Poucas coisas me impressionam mais do que ver a defesa do governo chinês por progressistas ocidentais.
Nenhuma nação tão influente no mundo rejeita com tamanha veemência os valores progressistas e persegue tão abertamente minorias quanto a China.
Quer ver só?
É LGBT? Má notícia.
O casamento gay e a adoção de crianças por casais LGBTs não são permitidos na China. Imagens de homens usando brinco podem ser borradas na tv pela censura como parte de uma agenda para reforçar as noções tradicionais de masculinidade.
A China proíbe representações LGBTs na tv como parte de uma repressão a “conteúdo vulgar, imoral e prejudicial à saúde”, comparável à "perversão sexual, agressão sexual, abuso sexual, violência sexual e assim por diante" (as aspas são do governo).
É mulher? A mera organização de protestos feministas pode levar à prisão na China.
Discussões sobre gênero também podem ser censuradas na internet.
Essa aqui é a introdução da jornalista @SoniaBridi, que foi correspondente em Pequim, para o livro "Enfrentando o dragão".
A violência contra as mulheres é uma prática generalizada na China.
A primeira lei que visa especificamente proteger as vítimas de agressão doméstica só foi aprovada em 2015, após 66 anos de regime. Até então, bater na esposa era uma prática legal. theguardian.com/world/2015/dec…
É professora?
Em 2016, Pequim saiu em busca de professores homens para substituir as mulheres e reafirmar a masculinidade nas escolas.
Sabe o "meu corpo, minhas regras"? Não existe na China.
Por lá, leis regulam para que a tv não retrate decotes e transas de uma noite, considerados "pornografia e gosto barato", assim como "homossexualidade", "casos extraconjugais" e "liberdade sexual".
Cantoras como Katy Perry, Beyoncé, Britney Spears e Lady Gaga - ícones da cultura progressista ocidental - foram censuradas na China com a desculpa de que são "vulgares".
Quer protestar contra tudo isso na internet? Pequim produz a maior censura virtual do planeta, bloqueando 10 mil domínios estrangeiros, incluindo os maiores grupos de direitos humanos do mundo.
Gosta de igualdade social? A China é quase tão desigual quanto os EUA.
E quem diz isso não sou eu: é Thomas Piketty. O último livro dele, "Capital e Ideologia", lançado em 2019 com duras críticas à desigualdade chinesa, foi censurado na China.
A China foi condenada por um tribunal internacional por promover a extração à força de órgãos de presos - alguns ainda vivos - para vender num mercado negro de transplantes que movimenta US$ 1 bilhão por ano no país.
As autoridades chinesas matam mais prisioneiros todos os anos do que o resto do mundo somado. bbc.com/news/world-asi…
Há anos o país promete interromper a prática de extrair órgãos de seus presos executados. Nada indica que tenha parado. theguardian.com/science/2019/f…
É religioso? O governo chinês vê a liberdade de crença com maus olhos.
Quando a atriz Ning Jing visitou Dubai no reality show "Divas Hit The Road", por exemplo, a censura oficial chegou a substituir seu lenço religioso, tradição islâmica, por isso aqui:
Há pouco tempo, Pequim reuniu um grupo de estudiosos para "traduzir" a Bíblia, com o objetivo de criar uma nova versão do cristianismo e eliminar passagens consideradas incompatíveis com o partido.
Se o racismo contra negros gera revolta no Ocidente, na China ele é generalizado.
No programa de intercâmbio que conecta alunos chineses a escolas dos EUA, a maioria dos candidatos solicita que seus filhos não sejam enviados para casas de famílias negras. thediplomat.com/2020/04/racism…
Militantes negros são perseguidos pela polícia chinesa depois que escrevem sobre racismo na internet. buzzfeednews.com/article/lester…
Há uma longa história de discriminação contra negros na China - sem debate público, cobertura da imprensa ou manifestações. theguardian.com/commentisfree/…
Em 2020, inúmeros casos de negros impedidos de entrar em lojas, hotéis e hospitais foram registrados na China. edition.cnn.com/2020/05/25/asi…
Em 2020, diferentes diplomatas africanos protestaram contra o racismo na China.
Governos de diversos países - como Nigéria, Gana, Quênia e Uganda - convocaram embaixadores chineses para receber protestos formais sobre os incidentes de racismo no país.
