A gente não faz aniversários. Os aniversários é que vão fazendo a gente. E depois, pouco a pouco, nos desfazendo.
Pode-se medir a passagem do tempo pelos diferentes significados da frase “Feliz aniversário!”.
Do “Feliz aniversário!” que quer dizer “hoje é seu dia, que alegria, mais um ano de vida, comemore porque você merece” ao “Feliz aniversário” que quer dizer “que chato, mais um ano da sua vida que se vai, mas não ligue e comemore - com moderação porque você não tem mais idade”.
Do “Feliz aniversário!” como exaltação ao “Feliz aniversário” como ironia.
Até uma certa idade, se faz festa por um ano a mais. Depois de uma certa idade, se faz festa por um ano a menos. Mas aí a festa é para disfarçar.
O valor simbólico do aniversário é que ele marca a nossa integração no Universo - ou, pelo menos, no Sistema Solar. Assim como a Terra, nós também completamos uma volta em redor do Sol, e comemoramos o feito.
Não falta quem preferiria acompanhar cada volta de Saturno em torno do Sol, que levaria muito mais tempo, e economizar em cremes faciais e plásticas. Mas estamos presos à Terra e aos seus ritmos. E condenados a envelhecer junto com ela.
Antigamente (eu sou do tempo do antigamente), cantava-se só o Happy Birthday, em inglês, para o aniversariante. Depois surgiu o Parabéns a Você, não sei se por um prurido nacionalista ou porque ninguém acertava como fazer com a língua no “th” do “birthday”.
Dependendo da idade do aniversariante, o trecho do Parabéns a Você que diz “muitos anos de vida” pode ser mudado para algo como “e que folha corrida!” para rimar com “data querida” sem causar constrangimento.
Fora o Parabéns em vez do “Happy Birzdei”, as festas de aniversário não mudaram muito através dos anos. Novidade em matéria de velinhas só a vela que depois de apagada acende de novo, e de novo, e de novo, até o aniversariante enterrá-la no bolo com um tapa.
Festas de aniversário para crianças modernas são organizadas por empresas especializadas que cuidam de tudo, desde a decoração do ambiente até os doces e os shows de palhaços e mágicos que as crianças ignoram, preferindo fazer guerra de brigadeiros.
Mas os rituais continuam basicamente os mesmos, seja para crianças ou para adolescentes: o bolo com as velas, o Parabéns desafinado acompanhado com palmas, as meninas que vão em grupo para o banheiro e não saem mais, o menino chato que dá pontapé em todo o mundo etc, etc.
O que realmente mudou com o tempo foi festa de aniversário para adultos. Hoje, é comum convidarem uma “stripper” (nome que nenhum prurido nacionalista ainda aportuguesou) para o entretenimento quando o aniversariante é homem.
O show geralmente termina com a “stripper” nua no colo do aniversariante ou o aniversariante no colo da “stripper” nua e alguém dizendo “Se não servir, pode trocar!” ou coisa parecida. Mas novidade mesmo é “stripper” masculino tirando a roupa em aniversário de mulher.
A extensão da sua nudez depende de certos fatores, como a presença ou não na festa da tia Isoldina, que desmaiou na frente do Davi de Michelangelo, ou de não ter havido um mal entendido
- como na vez em que o “stripper” se recusou a tirar a cueca e finalmente conseguiu que ouvissem o que ele estava tentando dizer desde que batera na porta, que só estava ali para entregar uma pizza.
Confessemos: quem não gosta de ter seu aniversário lembrado? Os que dizem que não ligam pra essas coisas são os que depois mais gostam da festa, e mais riem com a velinha que não apaga, e regem o Parabéns e as palmas, e, se for o caso, saem dançando com a, ou o, “stripper”.
E, além de adorar todos os presentes, adoram comemorar esse fato fantástico: deram outra volta no Sol, e continuam vivos.
ÁRIES Atrás de você, cuidado! Brincadeira. Você não sofrerá nenhuma ameaça. Nem tudo será perfeito, claro, mas quando a vida lhe sorri, não importa que ela não tenha alguns dentes. Agradeça o que você tem, pare de sonhar com o impossível e não chateie. Sua cor é o marrom.
