🛑 A presente thread abordará temas como abuso de substância químicas (álcool, drogas), deterioração da saúde mental, suicídio e temas relacionados. Considere isso um alerta de gatilo! 🛑
Este assunto é muito sensível e complexo de se lidar. Envolve diversos fatores e, por isso, precisará - como de costume - ser separado em tópicos para lidarmos com eles mais profundamente.
Assim, o presente fio será dividido da seguinte forma: 1- o que é bifobia internalizada (como ela se caracteriza e age)? 2- ações da bifobia internalizada e como percebê-la.
2.1- rótulos como band-aid para bifobia internalizada. +
3- os danos que a bifobia internalizada causa em sujeitos bissexuais-identificados. 4- como combater a bifobia internalizada?
Vamos lá!
1- o que é bifobia internalizada?
Bifobia internalizada é um conceito analítico mais ou menos recente, eu diria, com o qual a comunidade bissexual vem trabalhando acerca do tema. +
É o processo de internalização do preconceito com o ser-bissexual, com a identidade e com a atração bissexual, impedindo que o indivíduo venha se reivindicar como tal.
Assim, 'bifobia internalizada' seria literalmente a fobia da bissexualidade internalizada no sujeito. Para tentar ilustrar, recorrerei a artigos sobre o tema nos próximos tweets.
Coisas como "não sou bi o suficiente" (normalmente vem por conta da preferência por pessoas de um determinado gênero), "é apenas hetcomp", "é só uma fase" etc., Pode sim ser indícios dos efeitos da internalização desses preconceitos e discriminação.
Pessoas que sofrem de bifobia internalizada recorrem a todos os recursos possíveis que tiverem para não se aceitarem enquanto bissexuais.
2- ações da bifobia internalizada e como percebê-la.
No artigo “Bissexualidade, bifobia e monossexismo: problematizando enquadramentos”, nos é apresentado o conceito de "enquadramento", que seria, em resumo grosseiro, +
o modo como a política de dominação sentimental e moral opera nos sujeitos para definir quais sentimentos devemos sentir diante de situações.
Sendo assim, como também nos é apresentado no artigo, a experiência bissexual é tida e analisada socialmente a partir de "lentes monossexuais"; lentes essas que deslegitimam e menosprezam a experiência bissexual. E como isso opera na esfera subjetiva, individual e interna?
A partir dessa deslegitimação que acontece numa esfera mais ampla e socialmente constituída - presente até mesmo em boa parte da própria comundiade LGBTQIA -, indivíduos bissexuais não são vistos como sendo completamente pertencentes a comunidade. Isso acarreta desamparo e +
escassez de políticas voltadas à comunidade bissexual.
Isso tem um forte impacto interno/subjetivo numa pessoa bissexual. Quando não se tem legitimação da sua identidade numa esfera social ampla, como você vai se identificar e se reivindicar (orgulhosamente) ela? +
Definitivamente, dizer "eu sou bissexual!" É a última coisa que fazem diante dessa situação.
Sendo assim, a negação e deslegitimação da bissexualidade se transfere para o plano interno, trazendo a tona a negação da identidade, vergonha e desprezo pela mesma. Coisas como pensar que a bissexualidade é um mero detalhe na comunidade, ou que é uma espécie de degrau para +
levar à homossexualidade, são sinais disso.
Você se nega ser bissexual. Você luta contra seu desejo, contra o que você é. Você pensa que é apenas uma fase, uma confusão, um degrau para algo "mais bem definido" (leia-se homossexualidade/heterossexualidade). +
As políticas de deslegitimação da bissexualidade têm tanto efeito que você acaba por ser cooptade por elas e vira ume agente ative interne, contra você mesme.
Esse é o processo de internalização do preconceito e descriminação com a identidade bissexual, e isso nos leva diretamente ao próximo tópico.
2.1- rótulos como band-aid para bifobia internalizada.
Aqui, recorro diretamente à um dos artigos que mais me ajudou a pensar bifobia internalizada (e tem me ajudado a combatê-la).
