A semana começa com uma notícia excelente! Resultados preliminares da BioNTech apontam uma vacina candidata com eficácia de 90%. Bem mais do que eu esperava! São resultados preliminares, mas muito animadores.
Segue um fio com pontos fortes e pontos fracos.
São 44000 voluntários no estudo desenhado pra acompanhar até 164 casos de coronavírus. O que deve acontecer até o fim do mês. Ela funcionou tão bem que já deu bons resultados preliminares. Uma eficácia de 90% quer dizer que entre os vacinados, 10x menos pessoas pegaram corona.
Pode ser que a eficácia caia um pouco, mas 90% é ótimo e algo próximo ainda é ótimo. No caso da gripe, a vacina reduz hospitalização em ~40%, mas reduz internações em UTI em mais de 80%. A redução de casos graves de COVID, o gargalo, deve ser excelente. cdc.gov/flu/spotlights…
Agora sobre os aspectos menos animadores. Essa vacina é de RNA, ela usa o genoma do vírus pra nossas células fazerem a proteína Spike dele (a parte de fora) e o corpo atacar isso. É um método novo de vacinação e a produção disso é bem técnica e difícil de distribuir.
Algumas vacinas como a Coronavac podem ser feitas em centros como Butantan. Essa de RNA pode não ser tão escalável. Vamos depender das 1,3 bilhão de doses que Pfizer e BioNTech podem fazer até o fim de 2021, o que vacinaria por volta de 500 milhões de pessoas (são 2 doses).
Além disso, o maior problema é o transporte e o armazenamento dessa vacina. Em termos de logística, a vacina de RNA é a pior de todas, porque degrada fácil e precisa ser armazenada e transportada a -80 °C. Isso é uma temperatura extremamente baixa e muito difícil de conseguir.
-80 °C só se atinge com freezers industrias caríssimos e gelo seco (o que tem faltado com a pandemia). Mesmo países como os EUA devem ter dificuldade fora de grandes centros urbanos. Vão testar temperaturas mais amenas, tomara que continue eficaz. nytimes.com/2020/09/18/bus…
Se os resultados se confirmarem, precisaremos esperar até 2022 pra ter vacinados o suficiente pra relaxar com o distanciamento. Isso pode se adiantar com outras candidatas funcionando (🤞).
Mais motivos pra caprichar em testes e rastreio e garantir que todo mundo chega lá.
Torcendo pra não guardarem mágoas. Já vamos ficar de fora da primeira leva de doses da Pfizer porque o governo federal do Brasil ignorou o contato deles em julho. Agora vamos pro fim da fila.
E não é só o Brasil comendo bola. O vice-presidente americano anunciou que os testes deram certo por uma parceria entre a @pfizer e o governo americano, pra em seguida ser desmentido pela farmacêutica
Proteção coletiva depende quantos tão imunes ao coronavírus, ela vem mesmo acima de 60%.
O quão rápido chegamos nisso depende de: quão eficaz é a vacina (90% é ótimo), quão rápido distribuímos (depende da Pfizer) e quão cedo começamos (Brasil vacilou).
A distribuição da Pfizer/BioNTech vai ser atrasada pela necessidade de manter a vacina a -80 ºC. Ou contornam isso ou vamos gastar muito, muito mesmo, pra viabilizar isso em grande escala. Só com uma eficácia bem alta pra compensar (o que aparentemente rola).
Já no quão cedo começamos, o Brasil foi coerente na competência geral contra a COVID e perdeu a chance de ter doses ainda este ano. Por enquanto, dependemos do que cada estado firmou com a farmacêutica.
90% de eficácia preliminar vale um otimismo cauteloso. Agora é trabalhar pra garantir que o maior número possível de pessoas vai continuar sem contato com o vírus até serem imunizadas.
Ainda tô surpreso com os 90%. Fico surpreso pq a maioria dos vírus respiratórios não tem vacina, pq não respondemos bem. E a vacina de gripe, outro vírus respiratório, tem 60% de eficácia em um bom ano. Refletindo um pouco mais sobre isso, vejo um horizonte legal.
A estratégia da BioNTech, uma vacina de RNA, é nova. Não temos vacina desse tipo em humanos e se questionava se ela despertaria imunidade. Essa eficácia se confirmando, tem duas explicações que são bem interessantes.
Temos 6 meses de adianto pra saber que o inverno que vem vai ser complicado. No começo do ano, desperdiçamos 3 meses de aviso. Contar com a vacina é contar com a sorte. Temos que crescer capacidade de testes, rastreio de contato e isolamento de doentes. Temos tempo pra isso.
"Com o vírus suprimido depois de meses de restrições sociais intensas na primavera passada, os líderes europeus agiram logo para acelerar a reabertura da sociedade para tentar estimular uma recuperação econômica.Mas os bolsões de infecção persistiram..."
"...e poucos países implementaram sistemas adequados para rastrear e bloquear os surtos locais. Para piorar as coisas, em várias regiões, as taxas de infecção nunca caíram a um nível em que esses sistemas pudessem funcionar de maneira eficaz."
Saiu um estudo fundamental sobre medidas de isolamento. Avaliaram o efeito de vários tipos de medidas, como fechamento de escolas, aglomeração, trabalho de casa, etc., na transmissão do vírus em 131 países. Medidas fundamentais pras políticas públicas que virão. Segue o fio.
Começando com achados mais importantes, que têm vários poréns que explico: fechar eventos públicos foi o que mais reduziu casos e reabrir escolas e permitir aglomerações de +10 pessoas (bares, academias, igrejas e afins) foi o que mais aumentou a transmissão novamente.
Brasil não entrou, mas lições são bem válidas. Cada país adotou as medidas de um jeito – fechamento de escolas, por exemplo, foi gradual ou abrupto, todas idades ou só algumas. E cada país faz testes de uma forma. Então o que é relevante apesar da confusão, faz muita diferença.
Saiu o manuscrito do teste clínico da nitazoxanida (anitta). Foi o estudo de 392 pacientes mesmo (clinicaltrials.gov/ct2/show/NCT04…). Recomendo muito esperar o artigo científico. A revista onde sair e as diferenças pro artigo vão indicar a qualidade dos achados. medrxiv.org/content/10.110…
O tipo de teste é ótimo, randomizado (as pessoas são sorteadas pra serem tratadas), duplo cego (nem pacientes nem médicos sabem quem tomou droga ou placebo) e multicêntrico (mais de um hospital). Vai depender bastante da análise agora.
Segundo eles, a carga viral foi reduzida. Mas daí a implicar em melhora clínica, tem um bom caminho.