TOURO Aquele seu plano envolvendo o bispo, o anão hermafrodita e o contrabando de alfajores do Uruguai – você sabe do que eu estou falando – não daria certo. Deixe para a semana que vem, quando a Lua será propícia. Seu número de sorte é impar, maior que três e menor que 725.
GÊMEOS Simplifique a sua vida. Pare de pagar suas contas. Ande de chinelo de dedo com meias e lixe-se para os comentários. Você comanda o seu próprio destino. Mas muito cuidado nos cruzamentos, porque pode vir outro louco.
Finalmente liberadas as gravações que a NASA fez das experiências realizadas com o tenente da Marinha John Smith para testar o comportamento humano em condições de isolamento por longos períodos de tempo, iguais ao que o homem terá que enfrentar na exploração do espaço.
O tenente Smith foi escolhido pelas suas perfeitas condições físicas e mentais. Foi colocado dentro de um simulador de voo com comida bastante para dois anos e os instrumentos que normalmente levaria numa missão, inclusive um computador.
Todos os dias Smith teria que fazer um relatório verbal para que seu estado fosse avaliado. O que segue são trechos das gravações feitas dos seus relatórios. Primeiro dia. “Meu nome é John Smith. Estou ótimo. Passei todo o dia me familiarizando com este meu pequeno lar.
A pequena Capela de Nossa Senhora do Rosário do Padre Faria é uma das tantas joias arquitetônicas de Ouro Preto. O exterior despojado não prepara o visitante para a opulência barroca do interior.
O campanário fica afastado do corpo da igreja, como a “casinha” numa morada sem banheiro, e nada tem de imponente.
Os sinos da Capela de Padre Faria badalam em concerto com os outros sinos da região, cantando as horas e os eventos, e não soam nem melhor nem pior do que os outros. Mas os sinos da Capela do Padre Faria têm uma história diferente dos outros.
Dizem que o Antônio Maria foi visitar o Ary Barroso pouco antes desse morrer. Eram amigos, mas o Ary Barroso implicava com as músicas do Maria e, um notório vaidoso, tinha um pouco de ciúmes do sucesso do outro. Prostrado na cama, Ary pediu ao visitante, com voz sumida:
- Maria, canta “Aquarela do Brasil”.
O Antônio Maria olhou em volta embaraçado.
- O que é isso, Ary?
- Maria, canta “Aquarela do Brasil”.
Muito sem jeito, Antônio Maria começou a cantar. Afinal, era o pedido de um moribundo.
Cantou toda a música, acompanhando-se com uma discreta batucada de palmas.
O Ary ouviu tudo de olhos fechados, com a cabeça atirada pra trás. Quando Maria terminou, ainda de olhos fechados, disse:
Ele: tirolês. Ela: odalisca. Eram de culturas muito diferentes, não podia dar certo. Mas tinham só quatro anos e se entenderam. No mundo dos quatro anos todos se entendem, de um jeito ou de outro.
Em vez de dançarem, pularem e entrarem no cordão, resistiram a todos os apelos desesperados das mães e ficaram sentados no chão, fazendo um montinho de confete, serpentina e poeira, até serem arrastados para casa, sob ameaças de jamais serem levados a outro baile de Carnaval.
Encontraram-se de novo no baile infantil do clube, no ano seguinte. Ele com o mesmo tirolês, agora apertado nos fundilhos, ela de egípcia.
RINGO - Pô, eu primeiro? Logo eu, o narigudo, o palhaço da turma? Mas vamos lá. Tudo começou na minha casa mesmo. Na minha garagem. Meu pai tinha me dado uma bateria. Depois que a velha morreu (câncer) o velho me dava o que eu pedisse. (...)
Mas eu não ia pedir qualquer coisa para aproveitar o descorneio do velho. Fiquei entre a bateria e uma lambreta. Escolhi a bateria e comecei a ensaiar na garagem. O velho me deu a maior força. (...)
Era aposentado pelo INPS mas dirigia um táxi, e tirou o táxi da garagem pra dar lugar pra minha bateria. E brigava com os vizinhos que reclamassem do barulho. Encarava mesmo. O velho era faixa. Faixão. (...)