Em “reivindicando bissexual”, Kravitz M. - Esse que eu definiria como sendo um ativista bissexual, mas o mesmo não se diz assim - nos explica o seguinte:
Como está na imagem, a bissexualidade, por causa desse enquadramento social do qual ela é vítima, acaba sendo tida como "não-suficiente" para explicar a subjetividade do indivíduo monodissidente (bissexual), +
fazendo de tudo, até mesmo adotando uma "política anti-rótulos", só para evitar se dizer bissexual.
Isso não se esgota no não uso de rótulos para evitar "bissexual". +
A coisa também segue uma tendência contrária, como fica evidente a partir de um artigo publicado no Journal of Sex Research, que observou que “alguns indivíduos multissexuais podem adotar os rótulos queer e pansexual para evitar o estigma associado a ... identidade bissexual”.
Assim como um pansexual disse ao Psychology Today que "pansexual" era "mais fácil de dizer do que bissexual". Isso tudo é um grande reflexo desse enquadramento que, além de deslegitimar vidas bissexuais, corroboram para o desprezo total e a não-reivindicação da bissexualidade.
Num estudo sobre como indivíduos bis correm maior riscos de instabilidade mental que lésbicas/gays, é falado:
As desculpas vão até de pressupostos extremamente bifóbicos, como o famoso achismo de que a bissexualidade é um degrau para sexualidades monocentradas, até o discurso de que "bissexual não é suficiente/não contempla completamente a minha experiência", mesmo quando +
"a sua experiência" se encaixa perfeitamente no conceito de bissexualidade.
Rótulos como "queer", "omnissexual" e "pansexual" são usados como band-aids para bifobia internalizada. +
Longe de pregar uma política restritiva, mas devemos reconhecer os casos e situações onde usam qualquer outro rótulo que não seja o "antiquado bissexual". Isso [essa utilização] é estancamento de bifobia internalizada.
3- os danos que a bifobia internalizada causa em sujeitos bissexuais-identificados.
A bifobia internalizada também causa diversos problemas físico-psicológicos em bissexuais que estão passando por isso.
Não deveria ser um espanto sabermos que a comunidade bissexual é uma das comunidades LGBTQIA que lideram hanks de suicídio. Além disso, bissexuais-identificados têm altíssimo risco de se perderem em bebidas alcoólicas e drogas.
Pesquisas como a da American Psychiatry Association revela que transtornos de humor e ansiedade são maiores em mulheres bissexuais-identificadas em comparação com mulheres lésbicas e heterossexuais:
A mesma pesquisa faz uma mesma apontação, mas comparando homens bissexuais à homens hétero e gays. O resultado de tal pesquisa foi: descobriu-se que em comparação a saúde mental de homens hétero, 36,9% dos homens bis relatam transtornos de humor, e 38,7 para transtornos de +
ansiedade. A única coisa de diferente aqui é que tais estatística de homens bis são quase similares às estatísticas de transtornos de humor/ansiedade em homens gays.
O estudo também revela que pessoas bissexual-identificadas são mais propensas a apresentarem disparidades nos usos de substância químicas (drogas ilícitas) e alcoólicas:
“A prevalência de padrões problemáticos de consumo de álcool é
31,2% e 30,5% do uso de substâncias ilícitas +
entre indivíduos bissexuais. Em um estudo de 2016, mulheres bissexuais-identificadas foram
encontradas mais vulneráveis ao consumo excessivo de álcool, ... uso de maconha e outras drogas
em comparação com lésbicas e mulheres heterossexuais.”
“O mesmo estudo relatou que as taxas de dependência alcoólica e outro uso/dependência de drogas
foram maiores entre os homens bissexuais-identificados
em comparação com homens heterossexuais. Apesar das taxas forem semelhantes para homens bissexuais-identificados
em comparação +
com os homossexuais, as taxas foram mais elevadas
para homens bissexuais comportamentais em comparação com homens gays comportamentais.”
Em outros artigos encontramos isso:
Além desse, que fala da internalização disso que é chamado de "binegativity (negatividade bi)":
Além de tudo isso, o suicídio é um fato que assola e muito a comunidade bissexual. Este estudo revela que o risco de suicídio é 45,4% maior em mulheres bissexuais em comparação às mulheres lésbicas (29,5%) e heterossexuais (9,6%), e que homens bissexuais são 34,8% mais +
propensos ao suicídio, em comparação à homens gays (25,2%) e heterossexuais (7,4%).
