🇨🇱Alguns apontamentos sobre estas megaeleições no Chile:
O oficialismo e a direita tradicional, organizada na coalizão Chile Vamos, são os maiores derrotados. Além de não alcançarem o poder de veto (33%) na Convenção Constitucional, foram derrotados em comunas emblemáticas. +
Na comuna de Santiago, foram derrotados pela comunista @IraciHassler. No governo da região metropolitana, não chegaram nem ao 2º turno, que será disputado entre duas candidaturas da oposição. O voto de castigo ao presidente Piñera, que tem só 9% de aprovação, também se impôs. +
Ao mesmo tempo, a centro-esquerda tradicional (da ex-Concertación) tampouco foi bem. Se os socialistas tiveram um desempenho razoável, os democrata-cristãos foram bem mal. O que as eleições de 2017 já indicavam se confirmou: o mundo da "transição à democracia" chegou ao fim. +
Então vamos aos números. Pouco mais de 40% de comparecimento eleitoral. Quem são os vencedores? A Frente Ampla (nova esquerda), que passou por muitas crises nos últimos anos e parece ter revivido, vencendo em comunas importantes, como Maipú e Nuñoa; +
O Partido Comunista, que como já disse venceu a comuna de Santiago e sua aposta presidencial @danieljadue foi reeleito prefeito de Recoleta com folga; e os independentes, GRANDES vencedores destas eleições. Um indicativo que o eleitorado não se desconectou de Outubro de 2019. +
A "Lista del Pueblo" não tinha líderes conhecidos com exceção da "Tia Pikachu", em alusão a fantasia que usava nos protestos de 2019, e se organizou para levar candidaturas independentes em todo o país. Sem recursos, eles se impuseram frente um poderoso establishment político. +
E tem uma identificação com a esquerda/centro-esquerda em boa parte das temáticas da Constituição, apesar de se dizer apartidária. Haverá uma maior incerteza na Constituinte e eu não considero ruim, pois este é um pré-requisito à democracia até então quase inexistente no Chile. +
A nova Constituição do Chile será redatada por rostos até então excluídos dos processos políticos no país. Terá paridade de gênero e povos originários. Será mais democrática, inclusiva, e legítima. Mais conectada com as demandas das ruas. Confesso que achei surpreendente. +
Há muito a ser analisado ainda, pois são quatro eleições em uma, e ainda há segundo turno dos governadores. Mas vale destacar que elas são também um termômetro para as eleições presidenciais que ocorrerão em novembro. O voto anti-establishment é algo a ser levado em conta. +
E no mais, agradecer aos estudantes que estiveram nas ruas em 2006 para retornar e nunca mais sair em 2011. Eles modificaram definitivamente a dinâmica social e política do Chile e contribuíram para que as bases deste neoliberalismo autoritário fossem reinterpretadas. Gracias!
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"Há aqueles que vilipendiam esse esforço de memória. Dizem que não há que remover o passado, que não há que ter olhos na nuca, que é preciso olhar para a frente e não encarniçar-se em reabrir velhas feridas. Estão perfeitamente equivocados. As feridas ainda não estão fechadas. +
Latejam no subsolo da sociedade como um câncer sem sossego. Seu único tratamento é a verdade. E em seguida, a justiça. Só assim o verdadeiro esquecimento é possível. A memória é memória se é presente, e assim como Dom Quixote limpava suas armas, +
é preciso limpar o passado para entrar em seu passado. E eu suspeito que não são poucos, dos que defendem a destituição do passado em geral, que querem, na realidade, a destituição de seu passado em particular". Juan Gelman
Pouco se fala disso no Brasil, mas o Dia Latino-Americano de Luta Contra a Violência à Mulher é uma homenagem às Irmãs Mirabal, brutalmente assassinadas em 25 de novembro de 1960 pela ditadura de Rafael Trujillo, na República Dominicana. +
Patria, Minerva e Antonia, ou "As Borboletas", como são conhecidas, são símbolos de luta não apenas por liberdade, mas por justiça social. Às resistências às ditaduras sempre foram, ao fim e ao cabo, uma luta pela igualdade. Em tempos de arroubos autoritários recordemos delas. +
E tantas outras mulheres latino-americanas. Afinal, a violência de genero é fundamentalmente política. Um pouco mais dessa história pode ser lida no belíssimo romance de Julia Alvarez, No Tempo das Borboletas. Trujillo caiu 31 anos depois. Que Bolsonaro caia em pouco mais de 2.
Nunca me esqueço de uma chilena que conheci em um ato que fizemos na embaixada do Brasil no dia em que @LulaOficial foi preso. Ao perguntar porque ela estava ali, ela me disse que trabalhava há muitos anos na FAO - a organização da ONU para a alimentação e a agricultura. +
E que por isso havia acompanhado de perto as suas políticas - não só de combate à fome, mas especialmente de segurança alimentar. E que estas políticas haviam transformado a forma como se combatia a fome e a pobreza não apenas no Brasil, mas em todo o Sul Global. +
Disse ainda sobre como Lula (em conjunto com outros atores) nos fez perceber aqui na América Latina que poderíamos construir uma agenda própria e alternativa às propostas pelos EUA e pela Europa (e suas agências) no combate à fome. +
Acabo de me recordar de um relato sobre a @dilmabr de um dirigente político da Frente Ampla que entrevistei no Uruguai, em uma conversa que ele teve durante uma visita dela à Montevidéu, em novembro de 2016: +
Conversando de uma forma íntima sobre as dificuldades enfrentadas na atividade da política, Dilma diz à ele:
"-O problema da política é que ela não afeta só a sua razão. O problema é principalmente que ela afeta o seu coração. +
E você tem que encontrar a medicina que possa, se não curar, tratar o seu coração, fazer o seu coração suportar. A medicina que serviu para mim, eu não posso recomendar à você. +
A vitória de ontem é contundente. 80% dos eleitores decidiram que uma nova constituição será redatada em um processo constituinte com paridade entre homens e mulheres. Mas o que isto significa e o que vem pela frente? +
Significa substituir uma constituição que tem um problema de legitimidade de origem. De uma democracia "semissoberana" ou "protegida". De um neoliberalismo que seria, no máximo, "corrigido" ou "com rosto humano". É devolver o poder constituinte ao povo. Isto não é pouca coisa. +
Os derrotados são Piñera - a coalizão Chile Vamos - e os apoiadores do Rechaço. Além das 3 comunas mais ricas de Santiago e onde vive toda a cúpula política, militar e empresarial do país, eles triunfaram na Antártica e em Colchane, onde há forte presença das Forças Armadas. +
O conflito interno do Partido dos Trabalhadores importa para a adoção do Orçamento Participativo? Sim. Essa é a resposta do nosso artigo (com os queridos Fabiano Santos e @_Tiagoventura) publicado na @DadosRevista, em que utilizamos dados inéditos das eleições diretas do PT. +
Desde 1983 o PT tem uma facção dominante que o conduz nacionalmente: o Campo Majoritário. A criação desta ala mais moderada buscou conter as facções de esquerda e flexibilizar as estratégias eleitorais do partido, em especial no que diz respeito à democracia e à participação. +
Para a nossa análise, isto implica em uma divergência fundamental com relação às políticas ofertadas ao eleitorado. Tem destaque os conflitos relacionais aos ideais de participação do "modo petista de governar" efetivados por meio da adoção do Orçamento Participativo. +