A expectativa não foi exatamente cumprida de imediato. Rogério perdeu três clássicos em quatro meses com o Fortaleza, sendo dois deles na final do Cearense de 2018.
A torcida pediu a imediata demissão de Rogério, chamado de estagiário e inexperiente.
A pressão foi tão grande que o presidente teve que convocar coletiva. Olha o que ele falou 👇
"Não podemos nos deixar ser influenciados pela corneta momentânea. Mudança de técnico representa quebra de planejamento. É começar o trabalho do zero. Não é isso que a boa gestão pede."
O que aconteceu depois foi que o Fortaleza disparou na Série B, conseguiu 9 jogos de invencibilidade e Rogério conseguiu implementar suas ideias de futebol, que ele disse hoje serem ofensivas como o torcedor quer.
O Rogério é bom sim. Mas ele teve tempo no Fortaleza.
Ele teve tempo para implementar um jeito de atacar bem posicional (que não tem nada a ver com Jogo de Posição) e que pregava bastante paciência.
Toca dali, toca daqui...chega no lateral aberto, e se não tem espaço, volta a bola até o meia entre as linhas se movimentar.
O Fortaleza de Rogério era um 4-2-3-1 que sempre fazia esse 3-4-3 com a bola.
A ideia era ter os lados e três jogadores pra ir circulando a bola e esperar Gustagol prender a defesa e abrir espaços para Marcinho e Dodô.
Aliás, o pivô de Gustgol era tão importante que o sistema ofensivo se baseava muito nesse momento.
O time direcionava muito jogo por dentro e controlava o tempo: ele recebia, prendia no pivô e ao menos dois corriam nos espaços nas costas dos defensores. Era até pragmático.
Agora é que vem o xis da questão...
Essa ideia aí é bem parecida (não é igual, é parecido) com o que Domenèc fazia no Flamengo, com Michael e Bruno Henrique abertos para abrir espaço. Com a titularidade de Pedro, até o pivô foi usado mais vezes. globoesporte.globo.com/blogs/painel-t…
Essa ideia também era vista no São Paulo do Rogério. Lá ele variava mais de sistema, mas a lógica era a mesma.
Ceni gosta muito de uma certa liberdade de movimentação para os dois volantes, que buscam a bola no pé e vão conduzindo de um setor a outro.
Ele fazia muito isso no São Paulo: três zagueiros alinhados, laterais abertos e pontas e atacantes por dentro. Cícero e Schmidt não seguiam essa simetria e vinham buscar a bola, conduziam, tocavam curto...eles ligavam os setores. Davam ritmo e esperavam a aproximação de alguém.
Até a lógica de esperar um jogador ter a bola para que outros dois ataquem espaço era frequente.
Nos seis jogos que vi da carreira de Rogério pra fazer esse texto, isso se repetiu O TEMPO TODO. No Fortaleza, São Paulo e até no Cruzeiro!
Na sequência do lance, acontece o mesmo que rolava com o Gustagol: quem recebe a bola tem que girar, virar pro lado contrário ao do corpo dos adversários e quem está na frente tem que correr em diagonal pra receber o passe.
Toca até encontrar quem gira e corre pro gol!
Isso implica em papéis claros:
- Zagueiros precisam ter bom passe
- Volantes tem que ter boa condução, bom giro e visão de jogo
- E os atacantes têm que saber esperar a bola, jogar mais de costas e saber girar e correr nas costas da defesa.
É o jeito Rogério Ceni de atacar.
Quando as linhas do adversário estão muito baixas, o time (em momento ofensivo) avança e até os zagueiros tinham liberdade pra conduzir, seguindo o padrão de movimento: quem tá mais perto aproxima e recebe a bola. Quem tá mais longe vira o corpo e faz o facão.
Olha aí a MESMA IDEIA DO FORTALEZA E DO SÃO PAULO no Cruzeiro que caiu pra Série B. Robinho como o volante com liberdade de movimentação, Dodô e Edílson dando amplitude, atacantes e centroavante por dentro....a semelhança impressiona. Isso é prova que Rogério sabe o que faz.
Agora é hora de abrir a mente e se questionar.
Se o Rogério tem as mesmas ideias de ataque no Fortaleza, São Paulo e Cruzeiro, então por que ele só deu certo no Fortaleza?
