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Nesse final de semana eu e 4 amigos (Com @joaoasds e @vitordmeireles) participamos do #hackathon de física da @mcgillu no Canadá. Nosso projeto foi premiado com 1º lugar :)
Nesse fio eu vou explicar o projeto e mostrar os resultados mais legais devpost.com/software/gener…
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Primeiro só para explicar brevemente para quem não sabe o que é, um hackathon é uma competição de desafios entre equipes que dura 24h. As equipes entram com uma proposta de desafio que querem fazer nas 24h do evento
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e são julgadas baseadas no desafio que elas propuseram, em o quanto conseguem fazer dele e a forma como os resultados são apresentados (essa é a parte mais importante, eu acho).
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O primeiro foco do nosso projeto foi resolver numericamente o problema de órbitas de 3 corpos. Para dois corpos de massa razoável, como a Terra e a Lua, a órbita deles é simples e bem descrita pela gravitação de Newton que costumamos aprender no ensino médio.
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Agora, e se colocarmos um 3º corpo? Algo como uma 2ª lua? O problema fica muito mais complicado. A força gravitacional que um corpo sente depende agora de outros 2 que se influenciam mutuamente. O resultado é um sistema caótico e sem solução analítica.
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Sistema caótico quer dizer que ele tem uma sensibilidade MUITO alta às condições iniciais. Um exemplo é esse pêndulo em um pêndulo (pêndulo duplo), aonde um deles começa com um ângulo 0.57º maior e a dinâmica dos dois muda drasticamente depois de um tempo.
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Além disso, a estabilidade das órbitas para 3 corpos massivos é muito mais delicada, é bem mais fácil um planeta ser ejetado para fora da órbita.
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O nosso projeto não acabava ai. Sabemos que a teoria mais completa para a gravidade não é a física newtoniana, mas sim a relatividade geral.
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Em casos onde as massas são muito grandes (como buracos negros ou estrelas de nêutrons) ou que as órbitas são muito próximas, a gravidade de Newton falha.
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Um ótimo exemplo disso é a órbita de Mercúrio, aqui no sistema solar. Ele está próximo o suficiente do sol, para que os efeitos da relatividade geral se tornem relevantes. O resultado disso é que a órbita de mercúrio não fica estática. Ela vai girando com o passar do tempo
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As leis de Newton nunca previram que pudesse ocorrer.
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Além disso, em uma órbita com efeitos relativísticos, a energia do sistema não é conservada pois ocorre a emissão de ondas gravitacionais. Ondas gravitacionais são distorções no espaço-tempo que se propagam quando corpos massivos se movem.
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Então esse era o nosso desafio, resolver computacionalmente as equações de órbitas com correções introduzidas pela relatividade geral e ver como é a emissão de ondas gravitacionais nesse sistema. Em 24 horas (A ideia veio do Felipe e ele alucinou para pilhar a gente).
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As equações para as órbitas já foram encontradas pelo Einstein, o Leopold Infeld e o Banesh Hoffmann. Elas são bem assustadoras para ser honesto, mas a gente pode resolver elas em um computador.
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Para resolver a emissão por ondas gravitacionais, a gente considerou que as ondas que estamos detectando estão longe da fonte. Ou seja, estamos considerando que nós estamos aqui na Terra observando as ondas emitidas por um sistema bem longe.
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Isso simplifica as contas bastante, do contrário a gente não conseguiria fazer ela em um dia.
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Depois de várias horas de refrigerante, cerveja e música, nós conseguimos montar a solução computacional e gerar um painel interativo para o usuário poder visualizar as órbitas para vários conjuntos de condições iniciais diferentes.
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Claro que, por o sistema ser caótico e ter pouca estabilidade, a maioria das configurações apenas geram órbitas que parecem um rabisco na tela pois a instabilidade rapidamente faz um ou mais dos objetos serem atirados para longe.
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Então a gente focou em alguns casos especiais, onde a configuração inicial gera órbitas bonitas para que as pessoas visualizassem a diferença entre as órbitas previstas pela gravitação de Newton e a da relatividade geral.
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Um programa separado, também resolvia as equações para obter as trajetórias, mas ao invés de fazer uma animação, ele usava as trajetórias para estimar como as ondas gravitacionais são vistas por um observador longe.
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Seguem aqui dois casos bem bonitos com alguns comentários.
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O primeiro é a órbita do 8, ou infinito. Nessas condições os 3 objetos (estrelas, buracos negros ou algo do tipo) tem massas iguais e começam com posições específicas que faz com que, ao se atraírem gravitacionalmente, as órbitas formem um 8 deitado.
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Notem que, na gravitação newtoniana esse 8 é estável e estático. As órbitas ficam para sempre nessa figura. Já quando a relatividade geral se torna relevante, esse 8 começa a dançar para um lado e para o outro enquanto os objetos orbitam uns aos outros.
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Esse fenômeno é similar à precessão de mercúrio.
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Aqui embaixo, tem a emissão de ondas gravitacionais desse sistema. Quanto + intensa a cor, maior a amplitude da onda, ou seja, + distorção do espaço-tempo. A escala de tamanho é 100x maior que a escala das órbitas, já que estamos observado a emissão à longas distâncias.
