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Existem pessoas que reclamam da vida porque estão passado por sérios problemas. Essas pessoas precisam de toda nossa atenção e caridade. Todo nós ocasionalmente precisamos de ajuda para nos erguer. Faz parte da condição humana.

Porém, há também gente que desenvolve o hábito...
... de reclamar. Aí é outra coisa. São pessoas que não estão realmente tristes, mas que simplesmente gostam de falar mal de tudo. É o tipo de cara que, quando você pergunta do feriado, ele fala que a praia estava cheia demais. Se pergunta das férias, ele reclama do hotel.
Em outras palavras: o "coitadista" não fala de problemas reais e profundos. Ele só gosta de fazer uma pose de quem está em dificuldade.

O pior disso é que quem está realmente depressivo ou em uma crise séria, tem a maior dificuldade de falar dos problemas (o que é importante).
Quem está com um problema real geralmente fica com vergonha do problema, (esconde a depressão, as dívidas, o fim do casamento). Aí os amigos ficam sem saber como ajudar.

O coitadista é o contrário: ele adora ser o centro das atenções e falar dos seus pequenos sofrimentos.
O grande problema do coitadismo é que ele é contagioso. Faz parte da natureza humana ter empatia e tentar ajudar alguém. Porém, quando você está diante de alguém que reclama de tudo, outra coisa é ativada em você. Você pensa "peraí, eu passo por mais dificuldades que esse cara".
Aí você entra em um ciclo de coitadismo também. Ele reclama do hotel que passou as férias, aí você reclama que teve que esperar duas horas para embarcar. E aí começa a competição para ver quem é o maior coitado do mundo.
E isso é péssimo por vários motivos. Em primeiro lugar, porque prende todo mundo em ciclo de superficialidade tornando mais difícil ainda perceber quem está REALMENTE passando por dificuldades e precisando de ajuda.
Em segundo lugar, o coitadismo propaga expectativas falsas. O coitadista acha que ele é o Cara Mais Sacaneado do Mundo -- o que é, no mínimo, estatisticamente improvável. Com um pouquinho de esforço, é fácil encontrar pessoas que tiveram vidas bem mais difíceis que as nossas.
O problema é que somos mau juízes de nós mesmos. Nossa atenção se torna especialmente seletiva quando toca em questões emocionais. Depois que o sujeito começa a reclamar, ele se lembra de todas as sacanagens que sofreu e esquece todas as vantagens que recebeu.
Um forte sinal de coitadismo é quando o cara começa a reclamar de coisas cada vez mais distantes e desconectadas. Quando ele lembra uma chateação no trabalho e começa a reclamar que o pai esqueceu de lhe dar um presente em 1982. É uma espécie de "loop reclamatório".
E é difícil tirar o outro do loop sem se contagiar. Se você tenta mostrar o lado, o cara te acusa: "você está dizendo isso porque não passou pelo que eu passei". Aí você é tentado a entrar no coitadismo também: "ah é? pois saiba que em 1995, aconteceu isso e aquilo comigo".
Se for dentro da família, o coitadismo se torna dez vezes mais perigoso, pois é fácil passar para a acusação direta: "ah, você acha que isso é pesado? Pesado foi quando você fez isso e aquilo....", aí a coisa desanda de vez.
Hoje eu vejo que o Dia de Ação de Graças e a ideia de "contar suas bençãos" são importantes mecanismos profiláticos para conter a difusão do coitadismo. Nós realmente precisamos disso. Precisamos dedicar um momento para contar todas as coisas boas que aconteceram conosco...
... especialmente as quais nós não tivemos nenhum controle. Isso força a gente a ver o outro lado da balança: nem tudo que aconteceu com a gente foi ruim. Tem muita coisa que caiu de mão beijada no nosso colo.
Talvez o pior efeito do coitadismo é alimentar uma mentalidade destrutiva. O sujeito passa a imaginar que sua vida seria maravilhosa se um força externa não o tivesse sacaneado. Mas a vida é mais complicada do que isso.
Em primeiro lugar, as forças externas vão nas duas direções: elas nos ajudam e nos prejudicam. Algumas pessoas têm mais azar que a média, mas ninguém andam só com vento favorável. Todo mundo tem seus revezes. E alguns têm bem mais que a gente.
Em segundo lugar, e talvez principalmente, não adianta se concentrar no que está fora da gente. É simplesmente perda de tempo. A gente não escolhe nosso contexto. Só podemos decidir como reagir ao contexto. Em vez de reclamar do que aconteceu, a única coisa produtiva é...
... tentar pensar o que EU posso fazer para melhorar a situação.

E a melhor parte é a seguinte: só de você se concentrar no futuro, perseguindo um belo ideal, você vai ficar feliz AGORA MESMO. A felicidade humana depende muito mais de ter um projeto do que do seu contexto.
E o contrário também é verdade: revirar o passado só provoca tristeza e ressentimento. Tenho certeza que agora mesmo tem vários milionários em mansões discutindo quem teve a infância mais sofrida. E, quanto mais remexem no passado, mais vão ficando com raiva, inveja, etc.
Resumo da história: não adianta reclamar da vida. Eu tenho ativamente tentado criar estratégias para romper os ciclos de coitadismo que surgem ao meu redor. Tento puxar a coisa para o futuro, para a responsabilidade pessoal e, se não der, simplesmente me afasto.
É claro que, se a pessoa está reclamando por motivos reais (o que inclui depressão, que é um problema MUITO real, apesar da nossa cultura ainda não aceitar isso bem), aí a coisa é diferente. O certo é se aproximar e oferecer apoio. Servir ao próximo é o mais belo ideal de vida.
No fim das contas, estou cada mais "logoterapeutíco". A receita da felicidade é aceitar o que aconteceu e pensar no que podemos fazer daqui para diante. E o segredo é se cercar de gente que entendeu isso.
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