Este é um exercício baseado em dados, dados esses disponibilizados pela @DGSaude, até dia 26 de Outubro de 2020.
É uma visão alternativa do que tem sido proposto, do que tem sido feito, e do que tem sido divulgado.
Vale o que vale mas, sendo crítico do que está a ser feito, não poderia deixar de tentar contribuir para uma solução ou, pelo menos, para o início de uma discussão que merece ser feita, na minha opinião.
A 03 de Agosto, a situação não era de milagre no nosso país. Aliás, nunca existiu milagre, como até os próprios defensores do milagre já vieram defender e, na minha opinião, era esta a altura para começarmos a tomar medidas.
Só tendo disponíveis os dados semanais de evolução por concelho, esta foi a evolução desde 03 Agosto de 2020 e até dia 26 de Outubro 2020, para os concelhos com mais de 240 casos por 100k habitantes.
COMEÇAR A PREPARAR EM AGOSTO
A 17 de agosto devia ter sido introduzida a nova metodologia, e focar-se a comunicação no critério da @ECDC_EU : O que define um concelho de risco elevado é o número de novos casos confirmados, por 100.000 habitantes, nos 14 dias anteriores.
Começar a incluir nos relatórios de situação os dados por concelho em valores absolutos, e uma indicação para os concelhos que estavam acima daquele limiar. Em suma: habituar os cidadãos aos critérios e à linguagem usada, sendo transparente na comunicação destes dados.
A 7 de setembro o @govpt deveria ter apresentado ao Presidente da República, um pedido para começar as consultas necessárias para o restabelecimento do Estado de Emergência. Sem medos.
No mesmo dia, deveria ter apresentado publicamente o pacote de medidas que estava a considerar caso fosse necessário impor restrições, conforme a gravidade dos dados por concelho apresentados. Sem receios e com frontalidade, e após consulta com especialistas.
A 17 de setembro, o Conselho de Ministros deveria ter sido totalmente dedicado a finalizar as medidas concretas. No mesmo dia, Marcelo deveria falar ao país, não em formato de entrevista, mas num formato ao nível da importância que o momento tem.
A 18 de setembro, de manhã, @antoniocostapm deveria ter-se dirigido ao país, comunicando quais as medidas acordadas em Conselho de Ministros do dia anterior, sem dar espaço a segundas leituras, e sem uma lista de excepções maior que a lista de medidas.
No mesmo dia, a @DGSaude , na conferência de imprensa de sexta-feira, anunciaria que concelhos iriam ser abrangidos pelas medidas anunciadas de manhã.
Anuncia também que os concelhos abrangidos serão revistos a cada 2 semanas, com atualizações semanais às sextas-feiras da evolução e do impacto das medidas tomadas. A 21 de setembro era este o panorama nacional.
ESTADO DE EMERGÊNCIA
CENÁRIO 1: A 21 de setembro de 2020 entraria em vigor o Estado de Emergência. Medidas em vigor para todos os concelhos com mais de 240 novos casos confirmados por 100.000 habitantes nos 14 dias anteriores:
CENÁRIO 2: A 21 de setembro de 2020 entraria em vigor o Estado de Emergência. Medidas em vigor para todos os concelhos
Medidas adoptadas:
- Recolher obrigatório das 22h às 06h, todos os dias da semana;
- Obrigatoriedade de teletrabalho para todos cujas funções o permitam;
- Controlos de temperatura nas fronteiras aéreas e terrestres;
Medidas adoptadas:
- Obrigatoriedade de teste negativo, efectuado nas últimas 72h, para entrar no país, sem excepções;
- Regime misto de aulas presenciais e online para ensino secundário e universitário;
Medidas adoptadas:
- Suspensão de eventos culturais, desportivos, e políticos;
- Obrigatoriedade do uso de máscara.
Estas medidas são implementadas com o mínimo de excepções possíveis.
A diferença entre cenários pode-se considerar radical. Um com base num critério europeu e aceite, e um que é, acima de tudo, uma mensagem que se envia a todo o país: este é um problema de todos, e todos temos que contribuir para o resolver.
No mesmo dia o @govpt disponibiliza um URL onde todos podem consultar a situação no seu concelho, bem como as medidas de âmbito nacional e local implementadas.
No mesmo dia o Instituto Nacional de Saúde - Dr. Ricardo Jorge - INSA apresenta um relatório, já revisto por entidades independentes, sobre como se propagou o SARS-CoV-2 em Portugal, no segundo trimestre do ano.
O relatório fica disponível no mesmo URL, bem como o dataset utilizado para a elaboração do mesmo em formato aberto e devidamente anonimizado.
Resumindo:
- Conselho de Ministros, à 5ª feira como é normal, para decidir medidas;
- Medidas anunciadas à 6ª feira de manhã;
- Concelhos afectados, anunciados pela DGS, na 6ªfeira à hora do almoço
- Implementação às 2ª feiras
NO FUTURO
Claro que falar agora, é simples. Claro que falar sem ter em conta a parte política de tudo isto, torna tudo mais fácil. Mas a luta contra a pandemia não deveria ser política.
Existir um plano que fosse introduzido com tempo, antecipadamente, iria também limitar uma das críticas que existem neste momento: que houve tempo para preparar tudo para esta segunda vaga, que não foi aproveitado.
Infelizmente, não podemos voltar atrás. O que está feito, está feito e apenas podemos olhar para o que se pode fazer, daqui para a frente.