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Essa outra configuração é minha favorita (e foi inclusive a solução que usei para fazer a logo da equipe), a gente chama de triqueta.
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Novamente, na física newtoniana as órbitas ficam estáticas enquanto que na relatividade geral, cada elipse da triqueta vai girando enquanto o objeto vai completando sua órbita.
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Aqui tem as ondas gravitacionais desse sistema, percebam que elas tem uma frequência de oscilação bem menor e uma amplitude menor também. Isso ocorre pois o sistema das 3 massas tem órbitas maiores e mais devagar.
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Pela amplitude e a frequência das ondas, podemos estimar a como é a órbita destes objetos. Se a frequência e a amplitude aumentam rapidamente, isso indica que a órbita está ficando cada vez + rápida e menor, como no caso da colisão de dois buracos negros observada pelo LIGO
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Com essas visualizações podemos ver os efeitos que a relatividade geral provocam nas órbitas de objetos massivos no espaço. Esses resultados foram os que nos deram o primeiro lugar no Hackathon!
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Foi extramente divertido passar o dia trabalhando nesse desafio com os amigos. Mas claro, por tudo ter sido feito em 24h, há alguns problemas que estamos investigando agora para continuar o projeto e elaborar um material de ensino.
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O primeiro problema é que, quando dois corpos chegam muito muito muito perto, a força de atração tende a crescer muito e uma colisão ocorre. Mas computacionalmente, o que ocorre é que os corpos são ambos ejetados violentamente pela força infinita.
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Estamos tentando solucionar isso no computador. Quando tudo estiver pronto, pretendemos fazer um artigo didático explorando os efeitos de relatividade geral no problema das órbitas de 3 corpos.
Nós demos uma entrevista rápida no jornal aqui do DF sobre o projeto, quem quiser ver pode ver no link aqui globoplay.globo.com/v/10031372/

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11 Nov
💉🇧🇷Atualização: Pirâmide de vacinação do Brasil até esse domingo (31/10). Dose única entra na contagem de vacinados 2ª dose. #VacinasSalvamVidas
Frame mais recente:
Aqui no Brasil, uns 14% da população tem 0 a 9 anos. Pelo nowcasting do @leosbastos fica claro como essa população está precisando se vacinar também. Espero que as aprovações cheguem nessa faixa etária logo
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27 Aug
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Vi algumas pessoas preocupadas com as vacinas porque em locais que já tem muitos vacinados, os vacinados tem uma maior fração nos óbitos e hospitalizações. Vou elaborar um fio aqui explicando porque isso é normal e ainda mostra que as vacinas funcionam 🧵
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Eu comentei sobre isso alguns meses atrás, mas vou pegar um exemplo aqui para deixar isso mais claro e tentar explicar melhor
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Vamos lá, imaginem um cenário lindo onde 100% da população está vacinada com uma vacina 99.99% eficaz em prevenir óbitos. É claro que, já que a vacina não é 100% eficaz, e todo mundo ta vacinado, todos os óbitos vistos serão em vacinados, apesar de serem MUITO menores
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26 Aug
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Qual a relação entre anticorpos e risco de #COVID19 sintomática ou assintomática? Essa pergunta está cada vez mais perto de ser respondida e hoje vou fazer mais um fio🧵 sobre um preprint que apenas hoje li e ajuda nessa resposta
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10 Aug
Ontem foi publicado mais um estudo envolvendo a vacina CoVLP da @medicagoinc. E como sou um dos participantes da fase 3 vou fazer um fio sobre ele. Aqui, avaliaram a resposta imune 6 meses após a vacinação e resposta contra variantes! Segue o 🧵 medrxiv.org/content/10.110…
Antes de tudo, eu já fiz um fio sobre os resultados da fase 1 e 2, então aqui está caso queiram ler antes
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31 Jul
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As vacinas serão capazes de segurar a #COVID19 sozinhas? Provavelmente não sozinhas. Tem circulado por ai que com o R0 alto da variante #Delta, é necessário até uns 90% da população vacinada para extinguir a COVID. Há problemas nessa estimativa, mas não é o fim. Segue o 🧵
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Essa estimativa vem de modelos epidemiológicos compartimentais, que dividem a população em compartimentos. Por exemplo, um modelo SIRD divide a população nos grupos susceptíveis (S), infectados (I), recuperados (R) e mortos (D).
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A dinâmica da epidemia é governada por taxas de transferência entre estes compartimentos.
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29 Jul
Faz um bom tempo que não faço essa atualização aqui. Estimativa mais realista do numero total de mortos por #COVID19 no #Brasil 🇧🇷 até a 30º semana de 2021: 648373 [634257 - 665328]. Image
Eu uso os dados do nowcasting, apresentado pelo @leosbastos para corrigir pelo atraso de notificação, e os boletins de SRAG de 2016 até 2019 para gerar o "background" que é subtraído da estimativa de nowcasting
Já expliquei a lógica por trás dessa estimativa aqui
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