Ainda sobre o caso Daniel Silveira. Sempre bom lembrar que pessoas muito próximas ao presidente, entre estes seus próprios filhos - especialmente Eduardo Bolsonaro -, já produziram material semelhante no passado, podendo ser enquadrados nos mesmos termos da prisão de Daniel.
Por isso o caso do Daniel não é tão simples quanto o abandono de um deputado governista, ele pode representar sim toda uma nova onda de conflitos entre os três poderes. O recado do STF foi muito claro, firmaram posição de que não vão mais aturar esse comportamento.
Reitero, uma nova aliança entre o executivo e o judiciário, como a que ocorreu no ano passado, me parece muito improvável. Ainda mais improvável que uma possível aliança entre o judiciário e o legislativo.
Não é sensacionalismo, a prisão do Daniel Silveira representa de fato uma escalada no jogo - como o próprio afirmou no vídeo da sua prisão -, uma espécie de freio de arrumação onde o executivo e o judiciário esperam ampliar a sua vantagem, forçando os atores a tomar uma posição.
Nada me tira da cabeça que o sujeito forçou uma penalidade máxima totalmente enebriado pela suposta conquista da câmara e a pulverização de qualquer oposição consistente ao projeto bolsonarista.
É preciso ter isso em mente, até mais do que supostos golpes em andamento. O sujeito fez o que fez apostando na posição dos seus companheiros do congresso. Lembrando que no ano passado, por exemplo, o congresso reverteu o afastamento do Wilson Santiago.
Atualização: congresso tá contra a parede agora, se vendo forçado a tomar uma posição definitiva.
Quem está por aí repetindo que o Daniel Silveira é apenas "mais um palhaço bolsonarista" deveria gastar uns cinco minutos entendendo o papel das forças de segurança na política carioca, especialmente dos bolsonaristas.
Como parte do plano de ocupação militar da cidade, desenhado lá nos tempos da Ditadura, o controle de áreas periféricas (favelas e subúrbios) foi destinado a grupos paramilitares formados tanto por policiais (civis e militares), bombeiros e civis. Os famosos grupos de extermínio.
Eu que nasci e fui criado no subúrbio do Rio, no apagar das luzes da Ditadura, vi isso ao longo da minha vida: a influência de PMs e/ou figuras associadas era um fato tão natural quanto o calor do verão.
Estou vendo análises sobre a prisão de Daniel Silveira que se focam muito na figura do próprio e esquecem que o evento está sendo utilizado como um freio de arrumação pelo STF. A corte marcou uma posição, um limite e mandou uma aviso de que vai para cima de quem ultrapassá-lo.
Lembrando que os filhos do presidente já falaram coisas semelhantes, inclusive, sobre - e abertamente - fechar o STF, Bolsonaro já participou de manifestações que exibiam faixas pedindo o mesmo. Grupos ligados diretamente aos aliados e aliadas do presidente já fizeram o mesmo.
Logo, a prisão do Daniel Silveira não é apenas sobre o próprio Daniel Silveira: ela estabelece um limite para o próprio bolsonarismo.
Daniel Silveira tirou o sono de Brasília, segundo relatos. Depois de adiarem a votação para hoje - para ganhar tempo -, algumas lideranças e assessores passaram a madrugada fazendo articulações para tentar garantir a sua soltura.
Tudo indica que o governo está emitindo sinais trocados. Não se manifesta publicamente, mas "instiga" assessores e lideranças a agir. "Estranhamente" passaram a circular mensagens no whatsapp isentando Bolsonaro de responsabilidade no caso e cobrando uma posição forte do Lira.
Se tem algo que eu não acredito é em coincidência, estas mensagens são a própria estratégia do bolsonarismo: vão tirar o Capitão da reta, dizendo que ele não pode se manifestar pois tudo isso é uma armadilha para causar um impeachment, e cobrar os "aliados".
A prisão do Daniel Silveira talvez marque um ponto de "não retorno" (tipping point) do Bolsonarismo. Daniel não é bucha de canhão, como a Sara Winter, diria - para nos mantermos na metáfora militar - que ele é algo como um Tenente de infantaria.
Daniel é uma figura proeminente, importante na articulação política de um setor fundamental do bolsonarismo: as forças de segurança, especialmente - mas não apenas, reforço - a Polícia Militar. Seu nome é recorrente em grupos de whatsapp.
Como a @tainalon demonstrou, é uma figura proeminente no ecossistema virtual do Bolsonarismo, atuando como disseminador de informações falsas e propaganda do governo. Dando a elas um ar de autoridade por se tratar de um "deputado federal".
Quando você analisa a linha do tempo você percebe que as direitas (e uso o termo em um sentido bem amplo) se aproximaram da internet com o intuito de realizar campanhas de contrainformação, especialmente em casos sintomáticos, como o da Juíza Patrícia Acioli.
A postagem do 01 não ocorreu no vácuo e tampouco foi origem de qualquer coisa, ela era o fenômeno de superfície de uma ampla campanha de difamação movida contra a juíza, com direito a supostos detalhes íntimos de sua vida, que já rolavam nas redes em 2011.
Esse tipo de operação - chamo de operação pois era obviamente organizada e tinha método e objetivos claros - era muito comum quando casos de violência policial vinham a tona. Lembram da morte do DG, dançarino do Esquenta? No dia seguinte supostas fotos suas com um fuzil.
Todo carnaval é a mesma coisa, abjet@s ligadas ao conluio neoliberal/miliciano/neopentecostal postam mensagens atacando a festa, muitos, inclusive, ganharam notoriedade dessa forma - lembram da jornalista falando do carnaval?.
E todo ano caímos, repercutimos e nos revoltamos.
Para vocês terem uma ideia do quanto esse tipo de estratégia é importante: o carnaval do "golden shower" foi um marco da mobilização das tropas de desinformação bolsonaristas, com direito a disparos e mobilização de bots. Superada, apenas, por momentos como a saída do Moro.
O motivo? A luta contra o carnaval é um ponto de encontro entre os milicos, evangélicos conservadores e neoliberais (grupos que em 90% do tempo estão batendo cabeça). Todos consideram a festa um tipo de "degeneração".