Sendo justo, com todas as limitações, o governo Lula manteve em suas políticas públicas de saúde uma tradição sanitarista bem forte. Óbvio que foi um sanitarismo reformista, mas, ainda assim, alguns dos melhores programas do SUS aconteceram durante sua gestão.
A questão é que o cenário atual, em uma eventual vitória eleitoral de Lula, será muito diferente de quando ele assumiu a presidência. Em 1° lugar, caso Lula não revogue o "teto de gastos" nada, absolutamente nada poderá ser feito. O SUS continuará sucateado e subfinanciado.
Então a medida mais urgente será revogar esse estrangulamento neoliberal imposto ao SUS. Caso não se reverta esse modelo de austeridade, nada vai mudar. Portanto, é importante que ele fale abertamente sobre a revogação dessa política anti-pobre.
Segundo, é importante que seu ministério seja de fato sanitarista. Pelo seu histórico, é bem possível, mas tenho receio que ele abra mão dessa pastas e a ofereça ao centrão. Foi assim no 2° governo Dilma, onde ela rifou pastas extremamente estratégicas em busca da governabilidade
Em terceiro lugar, é extremamente importante que a coord. de saúde mental álcool e outras drogas seja liderada por alguém da saúde coletiva e antimanicomial. Foram anos de completo desastre na atenção psicossocial. Quem pegar a pasta vai se deparar com uma política em frangalhos.
Desde o segundo governo Dilma a atenção psicossocial tem sido alvo de ataques. No governo Temer e Bolsonaro houve literalmente uma tentativa de aniquilação da RAPS. Vai ser necessário basicamente reconstrui-la do zero.
Vai ser necessário retirar novamente da Rede de Atenção Psicossocial os hospitais psiquiátricos, voltar com os programas de avaliação dos HP's, retomar o incentivo ao trabalho de saúde mental na atenção primária, retorno da ESF, etc. Enfim, tá tudo em ruínas.
Por fim, acho que o mais importante não vai acontecer (quero estar errado), que é a retirada das comunidades terapêuticas da RAPS. Enquanto essas aberrações estiverem presentes na RAPS, os CAPSad, unidade de acolhimento e leitos em hospitais gerais não serão prioridade.
Hoje o que mais ameça a atenção psicossocial são as comunidades terapêuticas, esses centros de tortura fundamentalistas. É preciso acabar com o financiamento público a esses manicômios, mas pra isso seria necessário mexer com o poder evangélico.
E não sei se Lula 3.0 estará disposto a comprar essa briga, até porque a esquerda em geral não está. Mas precisamos pressionar pra que isso aconteça.
P.S: Eu começo esse fio justamente dizendo que o governo Lula foi próximo ao sanitarismo e que teve boas políticas de saúde. Portanto, quando eu falo do que precisamos exigir, não é um ataque. Acho que na verdade só podemos exigir isso dele porque ele já o fez antes.
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Gente, na moral, vocês já moraram em lugar barulhento? Porque só quem já viveu isso sabe o inferno que é. Até hoje sofro com isso e desenvolvi uma hipersensibilidade ao som justamente porque morei em um lugar que tinha som alto 24 hrs por dia. Quem precisou de terapia fui eu.
E não tem nada a ver com puritanismo não, tem a ver com o quão não faz sentido submeter pessoas a esse tipo de estresse. Você não consegue estudar, não consegue descansar, não consegue dormir. Qualquer barulho, mínimo que seja, passa a incomodar e a irritar.
Ainda hoje preciso de ruído branco o dia todo, durmo com protetor auditivo e tenho uns vinte tipos diferentes de tampão por causa disso. Então, na moral, eu queria muito que a lei do sossego fosse levada mais a sério, principalmente no Ceará, onde a cultura do paredão é forte.
"A ontologia hoje dominante nega a possibilidade de que enfermidades psicológicas tenham uma possível origem de natureza social. Obviamente, a "bio-quimicalização" dos distúrbios mentais é estritamente proporcional à sua despolitização.
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Considerá-los um problema químico e biológico individual é uma vantagem enorme para o capitalismo. Primeiramente, isso reforça a característica do próprio sistema em direcionar seus impulsos a uma individualização exacerbada
Eu amo a Silvia Federici, mas acho que às vezes ela insiste em umas caricaturas de Marx pra sustentar o ponto dela.
No Calibã e a Bruxa ela repete muito uma ideia simplista de que Marx desconsiderava a exploração da mulher via trabalho reprodutivo, quando, na verdade, Marx e Engels sempre reforçaram que a exploração da mulher antecedeu a exploração de classe (mulher como propriedade).
Em Reencantando o Mundo, livro esse que tem sido de longe um dos melhores que já li dela, ela reproduz a mesma falácia do Marx produtivista, como se Marx fosse alguém despreocupado com a questão ambiental.
Descobriram que Bolsonaro não tem empatia. Daí, a conclusão lógica que tiraram é que ele é "psicopata", não que isso faz parte do seu projeto de governo. Ignoram, porém, que ele não toca esse projeto sozinho e tem apoio de ministros, militares, burguesia. Todos são psicopatas?
É fácil demais dizer que o problema é única e exclusivamente uma questão psicológica do Bolsonaro. Só que isso não responde nada, não ajuda em nada e só despolitiza a questão.
Ele continua tendo o apoio da classe dominante, independente do seu projeto genocida. Ele continua tendo o apoio e o aval das forças armadas. Ele continua tendo amplo apoio político. O fundamentalismo religioso continua do lado dele.
Esses dias uma pessoa comentou em um post meu "criticar é fácil. Quero saber o que você faria" (contexto: era um post crítico às CT's). O comentário foi tão ridículo que na hora só respondi que eu não era ministro da saúde nem coordenava nenhuma pasta na saúde kkkkk
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Depois fiquei pensando: taí, seria um bom exercício pensar em uma política de saúde mental sob uma perspectiva revolucionária. Guardei essa ideia, mas acho que em 2022 bem que poderia haver uma organização pra construir uma proposta de programa antimanicomial coletivo.
Uma espécie de carta de compromisso para as candidaturas de esquerda, algo assim. Documento esse, claro, orientado pelos princípios do SUS e da reforma psiquiátrica brasileira. Seria interessante, né?
Será que não seria o caso do movimento antimanicomial parar de se referir às "Comunidades Terapêuticas" como "Comunidades Terapêuticas"?
Explico:
1) O termo Comunidade Terapêutica surge de uma experiência de desinstitucionalização e reforma psiquiátrica inglesa, desenvolvida por Maxwell Jones. No entanto, essa experiência nada tem a ver com o que conhecemos por "Comunidade Terapêutica" no Brasil.
A ideia do idealizador da Comunidade Terapêutica era desenvolver uma modalidade de cuidado pautada na democratização das relações, horizontalidade institucional, na aprendizagem social e desospitalização.