Ou seja, além do abuso de substância químicas como álcool, drogas ilícitas etc., Existe o imenso percentual de risco de suicídio em pessoas bissexual-identificadas. +
A bifobia internalizada tem um grande papel nisso. A vergonha, a culpa, o medo, a relutância quanto a ser bissexual atuam fortemente para que esses fatores se apresentem desta maneira.
Tudo isso somado às políticas de negligência e invisibilidade social que são postas encima de bissexuais. Políticas públicas de amparo a nossa comunidade não são encontradas no Brasil. O Estado brasileiro "parece" não se preocupar com nossas vidas - não muito diferente do mundo.
4- como combater a bifobia internalizada?
“É natural começar a acreditar nas coisas prejudiciais ensinadas a você quando elas são empurradas na sua cara várias vezes. É comum se sentir duvidoso sobre certos rótulos de identidade. +
Mas a solução não é desistir e migrar para novos, mas enfrentar seu mal-estar de frente.” Kravitz fala.
Como dito por ele, a recusa do termo "bissexual" é algo de se esperar, visto a tensão e o mal-estar de se dizer bi quando o mundo todo diz coidas horrendas sobre ser bi e +
bissexualidade.
Mas a repulsa por "bissexual" é mais uma dissociação de encarar o problema do que ir na raiz do problema? Ao você evitar se dizer bi (por conta da bifobia internalizada), você está fugindo de todo esse problema, ao invés de o resolvendo.
E é natural que você evite tal estresse, mas se você deixar todo esse mal-sentimento dentro de você sem tratá-lo e examiná-lo, uma hora ele reaparece, e pode ser (não raramente) em forma de transtornos mentais, problemas com substâncias químicas etc.
A bifobia internalizada tem nos roubado a bissexualidade. Ela é algo que rouba nossas identificações, nosso orgulho, nosso ser. Mas é melhor deixar-se ser domade por completo ou é melhor armar-se dos mais diversos artefatos para que possa te auxiliar nessa jornada?
"Bissexual" não é uma das melhores palavras para muitos, mas acredite: essa palavra é revolucionária. A bissexualidade é incrível porque desmascara a dicotomia hétero/homo; porque desmascara a dicotomia homem/mulher; porque expõe o hetero&monossexismo; porque amamos sem se +
importar com um detalhe ínfimo de nosses parceires: o gênero delus.
A sua experiência pode ser dolorosa, mas acho que vale a pena você se permitir reivindicar "bissexual", não enquanto algo que te limita, mas sim enquanto uma espécie de casa. Transfome "bissexual" em seu lar.
Como Naomi Tucker fala em Bisexual Politics, “(...) Uma maneira de atingir esse objetivo é praticar dizer a palavra "bissexual". Diga de novo, 'bissexual'. Pinte nas paredes; use-o em uma camiseta. Escreva com pasta de dente no espelho do banheiro; observe-a enquanto olha para +
o seu belo eu. Bissexual. Fale mais alto; diga isso em público; diga a alguém que não se sinta confortável em ouvi-la.”
Longe de obrigar alguém a usar bissexual imediatamente, espero que a thread possa ter ajudado a identificar como e o que é bifobia internalizada e os males +
que ela causa. Se você se identificou com alguma coisa aqui listada, eu espero de verdade que tenha conseguido ao menos reunir maior coragem para enfrentar esse desafio.
Outra coisa que pode te ajudar, além de começar a refletir e retirar a carga negativa imposta ao rótulo bi(ssexual), é você se cercar de outres bissexuais. Conviver com outras pessoas bissexuais pode ser como uma coisa terapêutica. Você pode conversar, trocar experiências, +
aprender e, até mesmo, ensinar.
Podendo ser on-line ou fora da internet, cercar-se de outres bissexuais é uma boa ideia para você desbravar a sua própria bissexualidade. +
Participe de eventos on-lines que falam sobre bissexualidade, como o #cbcall. Assim, você se descorbre bi, aprende sobre bi e conhece outres bis. Isso é uma imensa ajuda.
Bissexual não é uma palavra suja; você não precisa ter medo de ser bissexual; você não é ponte de IST; você não é infiel por ser bi; você não é um fetiche. Você é bissexual. A sua vivência desafia as estruturas sexuais e românticas. +
Se orgulhar de ter a potencialidade revolucionária no âmbito das atrações sexuais e românticas é algo prazeroso e um caminho sem volta.
