Thread by @louverture1984

Então, esse é um tema que me é caro - embora minhas pesquisas foram focadas nos anos 40, 50 e 60.

Dito isso, posso antecipar algumas coisas desses casos:

economia.uol.com.br/noticias/redac…

1) Não é (ainda) hiper-inflação, mas toca em "fantasmas" do passado. E eles podem ser explorados politicamente - quem lembra da Ana Maria Braga com colar de tomates?

Para além disso, uma subida brusca nos preços de um produto nunca é só de um produto. (+)

Tem também os seus derivados (p. ex., queijo, leite, manteiga, iogurte etc). E tem também o aumento dos substitutos (porco, galinha) e seus derivados.

E nem falamos dos insumos aqui...

2) Conter um aumento de preços é uma preocupação intervencionista. Um liberal mais ortodoxo pode dizer que os tempos se ajustam conforme o tempo, mas até lá, o aumento se normaliza - e pode inclusive tornar-se recorrente. (+)

Isso porque, o aumento do preço não é só monocausal. Nos anos 50, por exemplo, a oferta de carne no mercado interno não dava conta da demanda, mas continuávamos exportando carne.

Mas quando as exportações diminuíam, o preço não caía automaticamente. (+)

Redes de distribuição - atacadistas, mas não só - tinham ganho uma boa grana repassando os preços para os varejistas. Retomar ao preço antigo poderia reduzir sua margem de lucro.

3) Varejistas sempre perdem nessa. É o caso do açougueiro que prefere diminuir o lucro por peça (inclusive aceitando algum prejuízo) do que vender menos.

E aí um detalhe "histórico". (+)

Certas práticas intervencionistas foram muito comuns no Brasil, entre elas, o tabelamento de preços. E, nesses casos, novamente, quem se dava mal era o varejista.

Para lidar com isso, ele recorria a certas estratégias. Alterar pesagem, substância, açambarcar mercadoria... (+)

...vender por preço acima do tabelamento, enfim. Tudo isso que constituía (e constitui) crime. O argumento dos liberais da época é que se deixassem os preços livres, os varejistas não seriam prejudicados e gradualmente haveria normalização no abastecimento. (+)

Mas aí a dura realidade: nunca houve essa normalização. Medidas que tiravam o tabelamento das praças só agravaram os problemas do custo de vida. E os governos que arriscavam essa medida, logo em seguida mudavam de ideia. (+)

(afinal, como lembra Amartya Sen, numa democracia, ninguém quer ter como herança política a privação das pessoas no mercado de alimentos)

4) O governo Vargas foi o que mais investiu no intervencionismo no mercado de preços. Para além das tabelas, em 1951 ele mandou para o Congresso uma lei que tipificava "crimes contra a economia popular". (+)

Eram leis duríssimas e que previam, entre outras coisas, um julgamento com júri popular e tudo (na época, só crimes de homicídio doloso passavam por júri popular). E mais: os júris seriam compostos por sindicalistas - embora, no Senado, essa determinação mudou e ...(+)

...eles passaram a ser julgados por cidadãos de determinadas zonas eleitorais.

Desnecessário dizer que não deu certo. E que no final das contas, só os varejistas eram autuados e os preços seguiam subindo.

É comum que o intervencionismo dependa de suporte popular - alguém aí lembra dos "fiscais do Sarney"? Mas se ele não atacar os problemas estruturais do aumento de preços, ele se torna inócuo.

5) Pô, mas qual a solução?

Nos anos 1960, as esquerdas já tinham essa resposta. Reforma agrária para reduzir a vocação exportadora e o latifúndio. Não tem jeito, não.

Ou de outra forma, a cadeia produtiva vai quebrando os pequenos comerciantes que, para não se ferrarem (+)...

...vão, sim, repassar os preços para os consumidores.

E não é o açougueiro da esquina que tem que enfrentar um tribunal popular, não.