Vamos lá: a cada like, uma impressão/curiosidade/dado sobre o trabalho de analistas e técnicos nos clubes de futebol e no geral
1) O preparo e espaço que clubes dão aos analistas aumentou MUITO de 2014 para cá. Hoje, todo clube tem pelo menos um analista para a base e um para o profissional. Talvez seja o principal legado que o 7 a 1 deixou, mas por ser invisível, é pouco falado.
2) Analista de desempenho não ganha jogo, mas ajuda a identificar variáveis e possíveis focos de estratégia. Acontece pouco, mas quando o time muda algo e dá super certo, isso nasceu no analista, foi discutido pela comissão, treinado...vocês não imaginam o trabalho que dá.
3) Mesmo assim, a classe ainda é muito mal remunerada. Coisa de R$ 1.000,00 por mês em clubes menores. Quando paga. Há alguns anos, alguns clubes grandes simplesmente não remuneravam os analistas, com diversas desculpas. Péssimo, mas a melhora é lenta.
4) O analista é o cara que mais trabalha no clube. Analisa adversário, o próprio time, outros jogos para prospecção de mercado. Geralmente, chegam cedo, saem tarde e poucos conseguem viajar - viajar com o time, num clube, é sinônimo de status. Nem os grandes conseguem pagar tudo.
5) Todos os termos táticos - compactação, entrelinha, etc - são amplamente usados dentro da comissão, antes dos treinos, nos jogos. Não deveria haver tanto celeuma por isso, é meio que lógico e todo mundo sabe que existe muito mais que isso. Essa discussão não existe na prática.
6) Nenhum técnico usa termo complicado no treino. Nenhum. Todo mundo sabe que o jogador gosta e entende termos mais simples e próximos. E outra, no treino, é preciso chamar a atenção, dar bronca. Rola bastante palavrão. De novo, esse tabu simplesmente não existe na prática.
7) NINGUÉM se prepara pra perder. Todo mundo contrata técnico e jogador achando que, dentro de uma lógica, aquilo vai dar certo. A diferença entre uma derrota e uma vitória é muito pequena, e dá pra perder as contas de quantos bons trabalhos foram interrompidos por DETALHE.
8) Aliás, são esses detalhes que as direções deveriam entender na hora de demitir ou contratar. As contratações de técnico, salvo raras excessões, são feitas por simpatia do presidente ou do conselho que elegeu o presidente. Nunca por critérios técnicos. Sim, é amador desse jeito
9) Aliás, se há algo que atrasa os clubes de forma geral é a política. TODO presidente tem conexões com um conselheiro que tá lá há 30 anos, não faz mais nada há 10 e continua mandando e tomando decisões. A política dos clubes é extremamente complexa e barra gestões profissionais
10) Aliás, é pelo conselho e por dirigentes que a pressão que a torcida faz no estádio respinga dentro do clube. Conselheiros são extremamente passionais e TODO MUNDO tem uma opinião sobre como o time deve jogar/quem deve jogar. Sério, é um ambiente altamente passional e absurdo.
11) Já teve caso de conselheiro com anos de clube mandar whatsapp pra técnico dizendo que ele "deveria" fazer isso. Imagina você, que se preparou e tá na profissão há anos, recebendo conselhos imperativos de caras que não fazem nada há anos? Ser técnico é sofrer de todo jeito.
12) Aliás, sobre técnicos (já que vocês tão curtindo muito): existe sim, treinadores que simplesmente não acreditam em análise de desempenho, etc. E eles ganham assim como os que acreditam. O futebol é muito ilógico e democrático, tem espaço pra absolutamente tudo.
13) Mas geralmente, esse perfil de treinador não se sustenta. Tem um caso no qual o analista fez o relatório do adversário, colocou na mesa do treinador e depois voltou lá. O relatório, que tinha umas 60 páginas, sequer tinha sido aberto.
14) No futebol, nome e passado têm um peso imenso. Se um jogador faz gol numa final, pode ser quem for, vai ser lembrado eternamente. O peso de um título ou de uma vitória é imenso, muito maior do que a gente imagina. E normalmente essa memória também implica em ter mais emprego.
