O dicionário da ciência política - Noberto Bobbio

Anarquismo - THREAD (2/6)

II. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO
ANARQUISMO. — Com a Revolução Francesa e com o desenvolvimento industrial, nasce e se afirma um tipo de Anarquismo a que pode ser dado o nome de "moderno" e que permanece
ainda no debate político de nossa época. O primeiro índice desta mudança é a consagração do termo anarquia em sentido positivo, contraposto ao uso e até então quase que exclusivo, no sentido de
caos e de desordem. Com essa característica, sempre
absoluta do presente
social, apontando para uma ruptura revolucionária (a negação pura será talvez o único componente a ser
colocado em evidência), a anarquia recebe formas novas de elaboração teórica e de aplicação prática que
se vão acentuando, cada vez mais, com o decorrer dos anos.
No campo do debate doutrinai, o momento do desenvolvimento de um verdadeiro e próprio "pensamento anárquico" pode ser fixado nos fins do século XVIII, numa obra famosa e popular e ao
mesmo tempo grandiosa e abstrusa: a Enquiry concerning political justice de William Godwin.
Nessa obra, os temas, que se tornarão mais tarde típicos do Anarquismo, a recusa de autoridades governantes e da lei são inseridos numa dinâmica
dominada pela razão e por um justo equilíbrio entre necessidade e vontade, terminando na demanda de uma liberdade total no campo
ético-político, realizável apenas num regime comunitário que desaprova a propriedade privada. Estes princípios, diversamente
interpretados e ulteriormente elaborados, fornecem o ponto de partida para o desenvolvimento posterior de toda a corrente ideal que, no decorrer do tempo,
se identifica com o Anarquismo comunista, ao qual vários pensadores ou simples propagandistas juntarão,
continuamente, novos elementos. Se em Godwin o Anarquismo ainda não se apresenta como concepção completa, no decorrer do século XIX adquire uma
organicidade como expressão e ponto de encontro de um debate ideal que encontra, na realidade social, uma correspondência imediata. De quando em quando, o
Anarquismo apresenta-se com cores políticas e sociais e só raramente mantém integralmente a caracterização de prevalência
ética, que era notória na sua primeira existência histórica. Nesta luta evolutiva, participada por pensadores políticos e "organizadores" dessemelhantes entre si — como Proudhon e Bakunin, Stirner e Malatesta, Kropotkin e Tolstoi, e outros — vão-se configurando algumas divisões
Fundamentais e issensões as quais, apesar de múltiplas tentativas, não foram nunca sanadas. A cisão de base situa-se entre o Anarquismo individualista e o Anarquismo comunista. O primeiro, que tem como autor principal a Max
Stirner, apóia tudo sobre o indivíduo.
Este, através do próprio "egoísmo" e da força que dele deriva afirma-se a si mesmo e à sua própria liberdade mas apenas na condição existencial totalmente privada de
componente autoritário, em contraposição e também em equilíbrio com todas as outras forças e egoísmos dos outros
indivíduos, únicos na arrancada da ação para alcançar o fim último, que é a realização completa do EU, numa sociedade não organizada e
independente de todo o vínculo superior. O Anarquismo comunista, que representa historicamente um passo à frente em relação ao Anarquismo
individualista, vê a realização plena do EU numa sociedade onde cada um for induzido a sacrificar uma parte da liberdade pessoal, mais precisamente a econômica, pela vantagem da liberdade social. Esta
pode ser alcançada através de uma organização comunitária dos meios de
e do trabalho e numa distribuição comum dos produtos, na proporção das necessidades de cada um, desde que nela sejam salvaguardados os princípios fundamentais do Anarquismo, a saber, o exercício das mais amplas liberdades para o indivíduo e para a sociedade. Como subcategoria do
Anarquismo comunista, ou como
estádio mais atrasado do mesmo, encontramos o anarquismo coletivista, teorizado por Bakunin e
aplicado em Espanha, que propõe o comunitarismo do trabalho e da produção, colocando em comum todos os meios a ela necessários, mas deixando a cada um
usufruir individualmente os resultados do trabalho pessoal. No quadro das correntes descritas, interpõem-se outras subdivisões que acentuam os aspectos sociais
— de claras ligações com o mundo do trabalho e em particular com o proletariado — ou que fazem
ressaltar os módulos político-ideais, ou seja, a temática relativa ao Estado, ao Governo e, mais genericamente, à autoridade. Todas estas correntes que são mais para examinar em suas relações recíprocas e em seu devir histórico do que para aceitar
— dada a sua rigidez esquemática — plasmaram o substrato dentro do qual se moveu o mundo que até hoje se voltou para o Anarquismo.
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6 Nov
O dicionário da ciência política - Noberto Bobbio

Anarquismo - THREAD (1/6)

I. DEFINIÇÃO GERAL. — Não é possível dar uma definição totalmente precisa de Anarquismo. O ideal
designado por este termo, embora tenha sofrido notável evolução no tempo, sempre se manifestou e
manifesta como coisa realizada e elaborada, como aspiração ou como objetivo último e referencial, cheio de significados e de conteúdos, dentro da perspectiva
em que é analisado.
O termo Anarquismo, ao qual freqüentemente é associado o de "anarquia", tem uma origem precisa do
Grego anarkia, sem Governo: através deste vocábulo se indicou sempre uma sociedade, livre de todo o domínio político autoritário, na qual o homem se afirmaria apenas através da própria ação exercida
livremente num contexto sócío-político em que todos
deverão ser livres.
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4 Nov
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4 Nov
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e portanto terá perspectivas proletárias acerca da realidade em que está inserida. Da mesma forma, um indivíduo burguês terá perspectivas burguesas sobre a realidade.
Essas diferenças de perspectivas sobre os diversos contextos históricos e sociais que os indivíduos se encontram,
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24 Oct
THREAD: Os clássicos da sociologia (1/4)

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