A coisa mais difícil que tem é um time executar a estratégia do treinador à risca...

Pois foi exatamente o que o Palmeiras fez hoje.

O time seguiu, do início ao fim, a arapuca que Andrey Lopes pensou para surpreender o Atlético-MG de Sampaoli. Vamos aos detalhes no fio 👇 Image
Andrey Lopes sabia que o Galo ia começar o jogo com uma postura propositiva e com três jogadores na saída de bola.

Quem faz o desenho varia, e muito, mas a estrutura é quase fixa com Sampaoli: três fazem a saída, dois ficam à frente e mais cinco se postam ao ataque.
Mais importante que o desenho é entender o porquê dele. Se pergunte mais o porquê das coisas.

Por que o Sampaoli gosta desse 3-2-5? Simples: ele quer superioridade numérica em duas etapas do jogo: iniciação das jogadas e finalização, como o campinho mostra. Image
O plano de Andrey começou justamente aí: impedir essa superioridade numérica. Por isso ele mudou a função de Wesley e Rony. Eles não voltavam pra ajudar o lateral, como é de costume em times que jogam no 4-2-3-1. Eles fechavam espaços por dentro e vigiavam de perto Alonso e Guga. Image
Se um dos zagueiros de lado do Galo tocasse na bola, Rony e Wesley tinham a responsabilidade de pressionar e não deixar eles passarem a bola. Isso induzia o Galo a voltar pro goleiro e para Réver, o menos "técnico" desse trio.

Olha aí o Rony pressionando seu alvo, Alonso. Image
Já Luiz Adriano e Veiga não tinham que avançar tanto. Eles cobriam o espaço de Allan e Jair, os dois volantes do 3-2-5 do Galo.

Assim, o Galo tinha cinco jogadores contra seis do Palmeiras, contando a dupla de volantes. Só contar que...é isso mesmo, inferioridade numérica. Image
Toda a filosofia de Sampaoli, uma intepretação do Jogo de Posição, se baseia na criação de superioridades no jogo. Se o adversário tira isso, obriga os jogadores a pensar fora da zona de conforto, quebrando o automatismo que faz o time ser tão ofensivo.
globoesporte.globo.com/blogs/painel-t…
Ah, e se quiser saber mais sobre automatismo, expliquei direitinho o que é o conceito aqui, que pode ser traduzido livremente para "jogar de cabeça".
globoesporte.globo.com/blogs/painel-t…
Uma boa estratégia é aquela que pensa em vários cenários.

E se Wesley e Rony deixam o adversário jogar? O Palmeiras tinha um plano: Luiz Adriano e um dos volantes cobrindo a linha de passe de Jair e Allan, o "2" do tal 3-2-5 que Sampaoli faz.
Não apenas Luiz e Veiga, mas Felipe Melo e Zé Rafael ajudavam nesse cerco. Aqui, Luiz Adriano vai tentar roubar a bola de Allan e Felipe Melo sobre com Jair. Wesley e Rony continuam pelos lados. O setor deles é o dos zagueiros. Nesse miolo, a responsabilidade era de outro. Image
Se você acha que tudo isso é uma grande retranca, espere.

Essa estratégia do Palmeiras também pensava no ataque. Com um pequeno detalhe: o posicionamento de Raphael Veiga.
Quando os volantes subiam, Veiga ficava mais à frente, como nessa imagem.

A ideia é que ele servisse de pivô ou de ponto futuro para quem roubasse a bola. Dava profundidade ao time para que o Palmeiras retomasse e tivesse como iniciar o contra-ataque. Image
A ideia era explorar sua velocidade e posicionamento e fazer ele ficar nas costas de Réver, que é mais lento e algumas vezes tem problemas ao girar o corpo e se posicionar para retomar a bola.

O lance do gol é um exato exemplo dessa movimentação e percepção do Veiga...
E também da passagem do Matias Viña, um dos melhores do Palmeiras no ano. Como os lados não eram ocupados pelos pontas, foram os laterais que tinham que apoiar e tomar conta do corredor. E o Veiga nas costas dos zagueiros do Galo. Image
É normal achar que uma estratégia, por ter dado certo, é perfeita. Não é. Nada no mundo é perfeito!

O que o Palmeiras fez hoje foi maximizar os pontos positivos dessa estratégia e minimizar os riscos que vinham com sua execução.

Você consegue saber quais riscos são esses?
Tá lá no campinho: se o Galo tinha uma linha de 5 no ataque e o Palmeiras marcava o meio com 6, tinha só quatro defensores contra Arana, Savarino, Zaracho, Nathan e Marrony.

A linha de defesa teve que atuar na ponta da faca e muitas vezes deixava a amplitude com o Galo. Image
É um risco. Mas se o Savarino tá marcado e o Zé Rafael rapidamente trocou o momento e foi dar cobertura, a chance de uma inversão de bola encontrar o homem aberto no outro corredor é mínima...

Veja: risco existe. Ele apenas é maior ou menor dependendo da situação.
Em outros momentos, era Felipe Melo, de volta na volância, que marcava Zaracho. Aí o lateral batia com Arana, que fez a função normalmente de Keno ou Marquinhos no Galo.

Não é um erro de Sampaoli. Apenas o que ele planejou foi totalmente neutralizado por Andrey Lopes. Image
Agora, já pensou se o Wesley ou Rony não pressionam o zagueiro e a bola encontra o ponta?

E se Luiz Adriano não se dedica na marcação de Allan?

E se Viña não corre o tempo inteiro pra ir e voltar?

Estratégias precisam serem executadas por TODOS para dar certo.
O mínimo errinho ali permitiria ao Galo pegar a linha de defesa do Palmeiras toda desconectada como foi no início do segundo tempo, quando Sampaoli alterou o posicionamento de Nathan. O gol de Rony abalou o emocional e abriu caminho para o 3 a 0. Foi no timing certo.
É nítido que Andrey Lopes deixa um Palmeiras mais organizado e competitivo para Abel Ferreira. Wesley, Rony e F. Melo cresceram de rendimento com o auxiliar. O time como um todo cresceu, e a vitória sobre um ex-líder do Brasileirão, hoje, foi puramente autoral.
Abel também terá o que aproveitar para colocar suas ideias, que pasmem - são até parecidas com as de Sampaoli! Muda a lógica, mas o 3-2-5 do time no ataque é IGUALZINHO, como você lê aqui na análise.
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Uns chamam de nó tático, outros de pura estratégia...fato é que não é todo dia que vemos um time aplicar certinho, timtim por timtim, o que o técnico pensa e executa nos treinos e preleções.

É preciso leitura de jogo, capacidade de treino e didática. Méritos para Andrey Lopes! Image
Fiz um outro grupo de análise tática no Whatsapp, já que os outros lotaram. Colem lá. Link 👇

chat.whatsapp.com/LP2y2ZMmkyO73L…
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globoesporte.globo.com/futebol/futebo…
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