15) Isso torna o meio MUITO fechado. Quem não jogou e quer trabalhar num clube, se prepara pra trabalhar de graça por anos até conseguir entrar e provar a qualidade. Aliás, futebol é um meio de extrema desconfiança. Todo mundo é desconfiado porque, em algum momento, foi traído.
16) Por ser fechado, vira político. Por ser político, vira sempre o grupinho dos mesmos. Quem tem boas intenções, precisa ceder em um ou outro momento pra política pra colocar alguma coisa boa no clube. Ou seja, futebol é como Brasília, só que elevada à enésima potência.
17) Das gestões, Paulo Nobre e Bandeira foram as mais profissionais no Brasil há muito tempo. E as mais criticadas também. Vocês se espantam, mas a lógica do torcedor é tão atrasada e nociva quanto a dos conselheiros. Aliás, os dois são os mesmos.
18) Lembrando: ser profissional não significa não errar. De novo, no futebol, ninguém QUER errar. Todo mundo acha que vai dar certo. Mas às vezes tu contrata um jogador e descobre que ele é péssimo de grupo. Ou que ele tá lesionado. A culpa é sua? Óbvio que não.
19) Jogador derruba treinador sim. Derruba concentrando menos, dando menos importância ao treino. E normalmente, se derruba, é porque o trabalho não foi muito bom na gestão de grupo. Os jogadores se conversam entre si. Quando chega um técnico, todo mundo pergunta se é bom, etc
20) Todo jogador de futebol sonha em ser grande, e sabe que pra ele ser grande ele precisa jogar. Entrar de titular num jogo, não importa qual, é a coisa que o jogador mais valoriza. Boa parte das "perdas de grupo" se dá porque o treinador não conseguiu conquistar o banco.
21) Isso é mais desenvolvido na Europa? É sim. Lá, jogador sabe que não vai jogar todos os jogos e aceita banco numa boa. Tem outra coisa que explica isso: na Europa, ninguém muda de vida quando troca o clube. Explico mais abaixo.
22) O futebol europeu é melhor que o brasileiro porque geograficamente é mais perto, culturalmente é mais desenvolvido e economicamente mais rico. Esqueçam o que fazem com técnicos, os trabalhos e o cotidiano são bem parecidos. O produto final é bem diferente sim.
23) Tudo é fácil e acessível no futebol europeu porque é PERTO. Reino Unido cabe em SP. Jogador tem mais tempo de recuperar, mais tempo com a família, ..."ain todo mundo vai embora porque não ama o clube". Não, vai embora porque, pro jogador, é MUITO MELHOR jogar lá.
24) Por ser fácil, lá dá pra você jogar em Manchester e morar em Londres. O jogador não muda os filhos de escola, se muda e leva a família, etc quando muda de clube. Lá, ser jogador é mais uma PROFISSÃO que um sonho ou uma conquista como é aqui no Brasil.
25) Jogador muda de cidade, troca os filhos de escola, a esposa fica sozinha, o cara não conhece ninguém...por isso estrangeiro demora a dar certo. Existe sim o tempo de adaptação que o torcedor não conhece e pega no pé injustamente. Não é como intercâmbio, onde tudo é lindo.
26) Essa dificuldade cria uma necessidade desse cara jogar e ser protagonista. Você aceitaria mudar tanto de vida assim pra ficar no banco? Óbvio que não. Aí o cara não entende, se revolta com o técnico, o time começa a ficar instável e o técnico é demitido. Tem n casos assim.
27) O Felipão uma vez disse que ciúme de homem é o pior que existe. É bem isso. O jogador brasileiro, por ter tanta dificuldade pra jogar, é um tanto mimado pra cumprir ordens ou entender um banco. Lidar com essas diferenças é 50% do trabalho do técnico. Tem que ter paciência...
