A decisão do Fachin foi, ao mesmo tempo, o melhor e o pior dos mundos para o Bolsonaro. No melhor dos mundos lhe deu uma narrativa para suportar os próximos meses, no pior, lhe deu o pior cenário possível para 2022.
Melhor dos mundos: tem semanas, meses até, que a máquina de desinformação bolsonarista vem tentando, sem muito sucesso, emplacar uma narrativa capaz de virar o jogo político. A viagem para Israel foi uma tentativa desesperada de criar algo.
O desespero da máquina era tão grande que chegavam a testar narrativas conflitantes no mesmo dia. As pessoas percebem - e comentam isso nos grupos. No geral, existe um período de tempo entre elas, alguns dias. Isso demonstra desespero.
Ontem, com a "volta" do Lula, os grupos passaram a atuar de forma coesa novamente. Todos os problemas do Brasil foram colocados na conta do evento: da corrupção ao dólar. Até da pandemia falaram, afinal, lembrem-se, nesse mundo, foi o STF o responsável por tudo.
E aqui temos três cenários possíveis para 2022: no primeiro a propaganda do Bolsonaro tem efeito e ele se torna capaz de capitalizar o antipetismo (antiesquerdismo) novamente. Por isso a ocupação das redes - como tenho falado tanto - se torna ainda mais urgente.
Esse cenário é muito possível, pois a estratégia não vai ser levar os votos para Bolsonaro, mas aumentar o não-voto. De fato, essa era a única estratégia possível para Bolsonaro em 2022, com ou sem Lula, dado o seu índice de rejeição que está na casa do "impeditivo".
Sem Lula, e disputando com outros sujeitos à direita, a estratégia tinha uma chance menor de eficácia. Seria algo semelhante ao que ocorreu no Rio de Janeiro nas eleições de 2020, com Crivella.
Com Lula a coisa muda de figura e eles vão investir pesado na estratégia a partir de agora. A ideia não é convencer as pessoas a votarem no Bolsonaro (sua base de apoio lhe garante fácil no segundo turno), a estratégia será convencer as pessoas a não votar.
Mais uma vez, reitero, acho que esse deve ser o público alvo das estratégias de comunicação à esquerda. E para isso serão necessárias diversas mudanças na comunicação. Mas isso é ponto para outro fio.
O segundo cenário aposta no aparelhamento do judiciário e na possibilidade de que Lula seja impedido de concorrer na véspera da eleição, como em 2018. E há uma enfase no aspecto temporal da coisa, pois a estratégia só funcionará se for realizada "na véspera".
Um dos maiores erros de 2018 - e sim, é necessário ter isso em mente para não se repetir -, foi insistir no nome do Lula até os 45 do segundo tempo, mesmo estando claro desde o começo do jogo que não o deixariam concorrer.
O nome de Haddad (Andrade) não foi trabalhado de forma adequada, isso é um processo que demanda tempo, não pode ser realizado em poucos meses. Essa não preparação do candidato, da sua imagem, acabou resultando em não-votos e, pior, na transferência de votos para Bolsonaro.
Mais uma vez, cenário em que se faz necessário investir em comunicação, criar um plano de segurança, nome ou nomes capazes de assumir a disputa no caso de um golpe do judiciário.
No terceiro cenário, Lula chega na eleição do mesmo jeito que estamos agora, com seu nome ganhando tração, reconquistando o eleitorado que na última eleição votou nulo (ou não votou) ou votou no Bolsonaro. E repito, esse número é expressivo e pode sim ser conquistado novamente.
Já disse isso em várias situações: não podemos confundir os votos que o Bolsonaro recebeu nas últimas eleições com os bolsonaristas, com o tio reaça fascista etc...
Ninguém se elege com um único tipo de voto no Brasil, é preciso entender o que levou essa ou aquela população a votar no sujeito. Eu já falei aqui, por exemplo, do caso de uma cidade do interior do Pará que votou em peso nele na esperança de ter um trecho de BR asfaltado.
Entender esses múltiplos cenários e - palavra chave - se comunicar com eles será a chave de 2022.

