A grande propaganda russofóbica que passa pela Ucrânia é teria havido um crime étnico de russos contra ucranianos nos anos 1930, o Holomodor. Ocorre que o comando soviético era plurinacional, inclusive ucraniano, e seus erros tiveram repercussão plurinacional (1/12).
O que houve, nos anos 1930 foi a grande fome soviética. Sem dúvida alguma, fruto de uma estatização errada da agricultura - ainda que, para problematizar a situação, ela fosse uma resposta política a uma campanha de sabotagem e desabastecimento dos proprietários rurais (2/12).
Sim, a URSS tinha proprietários rurais privados, os kulaks. Apostar na manutenção deles, e numa reforma agrária em marcos privados, foi o que fez Rosa Luxemburgo criticar expressamente Lenin - mas era uma opção desesperada de curto prazo (3/14).
O problema não foi econômico, mas político. Com o crescimento das cidades e a industrialização, os kulaks promoveram boicotes colocando o poder soviético sob risco. Enquanto isso, kulaks foram rapidamente absorvendo um ideário nacionalista de extrema-direita (4/14).
É essa crise no campo que abre dá dimensão de massas ao conflito soviético dos anos 1930, que poderia ter muito bem ficado circunscrito à disputa dentro do Partido e do Exército Vermelho (5/12).
Reforma Agrária, de novo, não é brincadeira. Nunca foi. E a justa distribuição das terras férteis, por si só, não resolvem o problema. Isso soa polêmico, e é doloroso, num país como o nosso, que não passou por reforma agrária nenhuma, mas é real (6/12).
Stalin, um georgiano, e a nova cúpula partidária saíram vitoriosos. Não sem sangue derramado. Resolveram um problema político até a página 2, embora não tenham criado um modelo agrário dos melhores e, ainda, tenham tolerado muitos nacionalistas, inclusive na Ucrânia (7/12).
Por sinal, a própria Rosa Luxemburgo havia advertido Lenin que, também, bem intencionadas políticas de promoção de nacionalidades menores poderia resultar em algum problema. E deram. Era a política de korenizatsiya ("indigenização") nos anos 1920-30 (8/12).
Os efeitos da Grande Fome atingiram não só a Ucrânia, mas também regiões da Rússia e do Cazaquistão. Mas não teve propriamente conotação nacional: Nikita e, depois, Brezhenev tinham laços com a Ucrânia e governaram o país, muitos generais do Exército Vermelho idem (9/12).
Quem deu conotação nacional, de maneira limitada, foram nacionalistas do oeste ucraniano, que na sobreviveram à estatização dos anos 1930. E inclusive sabotaram a defesa soviética durante a Invasão nazista, se unindo aos alemães até serem presos por eles (10/12).
Milhões de ucranianos morreram por causa da traição dos nacionalistas ucranianos, sobretudo aqueles de sangue judeu e cigano. Milhões de ucranianos lutaram e ajudaram o Exército Vermelho a virar o jogo na Segunda Guerra (11/12).
Com o desfazimento da URSS em termos cleptocráticos, a nova oligarquia ucraniana resolveu "simplificar" a História, construindo o mito de um crime étnico de russos contra ucranianos, enquanto se aliam com um Ocidente que não se importa com vidas ucranianas nem russas (12/12).
P.S.: parte da crítica expressa de Mao a Stalin passa por aí. Os chineses, de novo, fizeram diferente, sobretudo do meio dos anos 1960 em diante e acertaram -- antes alguém diga que "socialismo é isso".
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Uma boa dose de bobagem tem sido dita pela mídia sobre a relação entre Ucrânia e Rússia. Já começou pelo Fantástico, e isso só piorou nas redes sociais durante as últimas semanas. Sim, a cultura russa nasce em Kiev, mas isso não desabona Moscou, ao contrário (1/12).
O que se pode dizer de "cultura russa" diz respeito à organização social, política e cultural legada pelos verengues, quando estes, uma tribo sueca, tomou Kiev dos eslavos orientais e instituiu sua regra (2/12).
