#Thread sobre o artigo hoje tão falado artigo do American Journal of Medicine (mas que é de 7 de agosto de 2020)...
E como ele não muda o tratamento do COVID...
É mais um artigo de opinião e proposta de fluxo. Tendencioso.
Não configura evidência científica relevante já que não é revisão sistemática ou integrativa (por exemplo), desconsidera diversos RCT ja publicados e discutidos. E tem vies.
Começo pelos autores:
• Zervos é do Henry Ford, grupo americano pro-cloroquina, responsável por um estudo retrospectivo, com falhas importantes de análise de dados e respectivamente em suas conclusões
• Risch é epidemiologista - principalmente na área de oncologia, renomado e respeitado, professor de Yale. Mas entrou em uma cruzada pró-cloroquina. Ficou “famoso” no COVID por artigo de opinião no Am J Epid. Tem associação com um trabalho da Hapvida, e diversos outros. MAS...
...perdeu a credibilidade no meio por se associar a qualquer coisa que favoreça cloroquina, independente da qualidade da evidência. E por isso inclusive hoje sofre com notas de repúdio e posicionamento dos seus pares na faculdade de medicina de Yale...
Da parte clinica, do fluxograma:
- carecemos de evidências que suportem uso de zinco ou vitamina D rotineiramente.
E não dá para justificar pelo tempo. A pandemia tem quase 1 ano e RCTs bem feitos estão aí;
- a clássica confusão do conceito de imunomodulação de macrolideo/tetraciclina em pacientes respiratórios - na dose do trabalho , tem ação antibiótico, e não imunomodulador. Além disso, RCTs ja abordam a questão da ausência de benefício de Azitro.
- estranho também fracionar a dose de Azitromicina em bid (2x dia), se temos a mesma posologia e farmacologicamente seria mais util e possível 1xdia
- mais estranho que a Azitromicina é descrita no fluxograma como “antiviral”
- Antibiótico profilático não tem evidência de benefício em covid, do mesmo modo que em influenza ou outros vírus respiratórios. O DPOC/pneumopata usa por imunomodulação, em dose diferente, ja que exacerbação tem background muito mais inflamatório que infeccioso
- O2 domiciliar é conduta apenas em cenário de colapso ou de assistência em estrutura de home-care. Não parece ser prudente em recomendação sistemática, mesmo com telemedicina, pelo delay em caso de evolução abrupta para necessidade de ventilação mecânica,como vemos no COVID.
- Fazer prednisona por 5 dias, com “taper” (desmame) - Mesmo em 1m/kg...sem necessidade de desmame...
- Anticoagulação ambulatorial - sem recomendação. Até, uma das referências (do CHEST) é veemente contra o uso de AAS e DAOC, oposto ao fluxo do artigo, e só indica hospitalar.
Algumas coisas me chamaram atenção:
- o RECOVERY , é citado para uso de corticoide, mas completamente ignorado ao falar de cloroquina (pelos resultados negativos? Só vale citar o que convem? Temporalidade? - apesar do tempo para atualizar já que saiu em uma edição 6 meses depois)
- as referências até junho do ano passado - “out of date” data, com evidências robustas que refutam os dados depois - mas de novo, não seria mais elegante, inclusive por parte dos revisores/editor, pedir uma revisão dos dados frente as novas publicações?
- A auto-citação - e nela, um artigo de opinião fantasiado de “revisão de um único autor” vira evidência. Vide como Risch cita Risch...e sem qualquer menção “cortês” de “nosso grupo”...
(Não é primeiro autor, mas o ultimo nome habitualmente é do mentor acadêmico do trabalho)
“The combination of HCQ and azithromycin has been used .... as a standard of care in more than 300,000 older adults....30” - o 30 é Risch HA. Early outpatient treatment of symptomatic, high-risk covid- 19 ... to the pandemic crisis [e-pub ahead of print]. Am J Epidemiol.
- Aparente jogo de citação. Uma chama atenção- CHEST Guideline é contrário a essas medidas. Mas colocado no final, com frase “geral”, acaba sendo instrumento que pode passar uma falsa impressão de validação ao leitor menos atento ou que não faça o cross-reference
E nas citações aparecem artigos da Travel Med Infect Dis, ja com retration, e um dos motivos do processo etico de Didier...
Por último...RCTs múltiplos sobre cloroquina. Não há benefício em seu uso.
Mas interessante ver que o estudo do Henry Ford (Zervos parte dele) mostrava tendência de melhor resposta com a droga isolada, e neste fluxo orienta associação...
...me parece algo contradição...
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Uma análise do protocolo do Ministério da Saúde sobre o uso precoce da HCQ/Cloroquina no #Covid_19 . Ele é uma afronta ao pensamento científica e a medicina séria, que se importa com as vidas em jogo
O próprio já começa dizendo que tem respaldo científico
Em seguida, informações contraditórias: afinal, se a HCQ impede funcionamento adequado da heparina, e sendo a covid uma situação trombogenica, vou deixar de privilegiar a anticoagulação, que é repetidamente citada no texto?