Quem me conhece há mais tempo sabe que eu tenho horror a dizer “tia do café” ou “tia da limpeza”. Reparem que tia é sempre uma expressão de condescendência, utilizada para profissões consideradas inferiores e geralmente ocupadas por mulheres pobres e negras.⠀
Paulo Freire não curtia o uso de tia no lugar de professora, a ponto de escrever o livro “Professora Sim, Tia Não: Cartas a Quem Ousa Ensinar”. O livro foi escrito em uma fase da vida do autor em que ele havia sido Secretário de Educação do município de São Paulo em uma gestão
petista, de uma mulher nordestina, Luiza Erundina e resolve refletir sobre o papel do educador, sobretudo da professorA (a questão de gênero é abordada no livro) no exercício de construção de uma cidadania coletiva. ⠀
Entre muitas considerações importantes, Paulo Freire diz que professoras são aquelas que mediam o conhecimento, formam cidadãos e reivindicam direitos. Tias não reivindicam direitos.
Tias são entidades complacentes que existem para acomodar as vontades não de um aluno cidadão, mas de um aluno consumidor.⠀
Eu acrescento: tias são sempre as professoras do ensino fundamental, nunca as do ensino superior. Assim como a faxineira é a tia da limpeza, mas a juíza nunca é a tia do Fórum e a médica nunca é a tia do hospital.
É que o tratamento só cabe àquelas que recebem os piores salários e são vistas pela sociedade de forma mais subalterna. No caso de educadoras, são aquelas que estão em sala de aula para submeter-se e servir.
Por isso hoje, em um tempo no qual a educação encontra-se tão ameaçada, é necessário proteger e celebrar os profissionais que carregam em suas funções o maior potencial revolucionário: o de formar cidadãos. Feliz dia do professor e da professora (e não do tio ou da tia).
Texto de Erica Prado