A resposta é muito simples: porque ele teve TEMPO. Treino, jogo, erro, repetição, acerto. Não tem segredo.
A manutenção independente foi tão importante que deu ao Rogério a oportunidade de repensar o próprio modelo de jogo e adequá-lo à realidade do clube.
Em 2019, por exemplo, o Fortaleza mudou um pouco sua maneira de jogar e não era tão propositivo assim.
O time teve dificuldades e passou a jogar com uma linha de defesa muito mais baixa do que na Série B. Apostava na velocidade após retomar a bola, e para isso, Osvaldo foi chamado. Como a maneira de atacar já estava dominada, Rogério evoluiu a equipe com um jogo mais reativo.
Nesse ano, o Fortaleza passou a jogar cada vez mais dessa forma. Linha baixa e montadinha, MUITA bola longa para Osvaldo e Romarinho, Wellington Paulista fazendo pivô e esperando os pontas chegarem. Equipe de muito mais marcação pra quem espera um jogo super ofensivo.
O Fortaleza foi tão reativo que é quem MENOS RECUPERA bolas no campo do adversário nesse Brasileirão. A aposta é totalmente na transição. Há sim a ideia de jogar mais com a bola, mas o time é mais talhado para o contra-ataque.
Sabe qual é o time que mais recupera? O Flamengo.
Rogério só fez isso porque fazia parte de um planejamento. E acho que é possível criticá-lo por abandonar esse planejamento duas vezes. Há duas semanas ele disse que cumpriria o contrato com o Fortaleza e não cumpriu. O Flamengo é gigante, mas palavra é palavra.
Agora, algo que fica claro é que se o Flamengo busca um salvador da pátria, alguém que dá resultado de imediato....não é bem a do Ceni.
Nem vamos falar do Cruzeiro, mas pega o São Paulo. Foram sete meses no comando, e além das saídas no elenco, havia um problema grave: a defesa.
O São Paulo foi vazado 27 vezes em 36 jogos com Ceni no comando. Foram 44 gols tomados, uma média de 1,2 gol por jogo.
Sabe qual é a média do Domènec, dando a relativa comparação? 1,4 gol por jogo.
O Flamengo sabe disso?
O Flamengo sabe que Rogério Ceni teve três pré-temporadas no Fortaleza para pensar no modelo de jogo, no tipo de jogador que casa com sua ideia e teve respaldo no momento em que todos os torcedores xingavam ele?
A diretoria do Flamengo sabia quem era Domènec Torrent quando contratou? Sabia que o NYFC levou 81 gols em 60 jogos?
Sabia que Jogo de Posição era diferente do que JJ fazia, e sabia que a metodologia do Dome implica em melhorar jogadores fazendo eles tomares decisões no jogo e não dar tudo mastigadinho como Jesus, que montou um mini-departamento de futebol, fazia? globoesporte.globo.com/blogs/painel-t…
A resposta dessas perguntas não são exatas.
Assim como não dá pra cravar que Rogério Ceni vai dar certo no Flamengo. Simplesmente não sabemos.
Hoje, apenas hoje, sabemos que ele é um bom técnico, com um bom elenco, com boas estruturas e campeonatos pela frente.
Também sabemos que o calendário tá apertado, o DM tá cheio e Rogério fez um excelente trabalho quando teve respaldo.
Não dá pra saber do futuro...
Mas podemos questionar se Rogério terá o tempo que precisa para implementar as boas ideias que tem num gigante brasileiro
Tudo isso publicado com mais detalhes e análise sobre Rogério Ceni no Flamengo lá na minha coluna no @geglobo!
Hoje é a 1º vez que técnicos portugueses se enfrentam no Brasileirão.
Para muitos é uma prova de como os brasileiros estão defasados...
Não é isso. Ninguém tá olhando para o que importa: educação. Nacionalidade não torna ninguém melhor. Ter lugar pra estudar sim. Fio👇
Você já parou pra entender como um país tão pequeno que é possível percorrê-lo de costa a costa em 4 horas e com pouco mais de R$ 10 milhões de habitantes (menor que São Paulo e Rio de Janeiro) exporta técnicos tão bons ao mundo?
Bom, tudo começa numa viagem em 1935.
Cândido Oliveira, membro da comissão técnica da Seleção na época, queria melhorar o time para classificar os portugueses para a Copa de 1938.
