, holds a Masters Degree in Economics from Warwick University and speaks English and Portuguese.
Arce grew up in a middle-class family in La Paz; both his parents were teachers. He's the polar opposite of charismatic Morales, who grew up in Isallavi, a village in Bolivia's poor Oruro Department, led the Cocalero Union & gave in to strongman compulsions late in his presidency
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13 Oct
Uma análise de como sociedades reagiram às pandemias ao longo dos últimos séculos revela semelhanças fascinantes com os dias de hj. Negar a doença, atacar médicos, promover teorias de conspiração, culpar um país asiático: quase nenhuma das estratégias vistas em2020 é novidade🧵👇
Em artigo recente, Birgit Aschmann, professora de história da Universidade Humboldt em Berlim, descreve a chegada da cólera na Prússia em 1831. Apesar das diferenças (cólera é uma bactéria), o ensaio sobre a reação da sociedade à doença revela numerosos paralelos com 2020.
Os prussianos chamaram a doença de "coléra asiática", ñ apenas por sua origem mas tb pela crença de q ela só afetaria civilizações vistas na época como inferiores. Quando a doença chegou naEuropa, o gov optou pela retórica nacionalista, mobilizou o exército e fechou as fronteiras
Read 9 tweets
7 Oct
Acabei de concluir a leitura de "A Invenção da Natureza", livraço da historiadora Andrea Wulf sobre Alexander von Humboldt (1769-1859), geógrafo prussiano q viajou pela América Latina e estudou como o desmatamento impacta o clima, criando a base para o ambientalismo de hj. 👇🏽🧵
Humboldt foi o 1° a descrever as funções fundamentais da floresta para o ecossistema e o clima: a capacidade das árvores de armazenar água e enriquecer a atmosfera com umidade e a proteção do solo. Tb escreveu sobre o impacto das árvores no clima por meio da liberação de oxigênio
Os efeitos da intervenção da espécie humana já eram ‘incalculáveis’, insistiu Humboldt, e poderiam se tornar catastróficos se continuassem a perturbar a natureza de forma tão "brutal" -- argumentos que só desembarcariam no mainstream da política 200 anos depois.
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6 Oct
A essa altura, todo mundo já notou que a pandemia pesou de maneira bastante desigual entre a população. Dois artigos publicados no @FinancialTimes e no @WSJ de hoje analisam o que mais contribui para a diferença. 🧵👇
Segundo as matérias, viver em um país dotado de um sistema de saúde funcional, não ter filhos e poder recorrer ao home office são os fatores mais decisivos.
O colunista Janan Ganesh conta como famílias com filhos pequenos foram as mais prejudicadas. Acúmulo de funções, conflitos conjugais e falta de preparo para assumir um homeschooling forçado fizeram com que mães e pais tivessem níveis de estresse muito além da média.
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5 Oct
Cresce a pressão para q Biden apoie mudanças históricas no sistema político caso seja eleito. A pressa republicana em aprovar a juíza nomeada por Trump fortaleceu osDemocratas q acreditam ser necessário copiar o “vale-tudo”republicano, jogando no limite máximo da Constituição👇🧵
Caso os democratas consigam vencer e garantir tanto a presidência quanto a maioria no Senado e no Congresso, três propostas ofensivas estarão na mesa. A primeira é transformar Porto Rico e Washington DC em estados, aumentando o número de senadores de 100 para 104.
Na prática, essas vagas adicionais passariam anos sendo ocupadas por democratas. A medida faz todo sentido e encerraria uma aberração no sistema político americano. A 2ª proposta consiste em acabar com o chamado filibuster no Senado.
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