Se o adversário te enfrenta para se defender, todo na área e fechando espaços, o que você faz:
reclama na coletiva?
ou pensa em soluções?
O Flamengo de Renato Gaúcho peca no último quesito. Simplesmente por não ter mecanismos para criar o que faz o time jogar: espaço. Fio🔽
Não existe futebol sem espaço. Pode ser um metro, dez metros, campo inteiro: pra um jogador fazer o gol, precisa ter nem que seja meio metro para chutar.
Levar a bola da defesa até o ataque também. Eles precisam, como time, criar espaço no adversário.
Existem muitos jeitos de criar espaço numa defesa.
Todos eles se resumem a tirar um jogador do lugar em que ele está, para que aquele espaço esteja desocupado e seja aproveitado pelo time.
Um exercício de atração. De "ludibriar" o oponente.
Como fazer esse mecanismo, depende de cada técnico. Tem os que preferem de uma forma mais vertical. De uma forma direta. E Renato, assim como seu trabalho no Grêmio, como Jesus, Dome e Ceni e como a torcida do Flamengo quer, gosta de uma forma mais apoiada, a partir da bola.
Tá, então é só ir tocando bola? Qual o motivo de tocar bola e ficar com a posse?
A posse é o mecanismo para o time ir "atraindo" os rivais para um canto. O passe é a ferramenta para conectar o jogador que atraiu o rival ao jogador que "ataca" o espaço gerado.
Toca. Aproveita.
Por isso muito se fala em "toque de bola", que para mim, é o DNA do futebol brasileiro: toca a bola, atrai um defensor, toca para o adversário que aproveitou esse defensor e assim vai "envolvendo" o rival.
O Flamengo com Renato tem essa ideia. Mas executa mal. Mas assim, mal demais.
Porque toca e até gera espaços.
Mas não aproveita eles. Não entende onde eles estão. E quando entende, porque os jogadores são inteligentes, não toca a bola no TEMPO correto para conectar o espaço.
Vamos a um exemplo: time com a posse, propositivo, todo no campo do rival. Isla tem a posse da bola. Gabi e Éverton viram o corpo e dão apoio. Com esse movimento, eles querem que algum dos cinco defensores do Athletico saia desse alinhamento e gere um...espaço perto do gol.
É o que acontece quando Isla toca para Éverton Ribeiro. Um espaço, pequeno, é gerado, entre o ala e o zagueiro. Esse espaço, chamado de "mesoespaço", é um dos mais importantes no jogo.
A gente até vê o Isla vendo a lacuna e correndo até ela.
Mas o Éverton demora a passar.
E essa demora é mortal.
Primeiro porque ela faz com que o jogador com a bola perca o ângulo do passe. E dá a chance do adversário pensar e se reorganizar para cobrir os espaços que ele mesmo gera com a dinâmica do jogo.
O zagueiro do Athletico vira o corpo já pra cobrir Isla.
Todo jogo tem espaço. Ele pode estar longe ou perto do gol, nas costas de alguém. Mas o espaço tá ali. O desafio é IDENTIFICAR o espaço, e quando ele realmente é negado, o time precisa se mover coletivamente para CRIAR esse espaço.
O Flamengo até identifica. Mas criar...
Por exemplo, aqui: zagueiro com a bola.
Onde está o espaço? Enquanto a linha do Athletico se fecha, há uma lacuna no corredor direito. Se alguém receber a bola lá, a única forma do adversário se reorganizar é com os defensores um pouco mais afastados da área.
Quando o Filipe Luís recebe a bola, você vê, pelo posicionamento corporal e o movimento do Andreas e do Bruno Henrique, que existe essa intenção de ver e ocupar uma lacuna. É o que eles fazem.
E quando eles fazem isso, um outro espaço é gerado. Entre o zagueiro de lado e central do CAHP. É a chance de criar uma jogada, de botar a bola perto do gol.
Mas ninguém está lá. Gabi, o mais próximo, nem posiciona o corpo. Ele teria que estar em diagonal, correndo.
Como não aproveitou, o Flamengo toca para trás...
E o desafio que Renato não vem respondendo em seu trabalho recomeça: criar espaço nessa defesa aí.
Defesa essa que é uma proposta válida, eficiente e que hoje fez 3 a 0 no time mais rico do Brasil em pleno Maracanã.
Retranca essa que vai ser o normal para adversários que não têm o mesmo elenco, o mesmo dinheiro e a mesma pressão do Flamengo.
Não adianta reclamar. Vai ser assim sempre. É assim na Premier League com o "Top 6". É assim com Real e Barça. Com o Bayern. Com Fla, Palmeiras, Galo..
A retranca dos outros JAMAIS será desculpa pela falta de mecanismos e movimentos que não dependem da qualidade de um ou do salário do outro.
Dependem de treino. O principal instrumento do treinador enquanto profissional.
A gente já viu, com Jorge Jesus, o que um time acima da média bem treinado é capaz de fazer.
E vimos, contra o Athletico, o que um time acima da média sem esse treino de qualidade é capaz de fazer. De não jogar bem.
Renato disse que a bola não quis entrar.
Não é bem assim.
O Flamengo não teve mecanismo para fazer ela entrar. Das 20 chances, a maioria veio de cruzamentos ou do abafa que vem sendo costumeiro nos minutos finais. ge.globo.com/blogs/painel-t…
A eliminação dói, como todas. A temporada segue viva, com Supercopa Carioca, Brasileiro em disputa e, é claro, a final da Libertadores.