Nessa matéria penso que todos teríamos a ganhar se:
- Os períodos de entrada e saída dos concelhos de risco elevado fosse feita ao início da semana, e não como foi feito pelo @govpt que tirou 7 concelhos da lista a uma 6ª feira, para adicionar 77 concelhos na 2ª feira seguinte
- Que novas decisões de medidas restritivas fossem decididas à 5ª feira, anunciadas 6ª feira de manhã, e os concelhos afectados anunciados pela @DGSaude na CI;
- a introdução urgente de concelhos na lista - devido a um surto na comunidade de grande dimensão - fosse feita a qualquer altura, por parte da DGS, mas que apenas saísse da lista de risco elevado na data efectivamente programada para todos os concelhos.
Sim, poderia acontecer que um concelho em vez de 15 dias ficasse 19 dias com restrições, mas seria preferível assim.
- Disponibilização diária dos dados por concelho;
- Um único URL com um mapa pesquisável, com todos os dados disponíveis por concelho, com as medidas em vigor
Por medidas em vigor entenda-se as medidas de âmbito nacional e local, outras informações com relevância para a população, e secção de FAQ com perguntas reais e respostas claras.
- Relatório semanal sobre a evolução em todos os concelhos, identificando os casos onde as medidas de âmbito nacional e local estão a surtir mais efeito, para aprendizagem comum (best practices) da responsabilidade da DGS/INSA;
- Parar com a prática de privilegiar alguns OCS em detrimento de outros, na divulgação de dados. Esta é uma prática que apenas cria ruído e teorias da conspiração, pelo simples facto de que existe;
- Tentar, na medida do possível, ser consistente no horário a que a informação diária é divulgada;
- Obrigatoriedade do uso de máscara na via pública. Este hábito tem que ser criado, e não é com excepções que o vamos criar
CONCLUSÕES
Nos últimos tempos, tem-se falado e escrito muito sobre a comunicação, os erros nessa comunicação, e sobre os comentários feitos por Graça Freitas e Marta Temido.
Não consigo imaginar a pressão, e o cansaço, que estas duas pessoas sentem, mas mesmo por isso é importante esclarecer que se é o trabalho da DGS combater a pandemia, o nosso papel, enquanto sociedade, civil é tentar ajudar o melhor que sabemos.
Isso passa, obrigatoriamente, por cumprir as regras escrupulosamente, sem qualquer margem para errar. Mas podemos fazer muito mais. Sei que quando somos atacados o nosso primeiro instinto é nos virarmos para dentro, e cerrar fileiras
Se muitos apenas criticam por criticar, ou por motivos políticos, há muitos que fazem crítica sustentada e podem ajudar a encontrar soluções, e a minimizar problemas.
Não se espera, neste momento, de uma Direcção Geral de Saúde que seja perita em qualquer outra área que não o combate à pandemia.
Mas o que se espera é que não feche as portas a todos os que podem, e querem, ajudar nas outras componentes que também são necessárias e úteis à melhor resolução desta situação
Ontem, escrevi um par de tweets, irritado, sobre o que me parece ser uma narrativa de endeusamento de um jovem militante do partido do Voldemort do Algueirão. Vou abrir uma pequena thread sobre este assunto, agora com mais calma.
Nas respostas aos tweets, algumas pessoas vieram-me dizer que a manifestação do pessoal da restauração, e a organizada pelo jovem, era manifestações distintas. Andei à procura de informação que me esclarecesse isto, mas não encontrei.
Mesmo assim, dou o benefício da dúvida a quem me disse isso, e sou "forçado" a estabelecer dois cenários para o que aconteceu ontem:
Cenário 1: O que ontem, irado, escrevi (com um erro de português que ainda me está a assombrar - obrigado @iAModp ;)
Acabei agora de ler o artigo do @danielolivalx hoje no @expresso, com o título "No desespero, decide-se bem com boa informação".
Em comum, com o que é escrito pelo @danielolivalx, tenho a preocupação de se estarem a tomar decisões assentes em dados que não são granulares o suficiente para se tirarem conclusões. Como eu, e muitos outros já referimos, juntar coabitantes e familiares na mesma fatia, é errado
Também carecem de validação os outros principais factores de contágio, que foram mudados no espaço de três dias, sem que ninguém tenha questionado as entidades competentes sobre essa mudança:
Será verdade que a @DGSaude pediu para as pessoas fecharem os vidros dos carros na A28?
Vou deixar aqui umas pistas:
1. A imagem não foi manipulada. Foi transmitida hoje no jornal da tarde da @SIConline, e a pessoa que está na imagem é a Teresa Leão
2. Esta investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, diz enquanto enumera conselhos práticos que "circular de janelas fechadas pode ser uma boa alternativa também"
O que acontece quando não existem dados públicos, é que cada OCS escreve o que quer, baseado no que quiser, e não há hipótese de contraditório.
Isto quer dizer que, neste momento, a @DGSaude é uma enabler de notícias falsas, por pura falta de transparência.
Com vários OCS, locais e regionais, a avançarem com números que ninguém sabe de onde vêm, estão a colocar várias populações em níveis de ansiedade evitáveis.
Esperar "pelo momento certo" soa a estratégia política, não a ciência ou saúde pública.
Esta "estratégia" (estou a ser simpático) de guardar dados, de não os divulgar, de não ser transparente, vai trazer muitos maus resultados. Ninguém vai compreender que a uma 2ª feira sejam 121 concelhos, e a uma 6ª passem a 280. É assim que se perde credibilidade.
Hoje de manhã já confessei à @Idzabela, ao @tomahock, e ao @camandro que até eu próprio estou farto de me ler a escrever sobre os dados que (não) temos sobre a #COVID19PT em Portugal. Mas por mais farto que esteja, e que alguns (muitos?) de vocês estejam, abro uma thread:
O primeiro relatório de situação, com a confirmação de casos em Portugal, foi divulgado no dia 03 de Março de 2020.
A 24 de Março, os relatórios diários passaram a incorporar os os novos casos por concelho, que são divulgados diariamente.