Thread by @rodrigocapelo

Debatemos no #RedaçãoSporTV, na manhã de hoje, a controvérsia que envolve futebol feminino, Enem, Bolsonaro e Marta. @gabi_moreira na apresentação, comentários de @aydanoandre e @pedromoreno_. Dei minha opinião, divergimos, e acho válido reiterá-la por aqui para evitar ruídos. 👇🏻

Depois de uma questão acompanhada de reportagem sobre discrepâncias salariais entre Neymar e Marta, a resposta considerada correta no Enem era: "o futebol é uma modalidade que se caracteriza por uma identidade masculina no Brasil, conferindo maior remuneração aos jogadores."

A falha, pra mim, é que pergunta e resposta levam a crer que as diferenças salariais no futebol são resultado de uma questão identitária. Que seria possível resolvê-la com vontade. Quando, na realidade, o que separa com um abismo as remunerações de Marta e Neymar é outra coisa.

Por que Neymar ganha tanto dinheiro? Porque o Paris Saint-Germain, além de ter a fortuna de um Estado riquíssimo por trás, como o Qatar, arrecada para lá dos € 650 milhões com direitos de transmissão, patrocínios e matchday (bilheterias, bares, estacionamento, enfim, estádio).

Por que não há clube de futebol no mundo que consiga remunerar as mulheres da mesma forma? Porque todas essas fontes de arrecadação são baixíssimas ou nulas. Se a televisão não compra os direitos, se o patrocinador não põe grana, se o torcedor não compra ingresso, não há receita.

Quando colocamos a estrutura financeira em perspectiva, fica mais fácil inclusive de entender a dívida histórica que nós temos com o futebol feminino. O dinheiro não chegou até a modalidade porque, ridiculamente, a mulher foi proibida de praticar futebol profissional até 1979.

A Marta não está para o futebol feminino como o Neymar está para o masculino. Ela tem muito mais semelhança com Leônidas da Silva em relação ao estágio de desenvolvimento do mercado. Há um século de diferença entre processos de amadurecimento. Eu não gosto que seja assim, mas é.

Precisamos entender o que pode ser feito para acelerar o crescimento do mercado do futebol feminino. Calendário? Hoje temos. Obrigação para que clubes tenham equipes? Também ajuda. Falta uma política pública para investimento na base? Com certeza. Fora transformações culturais.

Qual é o problema da reivindicação por salários iguais? Ela é impossível de ser cumprida no curto e no longo prazos. Por esse motivo, torna-se contraprodutiva. A gente se engalfinha numa discussão que não levará a nada, pois futebol feminino e masculino são mercados diferentes.

Bolsonaro se manifestou sobre o Enem. Ele disse: "Não tem que ter comparação, o futebol feminino ainda não é uma realidade no Brasil. O que o Neymar ganha por ano, todos os times de futebol juntos no Brasil não faturam por ano. Como que vai pagar para a Marta o mesmo salário?"

E ele está certo. Lamentavelmente, pois seria melhor para todos nós – torcedores, praticantes, jornalistas, empresas, emissoras etc – se o futebol feminino fosse maior. Eu não estou discutindo a intenção subliminar do presidente, qualquer que seja. Eu concordo com a afirmação.

Não vou mudar de opinião ou fazer contorcionismo intelectual para criticar alguém por ser quem é. Estou indo na bola. No que Bolsonaro falou. Condeno quase tudo do que o governo dele faz, do que ele diz. Com esta afirmação, concordo. Isenção é se posicionar também em casos assim.