28) Paciência e tato. Jogador DETESTA ficar no banco sem saber o porquê. Mourinho começou a fazer isso e só se ferrou. A coisa que o jogador mais gosta é transparência, sempre. Fala uma coisa e faz ela. Dá muito problema de gestão um técnico treinar um time e mandar outro a campo
29) É por esses meandros que o rodízio do Osorio e Aguirre não vai dar certo nunca aqui. Deu certo com o Felipão ano passado porque todo mundo jogava. E dosou. Usou apenas 29 jogadores, contra 36 de média. Aliás, um time colocar 36 jogadores diferentes em 38 jogos é UM ABSURDO.
30) Que é um reflexo da baderna como país e como futebol. De novo, a tecla da bagunça é grande, porque o futebol é a coisa mais bagunçada e política que existe no país. Tem time que ganhou Brasileirão sem treinar, com os jogadores derrubando técnico, salário atrasado. Pois é.
30) O Flamengo NÃO ESTÁ gastando o que não tem. Está gastando uma parte maior do que estava direcionado para contratações. Desde 2013 é a primeira vez que o clube tem muito dinheiro em caixa pra gastar. Existe risco? Sim. Mas dizer que o Arrascaeta tá quebrando o clube é mentira.
31) O Palmeiras NÃO DEPENDE da Crefisa. O dinheiro do patrocinador corresponde a uns 17% do faturamento. A maior parte da virada financeira do clube vem do programa de sócios Avanti e da venda de jogadores. Ingresso caro é o preço pra ver o time vencer. Não adianta reclamar.
32) Ninguém no exterior acha mais que o futebol brasileiro é o melhor do mundo. Já faz uns 30 anos. O que a Europa valoriza e realmente acha que o daqui é melhor é o jogador. Europeus e americanos sempre vão ver o jogador brasileiro como mais talentoso, ousado e técnico.
33) O Brasil de 2010 era sim a melhor seleção do mundo com a Espanha. Ganhou absolutamente tudo antes da Copa e era ampla favorita com a imprensa internacional, até mais que a Espanha. Só aqui que não recebeu o crédito, mas no auge, esse time jogou demais.
34) Aliás, brasileiro é muito iludido. A gente acreditou que perdeu 1950 porque o goleiro era negro. Você consegue enxergar o absurdo nessa afirmação? Somos o povo mais iludido do planeta. Tem pesquisas que provam que o Brasil é o país com menos senso da realidade no mundo.
35) Colocar o Bernard no lugar do Neymar em foi a decisão mais próxima do que era feito em 2014. O Brasil fazia o gol cedo, se recolhia e administrava. Levar o primeiro gol teve um efeito emocional muito grande no grupo. O 7 a 1 foi apagão sim, dentre tantas coisas.
36) Um dos caras mais injustiçados aqui é o Sebastião Lazaroni. Ele é zoado até hoje, mas foi o primeiro a analisar o futebol como um todo na década de 1980, a dizer que o Brasil precisava mudar preparação, treino...comprou a briga de modernizar a seleção com 3 zagueiros em 90.
37) A influência do esquema tático no jogo é mínima. Reduzir o estudo no futebol a eles é um absurdo imenso. Esquemas são pontos de partida pro movimento, e o estudo tático no esporte é o estudo do movimento. Discutir se um time rende mais no 4-3-3 que no 4-4-2 não tem sentido.
38) Você nunca se perguntou porque um jogador come a bola num ano e depois vai mal no outro? É pelo movimento dele que muda. As interações com jogadores. Aliás, achar que o craque vem só do talento ou de dom divino é ignorância pura. O peso do entorno e dos companheiros é IMENSO.
39) João Saldanha não foi demitido da Seleção por conta de política. Foi demitido porque ele bateu de frente com o Pelé. E se ele tivesse sido o técnico, o Brasil provavelmente não teria ganhado. Extremamente superestimado. As crônicas analíticas tinham bastante abobrinha.
40) O Brasil de 1982 era um timaço, mas a Itália foi melhor naquele jogo e explorou a lentidão do Zico/Sócrates pra retornar até a ponta direita. O time tinha um certo desequilíbrio e pagou o preço por isso. São questões do jogo. Não foi o futebol que perdeu, que ladainha chata.