Ele viajou para Londres para um estágio no Arsenal, onde não chegou a trabalhar com Herbert Chapman, mas viu todo seu legado.
A coisa mais difícil que tem é um time executar a estratégia do treinador à risca...
Pois foi exatamente o que o Palmeiras fez hoje.
O time seguiu, do início ao fim, a arapuca que Andrey Lopes pensou para surpreender o Atlético-MG de Sampaoli. Vamos aos detalhes no fio 👇
Andrey Lopes sabia que o Galo ia começar o jogo com uma postura propositiva e com três jogadores na saída de bola.
Quem faz o desenho varia, e muito, mas a estrutura é quase fixa com Sampaoli: três fazem a saída, dois ficam à frente e mais cinco se postam ao ataque.
Mais importante que o desenho é entender o porquê dele. Se pergunte mais o porquê das coisas.
Por que o Sampaoli gosta desse 3-2-5? Simples: ele quer superioridade numérica em duas etapas do jogo: iniciação das jogadas e finalização, como o campinho mostra.
Uma falha infantil do Gustavo Henrique ou uma jogada planejada: como você vê o 2º gol do Inter contra o Flamengo?
Na real, tanto faz. Todo mundo tem uma opinião. Uma verdade interna.
O futebol nos faz crescer como seres humanos quando entendemos e não julgamos. Bora pro fio 👇
O que é errar?
Diz a filosofia que erro é quando o que nós temos de conhecimento sobre algo, seja lá o que for, não reflete a realidade. É um desacordo. Uma inadequação na cabeça.
Então pra entender o erro você precisa, antes de tudo, entender a realidade da outra pessoa.
É aí que complica. É difícil entender a realidade do outro. Exige esforço, desprendimento e leva tempo...não temos como ficar pensando sempre no outro.
É mais fácil julgar. Botar a realidade do outro na nossa perspectiva e dizer se está de acordo (certo) ou desacordo (errado).
Os espanhóis têm uma palavra que resume quando um time joga tão coordenado que fica difícil roubar a bola: automatismo.
Nada mais do que uma repetição. Um hábito.
A derrota do Palmeiras hoje (e outros jogos ruins) podem ser explicados pela falta desses automatismos. Fio 👇
Para entender o que o nome complicado significa, vamos simplificar as coisas: futebol é meio que lógico. Quem ataca quer levar a bola do ponto X até o ponto Y. Quem defende quer evitar que ela chegue até o ponto Y.
Atacar é levar a bola até os melhores setores para criar o gol.
Dá pra conduzir essa bola de muitos jeitos, como drible e passe. Para passar, é preciso que um jogador se desloque do ponto X até o ponto Y e receba a bola naquele setor. Pronto: o time conseguiu andar uns metros à frente
(bem básico, mas o importante é entender a lógica)
A ideia de "marcar" no futebol sempre esteve relacionada à ter jogadores que roubam a bola e são fortes.
Isso vem mudando.
Hoje, marcar é um exercício de tirar espaço do adversário, justamente o que o Flamengo não fez no massacre do Independiente Del Valle.
Segue o fio👇
Dá para tirar espaço de muitas formas: deixando quem está com a bola livre e cercando quem tá ao redor, impedindo que o passe seja feito, ou pressionando ao máximo a bola para roubar e não deixar o time jogar.
O Flamengo optou pelo segundo jeito.
Para ganhar em musculatura, o mecanismo de Dome foi fazer Gérson saltar o tempo todo no zagueiro com a melhor perna e deixar Gabigol, ainda fisicamente abaixo, no volante que fazia a saída de três. O @schmidt_felipe desenhou aqui.
Ano passado, a discussão era se Jorge Jesus tinha acabado com a muleta do rodízio no Brasil.
Esse ano, a discussão é sobre as vantagens do rodízio de Domènec Torrent.
Peraí. Rodízio é bom ou ruim? Ou ele vira bom se ganha e ruim se perde?
Análise não é isso....
O dicionário diz que "análise" é "estudar cada parte de um todo para conhecer melhor sua natureza, relações e causas".
Analisar é separar o todo em várias partes para ver como essas partes se RELACIONAM e produzem o resultado final.
Normalmente, falamos que o RESULTADO FINAL é "bom ou ruim".
Bom ou ruim são juízos de valor. Um julgamento feito com base a partir de percepções individuais e tem como base sua cultura, seus sentimentos, ideologias e história de vida.