Porque “O Menino do Pijama Listrado” não deveria ser trabalhado nas escolas.
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A obra conta a história de Bruno, filho de um oficial nazista do alto escalão do exército, que por causa do trabalho de seu pai é obrigado a se mudar para uma região isolada. Ele então encontra um local onde acredita ser uma fazenda, sendo, na verdade, um campo de concentração.
Embora não seja dito, se trata do campo de Auschwitz. Isso é indicado quando Bruno e sua irmã, Gretel, lêem errado o nome. No original, seria “Out-With”. Em português, “Haja Vista”. Ambas as escritas remetem à formas de se falar Auschwitz, mesmo incorretas, por serem crianças.
O personagem titular só aparece ao décimo sétimo capítulo, quase ao final do livro, e é mais uma ferramenta de roteiro do que um personagem propriamente dito. Shmuel é um personagem sem nenhuma profundidade, cuja única característica é ser uma criança em um campo de concentração.
⚠️ Se você se importa com spoilers, talvez queira pular os próximos tweets, mas a resolução da trama é bastante óbvia.
O pai de Shmuel desaparece, sendo evidente que ele foi morto em uma câmara de gás. Shmuel quer descobrir onde ele está, fazendo então um acordo com Bruno, que entraria escondido no campo de concentração, vestiria as roupas de prisioneiro e ajudaria Shmuel a encontrar seu pai.
Bruno faz conforme planejado, e o fim da história, os dois são mandados para uma câmara de gás e também mortos. É aí que o livro mostra o ponto de vista da família de Bruno, desesperados para encontrá-lo, até descobrirem indícios de que o garoto foi morto.
E se você percebeu que nesse tempo todo eu estive falando de Bruno e pouco de Shmuel, então entendeu um dos problemas.
É uma história sobre o holocausto pelos olhos de uma criança nazista. Talvez você diga que é uma criança alemã, não nazista, mas logo veremos essa questão.
A obra apresenta unicamente a perspectiva de Bruno, com exceção do epílogo, que é pelo ponto de vista de sua família. Shmuel nunca é o foco da história, ele só está lá como ferramenta de roteiro, e o personagem é criticado por ser unidimensional, escrito sem uma personalidade.
O livro é usado constantemente por professores no mundo todo para ensinar sobre o holocausto para crianças, até mesmo aqui no Brasil. O próprio memorial de Auschwitz já criticou o uso da obra como material educativo.
O autor, John Boyne, em tweets agora apagados, se disse incomodado com alguns títulos de obras sobre Auschwitz, junto com algumas incongruências históricas, ao que a própria conta do Memorial de Auschwitz apontou que o livro que ele escreveu não deveria ser lido para crianças.
Os tweets se encontram presentes aqui:
thejc.com/news/uk/auschw…
O memorial linkou um artigo, ao qual o autor respondeu que possui alguns erros e incongruências, e que por isso não leria até o final.
Um autor aleatório, sem base histórica, tentando explicar Auschwitz para o próprio memorial de Auschwitz.
holocaustlearning.org.uk/latest/the-pro…
John Boyne, um não-judeu, que decidiu escrever uma história sobre o holocausto, se recusando a ouvir judeus. As próximas colocações aqui foram feitas por Hannah May Randall, no artigo citado pelo memorial de Auschwitz. Desse ponto até o fim da thread, será uma tradução do artigo.
Primeiramente, ela cita que muitas das pessoas que leram o livro ou assistiram ao filme acreditam que é uma história real, relatos de algo que realmente aconteceu, tratando o livro como um documento histórico verídico, mesmo sendo ele uma obra de ficção.
A primeira incoerência apontada é que, mesmo sendo filho de um nazista de alto escalão, ele não tem noção de que uma guerra está acontecendo, de quem é Hitler (mesmo no livro tendo um capítulo em que sua família recebe Hitler e Eva Braun para um jantar) ou do que é o Nazismo.
Isso seria impossível já que, por lei, Bruno deveria ser um membro da Juventude Hitlerista. Teria de frequentar uma escola alemã na qual os estudantes regularmente fazem saudações nazistas e nas quais propagandas antissemitas estavam em cada mínima parte do currículo escolar.
Nesses espaços, crianças eram ensinadas que a guerra deveria ser motivo de orgulho, e que significava que a Alemanha voltaria a ser uma grande potência, acima de todos os outros países e povos.
Já Shmuel não estaria no campo de concentração. Ao menos, não onde estava. Crianças eram vistas como inaptas ao trabalho e eram mortas em câmaras de gás assim que chegavam, com a exceção de algumas poucas que eram escolhidas para experimentos humanos, longe dos campos principais.
E mesmo se Shmuel fosse escolhido para trabalho forçado, ele não teria tempo ou a oportunidade de ficar sentado ao lado da cerca de um campo de concentração.
E mesmo se Shmuel fosse escolhido para trabalho forçado, ele não teria tempo ou a oportunidade de ficar sentado ao lado da cerca de um campo de concentração.
Hannah também aponta alguns fatores extremamente importantes quanto ao final. O primeiro, já citado aqui, é que a história foca no sofrimento de Bruno e sua família, no general nazista descobrindo que seu filho foi assassinado no mesmo campo de extermínio que ele comandava.
Tudo é visto como uma tragédia, um acidente que poderia ser evitado caso os guardas tomassem mais cuidado ou as cercas fossem reforçadas. A história também permite uma leitura irônica, como “Você colhe o que planta”. O general nazista sentiu na pele o que fez com tantas famílias.
O livro faz com que o leitor se sinta mais comovido pela morte do filho inocente de um general nazista do que pelo assassinato de 6 milhões de judeus no holocausto. O próprio Shmuel, personagem titular, não é desenvolvido ao ponto de sua morte ter uma carga emotiva.
Shmuel representa as 1,5 milhões de crianças mortas pelo regime nazista, seja nos campos de extermínio ou por toda a Europa ocupada. Ainda assim, a simpatia do leitor é direcionada à família de um comandante nazista que se tornou responsável por um campo de concentração.
Hannah indica algumas obras que servem como substituto ao Menino do Pijama Listrado para ensinar sobre o holocausto a crianças, como “O Diário de Anne Frank”, “Survivos of Holocaust” de Ryan Jones, “Once” de Morris Gleitzman, “Hitler's Canary” de Sandi Toksvig, entre outros.
Gente, a thread ficou quebrada aqui. A gente postou dois tweets iguais sem querer, e esse não tem a continuação nem o fim, que estão aqui:

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