41) Aliás, todo time vencedor é marcado por equilíbrio. Não existe essa coisa de ser ofensivo ou defensivo, todo técnico quer equilíbrio dentro de uma ideia. Normalmente, pedir que um time jogue pra frente vai fazer ele levar mais gols.
42) Caçar erro ou culpado depois de derrota é o grande costume do torcedor, mas muitas vezes o trabalho é muito bom e se perde por questões do jogo. Novamente, perder e vencer são separados por detalhes. Tem que reconhecer sim trabalho com na derrota, perder não é tudo, faz parte
43) O Brasil de 1994 nunca "jogou feio". Outra ilusão que a gente acredita. Era o time mais elogiado pelo Cruyff durante a Copa, pelo modelo de usar a bola como artifício pra defender e atacar. Pode não agradar o paladar brasileiro, mas era um timaço e influenciou muita gente.
44) Guardiola NUNCA se inspirou no Brasil. NUNCA. As bases da filosofia dele e do Barcelona nunca tiveram nada a ver com o "futebol brasileiro do passado". Foi um combinado entre Ajax, Independiente e futebol inglês. O City não joga como o Brasil de 1982. É uma grande mentira.
45) Nenhum técnico treina o time “pra dar espetáculo”. Treina para que o time tenha padrão, seja equilibrado, para que o grupo entenda as ideias. Essa pressão por jogar bonito ou feio não existe no treino. Todos querem ganhar da forma deles, não importa qual
46) Tem jogadores gays sim. Não se assumem por conta de torcida e dirigente, porque o grupo normalmente aceita. Na Europa e no Brasil, todos têm medo do que vão pensar e falar na imprensa. É um meio muito preconceituoso, mais que a sociedade.
47) Neymar é um dos jogadores mais profissionais que tem. Não tem um pio de técnico reclamando dele. Chega no horário, treina, se prepara muito mais que o normal. Ele pode ser muitas coisas, mas mimado certamente não é uma delas.
48) Muito jogador sofre de depressão e tem ataque de pânico antes dos jogos. Não é fácil encarar a pressão de ser profissional, ainda mais num clube grande. Muitos não conseguem sequência justamente por isso. Não é frescura, é sério.
49) A rotina do futebol é insana e tira a energia e tempo dos envolvidos. Jogador raramente tem tempo de fazer faculdade, casa cedo porque não tem tempo de conhecer alguém, a carreira dura pouco e envolve vários sacrifícios. Não ganham bem à toa.
50) Isso envolve os técnicos também. Normalmente, eles não fazem cursos o tempo todo porque estão envolvidos em problemas muito maiores no clube: como montar o time, como evitar lesão, como ver o adversário. É uma rotina também dura e difícil.
51) Jogador ama shopping. Ama comprar. É o subterfúgio que eles têm pra essa rotina doida e com falta de tempo. Eles não podem ver os amigos, beber ou comer o que querem. Então descontam as frustrações em tênis, relógio, corte de cabelo...é besteira ficar pregando contra isso.
52) É muito raro alguém que joga no clube "por amor". A maioria fica num clube por adaptação e plano de carreira. Desculpa matar a ilusão, mas jogar por amor é muito raro e não ganha jogo. Quem fica no clube, fica porque recebeu aumento e a família gosta da cidade.
53) Jogadores fazem poucos amigos durante a vida. A maioria se aproxima pra se aproveitar do status. Normalmente, eles levam o grupo que se conheceu na base adiante porque não é "viciado" nem quer tirar uma casquinha. E esses caras ajudam muito o cara a manter a concentração/foco
54) A imprensa não cria crise do nada, nem inventa notícia. Se algo é publicado, é porque alguém vai ler. Audiência importa porque é o que sustenta os jornais e sites. Se você não gosta de x ou y, não leia nem dê atenção - porque raiva vende mais que amor.