Depois, esses protorrussos travaram relações com o Império Bizantino, de onde sofreram influência religiosa, estética (o alfabeto cirílico é também uma adaptação do grego). Não havia o sentido de "russos" ou "ucranianos" e "bielorrussos", mas um sentido de rússias (3/12).
Se um liberal tivesse a casa invadida e sofresse junto com a família dele toda sorte de violências, ele jamais aceitaria o argumento: "na vida, quando você se confronta com um bando mais forte, e perde, acontece isso". Mas esse raciocínio vale para o "impeachment" de Dilma (1/8).
Ora, a Lei manda que seja comprovado crime de responsabilidade para haver impeachment. Se o julgador não é um juiz ordinário, mas sim o Congresso Nacional, isso não muda o fato que ele tem de decidir fundamentado na Constituição (2/8).
"Mas Hugo, havia o STF para verificar a legalidade do processo" - sim, havia e ele falhou na sua tarefa constitucional. Quando isso acontece, basicamente o sistema jurídico normalizou uma ilegalidade produzida, inclusive, por muitas de suas principais autoridades (3/8).
O início dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 em Pequim é um evento político. Em meio a tentativas do Ocidente em isolar a China e Rússia, o tabuleiro se move com uma aliança sem precedentes entre Pequim e Moscou (1/12).
Embora muito mais antiga, a China tem inúmeros pontos de contato com a Rússia. Desde o fato, em comum, delas terem sido invadidas pelas hordas mongóis, o que moldou a identidade das duas até hoje (2/12).
A invasão mongol, embora destrutiva no curto prazo, foi detida e da resistência a ela, e a absorção de técnicas e métodos mongóis, os dois países caminharam para uma unificação sem precedentes (3/12).
O Washington Post soltou este artigo de Jeff Stein com destaque: é uma confissão do fracasso da administração Biden, mas a culpa é calculadamente colocada na esquerda socialista. É importante ler e entender esta farsa (1/7). washingtonpost.com/us-policy/2022…
Basicamente, para o Post as coisas iriam mal nos EUA porque Biden governaria com gente de Bernie e Liz Warren, os quais são descritos como "liberais" - que pode significar "progressistas" no dizer vulgar americano, mas isso é proposital para ignorar o elemento socialista (2/7).
O artigo ignora que a política econômica expansionista de Biden contrasta com tensões contra a Rússia e China, as quais impactam negativamente no curto prazo e, principalmente, nas expectativas (3/7).
Isto é a cotação do barril de petróleo nos últimos dez anos. Batemos o recorde de preço dos últimos sete anos com a atual crise ucraniana. Isso terá graves efeitos inflacionários, sobretudo em relação ao Brasil (1/7).
Há sete anos, no entanto, não havia a política de preços atual, inaugurada por Temer. Nesses anos, mesmo com uma pontada em outubro de 2018, grosso modo, o preço do barril ficou comportado. Só tivemos um choque cambial, que foi repassado para as bombas e já foi um estrago (2/7).
No cenário atual, com o barril aumentando de preço, o real depreciado e a política de preços, vamos tomar uma invertida se o sistema criado por Temer-Parente, e mantido por Bolsonaro, for aplicado (3/7).
Com a ida de Orban a Moscou, e as concessões russas de venda de gás para a Hungria, Putin racha a extrema-direita europeia. Se o AfD já estava rachado e Marine Le Pen do lado e Putin, os ucranianos têm ao seu lado os poloneses e o oportunismo do establishment europeu (1/7).
Em um momento em que nem o Brasil fala com o Brasil, e Biden voluntariamente escolhe não ter interlocução nem com Lula, nem Bolsonaro, Putin receberá Bolsonaro. E receberá Lula ano que vem por certo - como está recebendo Alberto Fernandez em breve (2/7).
Toda a manobra ucraniana serviu para travar o Nordstream 2, mas também colaborou para um aumento no preço global de petróleo e gás, o que ajuda Moscou por outro lado. Quem pagou a conta foram os europeus, que são compradores de petróleo e gás (3/7).