Mas o time precisa jogar contra retrancas e se desculpar menos por elas. Futebol é um jogo de espaço. E o Flamengo não soube como criá-los.
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Dizem que o Brasil tem 200 milhões de treinadores.
Mas você entende aquele um que tá lá na beira do gramado?
O jogo em que o Palmeiras bateu recordes no Brasileiro é um bom exemplo de como é fundamental entender a lógica do seu treinador para compreender suas decisões. Fio🔽
A vitória do Palmeiras por 2 a 1 no Sport foi o jogo em que o time mais chutou (36), acertou o gol (16) e acertou cruzamentos (14) no ano.
Foi, inclusive, o jogo em que uma equipe mais finalizou a gol e mais acertou o gol em qualquer jogo do Brasileirão desde 2013.
Massacre.
Parte da melhora do time veio com a entrada de Gustavo Scarpa no 2º tempo, no lugar de Danilo - que vem fazendo algumas partidas abaixo.
Scarpa é o maior assistente do Brasileirão. Foi dele os escanteios dos dois gols, de cabeça, que deram a vitória.
Há uma discussão muito grande sobre falta de drible no futebol.
Esse debate é respondido sempre do ponto de vista individual: falta talento, falta driblador, o técnico é ruim…
Se olharmos para o jogo, veremos que a resposta não está no indivíduo, mas sim no coletivo. 🔽
Muito do que pensamos sobre o drible vem do mito, do imaginário construído sobre ele. Afinal, o futebol é um fenômeno dentro de uma coisa maior, o jogo, uma atividade lúdica. Competitiva, mas lúdica, o que faz com que o futebol jamais seja uma atividade puramente racional.
É normal puxar esse imaginário quando julgamos que falta drible, seja naquele time que não consegue furar uma retranca e fica tocando de lado (alô, Flamengo) ou naquele jogo da Seleção em que o Twitter vira um lamaçal de reclamações.
Não basta ser só habilidoso ou bom de bola para jogar futebol.
O alto nível exige mais coisas, como concentração, inteligência e algo que Gérson peca há tempos, como a péssima atuação contra a Venezuela mostrou: dominar o momento após perder a bola. Breve fio 👇
Um dos pilares da seleção com Tite é o que ele chama de "perde-pressiona": nos segundos após o time perder a bola, TODO mundo tem que fazer algo para evitar que o adversário progrida em campo.
Perdeu a bola? Então pressiona, encurta, faz falta...mas não deixa os caras irem.
O tipo de ação exigida do jogador depende de sua função. Defensores voltam para compor a linha de quatro, enquanto atacantes e principalmente meio-campistas precisam saltar, encurtar, enfim, fazer força pra evitar que quem roubou a bola tenha conforto para sair jogando.
O problema do Palmeiras não é jogar em contra-ataque. Essa é uma escolha válida, que casa com o elenco, que rendeu títulos e por aí vai.
O problema, evidente contra Juventude e América-MG, é quando a proposta não encaixa.
Como lidar com um cenário diferente? Fio👇
Há muitos anos que o Palmeiras é um time mais reativo, que se defende bem e sai rápido. Técnico sai, técnico vem e a equipe continua assim porque é algo que o elenco pede.
Dudu, Rony, Patrick, Piqueréz, até Zé Rafael e Scarpa...são jogadores que gostam de atacar espaços.
O que é atacar um espaço? É correr em direção a um setor vazio com a intenção de receber um passe nas costas do defensor e num lugar à frente de onde o jogador está.
Para criar esse cenário, o Palmeiras se fecha e repete a imagem quando retoma a bola: acelera, toca no espaço.
Flamengo e Palmeiras, a final dos times que dominam o Brasil. Os últimos campeões da Libertadores do Brasileirão.
Ganhar e perder é do jogo, Gabigol e Breno Lopes que o digam. Mas chegar sempre não é acaso. É fruto da ruptura administrativa que os dois clubes fazem há oito anos.
O Flamengo passou anos brigando contra rebaixamento quando Bandeira de Mello assumiu o clube no fim de 2012. Sua meta era sanar uma dívida de quase R$ 800 milhões e evitar processos trabalhistas e salários atrasados.
A situação do Palmeiras era ainda pior. Rebaixado para a Série B, contava com apenas 18 jogadores no elenco quando Paulo Nobre assumiu a presidência. Além das altas dívidas, a receita do clube era muito pequena, a ponto de não conseguir contratar jogadores.
Um dos grandes problemas do Brasil é confundir análise com gosto pessoal.
Time bom ou ruim não depende de beleza, mas sim da execução de uma ideia de jogo.
O Palmeiras do Abel tá longe de ser "bonito". Mas executa fielmente sua proposta. Deve sim, ser elogiado por isso.🧵👇
Desde que chegou ao Palmeiras, Abel se caracterizou como um treinador adaptável. Ele prefere estudar o adversário, identificar pontos fortes e neutralizá-los para não sofrer gols. É o lema da "baliza zero".
Essa é uma escolha, que para muita gente, produz um futebol mais feio.
Só que essa escolha é válida, benéfica, boa ou qualquer adjetivo que você quiser colocar, desde que bem executada.
Tem regra impedindo isso? Não.
Tem regra falando que não pode jogar assim? Não.
Então pode atuar dessa maneira.
Não tem problema algum.