55) Os programas de debate, aqueles bem clubistas, começaram porque dois jornalistas combinavam de brigar antes dos comerciais e a audiência aumentou e bateu a da Globo. De novo: o público tem um papel fundamental no que é ou não publicado.
56) A coisa que mais enfurece jogadores e técnicos é ter salário publicado. Sério, todos ficam muito bravos. E não é legal, mas é uma das coisas que mais dá audiência. Todo mundo quer saber quem ganha mais (geralmente pra xingar mais).
57) A maioria das brigas e cenas lamentáveis terminam no gramado mesmo e sempre são geradas por coisas do jogo. Sasha/Luan é uma exceção, normalmente todos os jogadores se dão bem.
58) Evolução tática do futebol existe sim, mas como toda mudança na sociedade, não é algo que você percebe de cara. Assiste um jogo de 2009 e compara com um de hoje, você vai notar diferenças mas nem sempre vai conseguir colocá-las na ponta da língua. Isso é evolução.
59) Quando um técnico fala que "não teve nada de diferente na Copa" e etc, é justamente porque ele não consegue ver que a mudança é nas pequenas coisas. Não é porque o cara é burro ou desatualizado, o olhar dele não é treinado pra ver coisas que analistas e jornalistas vem.
60) Grande parte das pessoas que trampam com futebol não "entende de tática" porque o cotidiano delas é tão difícil e a pressão por resultado é tão grande que ele não tem tempo de sentar e ver o objeto de trabalho de uma forma diferente. E muitos se interessam sim, bastante.
61) Time que vence geralmente tem muita sorte. Muita mesmo. Sorte de não ter um adversário melhor, sorte de jogar mal e a bola entrar, sorte dos jogadores estarem em fase. De novo, espetáculo é muito raro, o futebol do dia-a-dia é feito de muito suor e treino.
62) A briga entre Flamengo e Sport pra ver quem ganhou 1987 é um saco. Os dois ganharam algo, que teve um valor naquela época. Poderia rolar uma união pra ter uma liga mais forte e que fosse boa aos clubes. Infantilidade toma conta de marmanjo quando o assunto é futebol.
63) Tem torcida que canta mais que as outras e os jogadores sabem disso. E não tem problema, porque é a cultura do clube. Tem clube que a torcida apoia na fase ruim, tem clube que a torcida deixa de lado porque isso é uma forma de protesto. A polêmica não existe.
64) Pelé era uma máquina de marketing na década de 1970. Fazia comercial, filme, lançava produto. Foi um visionário. Dentro de campo, ele realmente era melhor que os outros e não era apenas por recurso técnico. O preparo físico e força eram coisas incomuns pra década de 1960 e 70
65) Ou seja: naquela época, Pelé foi sim o melhor do mundo. Se fosse hoje, não sei. Messi tem números, histórias e talento pra ser o melhor do mundo na nossa época e no nosso crítério de futebol. Não existe uma verdade absoluta, é tudo fruto do seu tempo.
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Você já parou pra pensar que todo mundo vê o MESMO jogo? Como pode ter tanta opinião diferente sobre a mesma coisa?
O gol do Deyverson na Libertadores é um exemplo.
Foi uma falha do Andreas. Foi também uma tática criada pelo Palmeiras. As coisas não se anulam!
Segue o fio⬇️
O escritor David Foster Wallace diz que é impossível sabermos a verdade, porque tudo o que vivemos e pensamos teve um protagonista, um filtro, que é nossa mente.
Tudo o que você sabe sobre o mundo tem você como protagonista. Logo, é impossível não ter viés. Por mínimo que seja.
O futebol é o maior exemplo do que Wallace fala.
O jogo que você vê é aquele que sua mente diz pra você. Não exatamente o que aconteceu. Por isso tem tanta opinião diferente sobre o gol de Deyverson: cada um puxa a sardinha pra um lado diferente da história.
Se o adversário te enfrenta para se defender, todo na área e fechando espaços, o que você faz:
reclama na coletiva?
ou pensa em soluções?