É irônico que um governo que diz falar em nome dos "proletários" comande um país tão abertamente reconhecido no mundo pela exploração da mão de obra barata de seus operários, com muitos trabalhadores em "fábricas de suor", sem proteção estatal. chinalaborwatch.org
Em 2020, as democracias que melhor protegem os direitos humanos no mundo condenaram a China na ONU. Entre outros: Alemanha, Austrália, Canadá, Dinamarca, Finlândia, França, Holanda, Noruega, Suíça.
Do governo do Partido Socialista Operário Espanhol à Esquerda Verde da Islândia.
Mais de 300 grupos de direitos humanos - da Anistia Internacional à Human Rights Watch - de mais de 60 países - do Azerbaijão à Malásia - também pressionaram a ONU em 2020 para enfrentar com rigor as violações dos direitos humanos do governo chinês.
E apesar disso tudo, sobram progressistas por aqui dispostos a tomar as dores de uma ditadura que persegue LGBTs, feministas e minorias étnicas, impede protestos, explora presos e operários, censura arte e ONGS de direitos humanos, enquanto ridiculariza os próprios progressistas.
A razão? Comportamento de manada, ignorância crônica, maior compromisso com grupos do que com ideias, dissonância cognitiva, falta de independência, despeito com a democracia e os direitos humanos.
Fingem abraçar o progresso. Estão engajados em promover a barbárie.
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Trump, sobre a mudança da constituição chinesa que deu poder "vitalício" a Xi Jinping:
"Xi é um grande cavalheiro, agora é presidente vitalício. Ele é ótimo. E olhe, ele foi capaz de fazer isso. Talvez tenhamos que tentar isso algum dia."
@franciscorazzo É slogan de jovem tuiteiro de classe média. Virou mantra, discurso patriota do funcionalismo público, que fora desta bolha verde e amarela nacionalista do serviço público diz muito pouco.
@franciscorazzo Na vida real, a saúde pública é a maior preocupação dos brasileiros. Este é um país com uma série de problemas - nenhum deles é maior que a saúde pública para a própria população. E isso diz muito.
@franciscorazzo Não sem motivo, este é um povo que sonha com carteira assinada para ter a possibilidade de contar com um plano de saúde privado como benefício. Enquanto o jovem tuiteiro faz hashtag pelega, ascensão social para a dona Maria é ter Unimed.
Não é uma tarefa fácil alimentar 1.4 bilhão de seres humanos. Os números são descomunais.
Por ano, os chineses consomem 8 milhões de toneladas de carne bovina, 15 milhões de toneladas de peixe, 60 milhões de toneladas de porco e 143 milhões de toneladas de arroz.
Colocar comida na mesa de tanta gente exige muita logística. E é ainda mais difícil na China.
A China tem 9,6 mi de km², mas uma área cultivada de apenas 1,27 mi.
Ou seja, embora 18% da população mundial seja chinesa, a China só atende por 7% da área cultivada total do planeta.
Da próxima vez que você encontrar algum pós-adolescente defensor da União Soviética por essas bandas, conte a história dessa foto pra ele:
Na década de 1940, os estados bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia) foram ocupados pela União Soviética graças a um acordo entre Hitler e Stálin conhecido como Pacto Molotov-Ribbentrop (Ian Kershaw, biógrafo de Hitler, conta que Stálin fez um brinde a Hitler após a assinatura).
Exatos 30 dias depois, as tropas da Alemanha Nazista e da União Soviética organizaram um desfile militar, durante a invasão da Polônia, na cidade de Brest-Litovsk.
Aproveitando a publicidade da "vacina" russa, essa aqui é uma thread com as maiores "curas" e "tratamentos" para Covid-19 anunciadas até aqui.
Tome nota:
Gurbanguly Berdymukhamedov, ditador do Turcomenistão, autor de livros sobre remédios à base de plantas, recomendou à população tratamento à base de fumaça de harmala, uma planta alcalóide que, segundo ele, é "capaz de matar qualquer vírus invisível".
Alexander Lukashenko, outro ditador, mas da Bielorússia, sugeriu para conter Covid-19: de 40 a 50 mililitros de vodca por dia, sauna de duas a três vezes por semana, hóquei no gelo, positividade e um tratamento à base de "trator no campo".