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More from @AnarcoFino

8 Mar
Essa história do Bolsonaro se filiar ao Partido da Mulher Brasileira sendo aventada, justamente, no 8 de Março tem toda cara do mundo de ser uma estratégia de comunicação pensada.
Real ou não a filiação já nasce como trending por conta do efeito de ultraje. Revoltados, estamos divulgando a notícia, o deboche. Os partidários do sujeito estão rindo nos comentários. Bullying como política tem eficácia comprovada.
Povo adora utilizar a palavra "cortina de fumaça", né? Exceto quando se trata de uma. A filiação, real ou factoide, por se tornar uma trending desvia atenção do fracasso político que foi a criação do Aliança Pelo Brasil.
Read 8 tweets
8 Mar
Deixando o título (cretino) o conteúdo (mais cretino ainda) da matéria da @folha de lado, o fato é de que o Brasil de @jairbolsonaro voltou ao patamar da chamada "década perdida", os anos 80.
Para quem não sabe, esse foi o legado da gestão dos militares no Brasil. Além das múltiplas e graves violações dos direitos humanos: deixaram um país totalmente destruído, tanto na economia quanto no aspecto social.
No campo econômico, o legado dos militares foi uma dívida externa praticamente impagável: tudo no país era feito com empréstimos em dólar, ao passo que a moeda nacional desvalorizava de forma galopante.
Read 11 tweets
7 Mar
Já perceberam que sempre tem mais gente divulgando as manifestações dos bolsonaristas malucos do que manifestantes nos vídeos? E não estou falando dos bots, tô falando de gente do nosso lado do muro na base do "veja só mais esse absurdo".
Não é a toa que as manifestações de 2015-2016 tenham atraído tantos aspirantes de famosos. Lembram da "miss impeachment"? Ir para manifestação de direita é o palco perfeito, todo os lados repercutem.
Já pararam para pensar que se não divulgarmos os seis malucos que estão na rua chamando quem usa máscara de comunista serão apenas seis malucos na rua e não um trending na internet.
Read 4 tweets
6 Mar
Desde, pelo menos, 2014 o sistema político brasileiro vem operando uma espécie de ligação direta entre a esfera federal e a local. Agora, com Lira, esse sistema vai ser oficializado.

E isso não é bom.

outline.com/6pjtF5
Não é de se estranhar que, pelo menos desde 2012, as municipais estejam servindo como bom termômetro das eleições federais, pega 2016 e 2018, por exemplo. Acabou a história de que são eleições diferentes ou de que o contexto federal determina o municipal.
"'O Brasil, pós-2010 (diria), vive uma espécie de "glocal" intensivo, onde a política da nação acaba sendo determinada por redes muito específicas - donde a importância do voto dos evangélicos.
Read 7 tweets
6 Mar
Eu digo, insisto e repito. Disparar absurdos diários, que vão desde declarações estapafúrdias aos erros de grafia, é método, é uma forma de ocupar os noticiários, mas também as redes sociais.

outline.com/tt9Rum
Fala-se muito do papel da mídia nisso, com o jornalismo declaratório, as notas de repúdio, mas se ignora a nossa própria responsabilidade no processo. Se você pega a timeline da várias pessoas da esquerda, vai ver que boa parte delas basicamente só repercute esse material.
E nem vou aqui repetir tudo que já disse - ou outros já disseram - sobre o funcionamento dos algoritmos. Pois já cansei de ser xingado - de coach de esquerda a "Zé algoritmo".
Read 7 tweets
6 Mar
Totalmente contraproducente exigir que os autores deste ou daquele vídeo venham a público.

Olhem o conteúdo e vejam se concordam? Tem logo de algum partido? De algum grupo? Não? Então a propaganda é de quem compartilhar.
Não faz qualquer sentido se pensar em uma tática de reação que seja supraindividual (ou seja, que escape dessa lógica do protagonismo nas redes) se a primeira reação das pessoas é literalmente exigir que seus autores venham a público.
Toda essa especulação se é ou não feita por um grupo de direita, ou por grupos que - a depender do enunciador - não são suficientemente à esquerda, também me parece contraprodutiva.
Read 6 tweets

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