Se permita desfrutar do precioso desafio de se identificar enquanto bissexual. “Vale a pena”, Emma Seely diz.
Se você tem tido pensamentos de desejo pelo fim de sua existência, por favor, entre em contato com o CVV (188). Converse com pessoas próximas de você, entre em contato com o Acervo.
Sua vida importa. Não deixe a bifobia internalizada te roubar até mesmo a vida. Nós importamos!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
todos os artigos utilizados para fazer a thread estarão aqui, neste documento: drive.google.com/file/d/1KptHyL…
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Esse assunto sempre é muito levantado dentro da comunidade e o que mais vemos, infelizmente, é oposição à comunidade bissexual porque de alguma forma muitos nos veem como menos bem-vindos que eles. +
Ver esse tipo de comentário realmente nos coloca a pensar e duvidar da nosso papel dentro de tudo isso, já que nenhum dos lados (dentro e fora da comunidade) somos vistos como suficiente, carregamos uma falsa culpa que tentam colocar nas nossas costas.
Uma coisa que é importante lembrar que a nossa sigla LGBTA+ é uma sigla só por um motivo, quem está incluído nela já foi e ainda é atacado por assumir uma identidade que vai contra o tradicionalismo, que é vista como uma ameaça.
Perguntas sobre bissexualidade para bissexuais respondem! — Thread para entreter e refletir.
⚠️ AVISO! Caso alguma pergunta lhe remeta a algum trauma/gatilho/situação desagradável, não se sinta na obrigação de responder, priorize seu bem-estar!
Deixando um pouco de lado os tweets mais superficiais sobre o dia da visibilidade bissexual, gostaríamos de chamar a atenção de vocês para o real significado dessa data. #BiVisibilityDay#VisibilidadeBi
De modo algum os posts superficiais perdem a sua importância, afinal esse é um dia para fazermos barulho e poder gritar para todo mundo ouvir “nós existimos!!” e é o que eles fazem. Mas o que queremos dizer é que, além de celebração, não podemos esquecer o motivo +
da existência dessa data: ganharmos visibilidade. Essa visibilidade que nos referimos não é a visibilidade que viemos recebendo ao longo dos anos; apesar de muita gente estar se educando sobre a nossa comunidade elas não são maioria, +
E então chegou o tão aguardado Dia da Visibilidade Bissexual! Sem o ativismo de figuras como Wendy Curry, Gigi Raven e Michael Page, tal dia não teria sido demarcado como o dia de especialmente gritarmos aos 7 ventos dizendo: Nós existimos!
Data que se inicia por nossos ativistas em fim dos anos 90 a fim de criar uma consolidada Visibilidade Bissexual nos espaços gays e lésbicos e até mesmo héteros.
Inicialmente com um aspectos mais ativistas e com presença bissexual extremamente forte, atualmente “ele agora +
+ presencia eventos como discussões, festas de jantar e danças em Toronto e um grande baile de máscaras em Queensland, Austrália.”
No Brasil, a primeira manifestação foi feita em 2021, na cidade de Porto Alegre que oficializou 23 de setembro +
Bom dia gente! estamos um pouco inativos por conta da correria do dia-a-dia, trabalho, aula, família, etc. Já que não produzi nenhum conteúdo pra agora gostaria de recomendar uns vídeos que assisti no decorrer desse mês. Pra quem tem interesse em cinema vale a pena assistir
A representação bissexual na mídia é quase nula (isso quando há). A retratação de pessoas bissexuais na mídia não costuma expôr a bissexualidade como identidade que abarca tais práticas. Embora hajam filmes/séries que representem a bissexualidade em algum grau, (+)
não existe uma explicita exposição da bissexualidade como algo consistente e existente. Malmente é dito a palavra "bissexual" nesses filmes. Loraine Hutchins, ativista bissexual e feminista, falou algo parecido num artigo chamado "Bisexuality in the Media:
A Digital Roundtable".
Representação é algo importante que pode fazer parte da construção/identificação de muita gente que está em fase de auto-descoberta, mas infelizmente esse processo é mais difícil para pessoas LGBTI+ (aqui falo especialmente para bissexuais).