Thread by @pablovillaca

Vi o doc Til´ Kingdom Comes, sobre a relação entre os evangélicos dos EUA e os judeus pró-assentamento na Cisjordânia. É sempre assustador constatar o que acontece quando a política passa a ser realizada através de um filtro religioso.

Nos EUA (e no Brasil), o movimento evangélico se mostra mais sionista do que Theodor Herzl, coletando doações de seus seguidores para enviar para assentamentos judaicos na Palestina.

A pergunta é: por quê?

A resposta é complexa e envolve vários interesses, mas... +

Um dos aspectos mais malucos desta ligação é o fato de que, em essência, os mesmos evangélicos que dizem amar Israel são antissemitas por natureza. Por quê? Porque acreditam que, no Fim dos Tempos, só os judeus que aceitarem Jesus se salvarão. O resto... já sabem. (Pois é.)

Ao mesmo tempo, eles acreditam também que Israel é a terra escolhida por Deus e para onde Jesus retornará em sua segunda vinda. Só que, para que isto aconteça, os judeus devem "retornar a Israel" e uma guerra santa acontecerá.

É por isso que tantos evangélicos celebraram a decisão de Trump de mudar a embaixada para Jerusalém. E também o aval que deu a Netanyahu para anexar assentamentos na Cisjordânia, pois isto fortaleceria o Estado de Israel e... o que é perverso... estimularia conflitos na região.

Este interesse em ver esta guerra ocorrendo na Palestina é algo que o conselho religioso (dominado por evangélicos) formado para orientar Trump assume sem reservas. Para que Jesus retorne, este conflito é essencial.

Já os interesses israelenses pró-assentamento são beneficiados politicamente pela influência dos evangélicos sobre governos de direita E através do dinheiro doado pelos evangélicos para os assentamentos - e o antissemitismo destes é convenientemente ignorado.

Aliás, há um momento em Til´ Kingdom Come (dirigido pela israelense Maya Zinshtein) em que a presidenta da Sociedade Internacional de Cristãos e Judeus visita uma região miserável de Kentucky para conhecer os influentes pastores locais e durante o qual duas coisas acontecem:

1) Ela fica horrorizada ao ver as casas em que as pessoas moram, que parecem abandonadas de tanta miséria (50% das crianças de Kentucky vivem abaixo da linha de pobreza). No entanto, em vez de comovida, ela afirma que as comunidades que doam para sua fundação prosperam mais.

2) Para celebrar a visita dela, o pastor local faz um sermão cheio de antissemitismo ("os judeus terão que aceitar Jesus", etc, etc). Indagada pela documentarista sobre isso, ela desconversa, deixando claro que o que importa são as doações.

Para tornar tudo ainda mais absurdo, há atividade cristã (evangélica, inclusive) na Palestina - poucas, mas há - e que está sendo ameaçada pelas ações brutais de Israel. Adivinhem só se os evangélicos norte-americanos se preocupam com seus irmãos na Palestina?

Enfim. É um assunto complexo, mas fundamental por vários motivos, já que estes mesmos movimentos pró-assentamento, sionistas (mas antissemitas), proliferam também no Brasil, ganhando cada vez mais força na política.

Perdão pelo fio longo.