O Flamengo de Renato Gaúcho peca no último quesito. Simplesmente por não ter mecanismos para criar o que faz o time jogar: espaço. Fio🔽
Não existe futebol sem espaço. Pode ser um metro, dez metros, campo inteiro: pra um jogador fazer o gol, precisa ter nem que seja meio metro para chutar.
Levar a bola da defesa até o ataque também. Eles precisam, como time, criar espaço no adversário.
Existem muitos jeitos de criar espaço numa defesa.
Todos eles se resumem a tirar um jogador do lugar em que ele está, para que aquele espaço esteja desocupado e seja aproveitado pelo time.
Um exercício de atração. De "ludibriar" o oponente.
Dizem que o Brasil tem 200 milhões de treinadores.
Mas você entende aquele um que tá lá na beira do gramado?
O jogo em que o Palmeiras bateu recordes no Brasileiro é um bom exemplo de como é fundamental entender a lógica do seu treinador para compreender suas decisões. Fio🔽
A vitória do Palmeiras por 2 a 1 no Sport foi o jogo em que o time mais chutou (36), acertou o gol (16) e acertou cruzamentos (14) no ano.
Foi, inclusive, o jogo em que uma equipe mais finalizou a gol e mais acertou o gol em qualquer jogo do Brasileirão desde 2013.
Massacre.
Parte da melhora do time veio com a entrada de Gustavo Scarpa no 2º tempo, no lugar de Danilo - que vem fazendo algumas partidas abaixo.
Scarpa é o maior assistente do Brasileirão. Foi dele os escanteios dos dois gols, de cabeça, que deram a vitória.
Há uma discussão muito grande sobre falta de drible no futebol.
Esse debate é respondido sempre do ponto de vista individual: falta talento, falta driblador, o técnico é ruim…
Se olharmos para o jogo, veremos que a resposta não está no indivíduo, mas sim no coletivo. 🔽
Muito do que pensamos sobre o drible vem do mito, do imaginário construído sobre ele. Afinal, o futebol é um fenômeno dentro de uma coisa maior, o jogo, uma atividade lúdica. Competitiva, mas lúdica, o que faz com que o futebol jamais seja uma atividade puramente racional.
É normal puxar esse imaginário quando julgamos que falta drible, seja naquele time que não consegue furar uma retranca e fica tocando de lado (alô, Flamengo) ou naquele jogo da Seleção em que o Twitter vira um lamaçal de reclamações.
Não basta ser só habilidoso ou bom de bola para jogar futebol.
O alto nível exige mais coisas, como concentração, inteligência e algo que Gérson peca há tempos, como a péssima atuação contra a Venezuela mostrou: dominar o momento após perder a bola. Breve fio 👇
Um dos pilares da seleção com Tite é o que ele chama de "perde-pressiona": nos segundos após o time perder a bola, TODO mundo tem que fazer algo para evitar que o adversário progrida em campo.
Perdeu a bola? Então pressiona, encurta, faz falta...mas não deixa os caras irem.
O tipo de ação exigida do jogador depende de sua função. Defensores voltam para compor a linha de quatro, enquanto atacantes e principalmente meio-campistas precisam saltar, encurtar, enfim, fazer força pra evitar que quem roubou a bola tenha conforto para sair jogando.
O problema do Palmeiras não é jogar em contra-ataque. Essa é uma escolha válida, que casa com o elenco, que rendeu títulos e por aí vai.
O problema, evidente contra Juventude e América-MG, é quando a proposta não encaixa.
Como lidar com um cenário diferente? Fio👇
Há muitos anos que o Palmeiras é um time mais reativo, que se defende bem e sai rápido. Técnico sai, técnico vem e a equipe continua assim porque é algo que o elenco pede.
Dudu, Rony, Patrick, Piqueréz, até Zé Rafael e Scarpa...são jogadores que gostam de atacar espaços.
O que é atacar um espaço? É correr em direção a um setor vazio com a intenção de receber um passe nas costas do defensor e num lugar à frente de onde o jogador está.
Para criar esse cenário, o Palmeiras se fecha e repete a imagem quando retoma a bola: acelera, toca no espaço.