Apresentou sintomas de gripe/resfriado? Entre em isolamento imediatamente por 10 dias. Pessoas que residam no mesmo domicílio e todos os seus contatos próximos dos 3 dias anteriores devem ficar em quarentena por 14 dias. Isso é o crucial para conter a pandemia. Testes? Talvez.
9 meses de pandemia e ainda não temos uma política definida de combate ao COVID. As recomendações oficiais do Ministério da Saúde são 6 pontos, que na verdade podem ser resumidas em apenas um: “busque atendimento médico”. E esse único ponto… é incorreto.
Os primeiros dias de sintomas são justamente quando o paciente apresenta a maior quantidade de vírus “vivo” em suas vias aéreas, e portanto o maior risco de transmissão a outros. Quanto mais tempo decorre desde os primeiros sintomas, menor a chance de transmissão.
Os primeiros sintomas são também o período de menor risco de complicações. Os sintomas graves da COVID19 ocorrem em ~10% dos pacientes, e tendem a acontecer na segunda semana após o início dos sintomas, coincidentemente quando o risco de transmissão é menor.
Portanto só faria sentido recomendar a população buscar atendimento médico aos primeiros sintomas caso houvesse algum tipo de intervenção ou tratamento que reduzisse a chance de desenvolver a forma grave da doença. Infelizmente, não há. Se houvesse, o mundo seria um lugar melhor.
O único benefício em se sair de casa nos primeiros dias de sintomas é para se realizar a coleta amostra nasal para RT-PCR. Quanto mais dias decorrem desde o início dos sintomas até a coleta do exame, MENOR a chance do teste ser positivo.
Mas mesmo no melhor cenário possível, o teste RT-PCR gera pelo menos 30% de falso negativos. E eu suspeito que no Brasil, em média, a taxa de falso negativos seja bem maior que isso. E os testes rápidos de anticorpos ou antígenos conseguem ser ainda piores nessa fase da doença.
Nessa fase, resultado positivo é confirmatório: é COVID19.
Resultado negativo, no entanto, não é informativo: pode ser COVID19.
Pessoas sintomáticas com resultados negativos *NÃO* devem sair do isolamento. O mesmo se aplica a seus contatos domiciliares em quarentena.
Qual é então o benefício em se testar? O benefício é indireto. Os testes são importantes para as autoridades sanitárias: acompanhar a evolução da epidemia e fazer o rastreio de contatos de todos os resultados positivos e quarentena dos contatos próximos identificados.
O seu resultado positivo não muda nada para você, mas é importante para evitar novas contaminações na sua região. Aquela pessoa que você deu carona 3 dias atrás seria contactada e entraria em quarentena por 14 dias, quebrando uma potencial cadeia de transmissão.
Infelizmente as autoridades sanitárias brasileiras não estão fazendo esse rastreamento. E nem conseguiriam caso tentassem: é impossível com dezenas de milhares de novos casos confirmados por dia. Seriam centenas de milhares de contatos.
Ou seja, o único benefício em se realizar “testes testes testes” é perdido quando as autoridades não usam esse número em nada mais que um placar da vida. Os casos mais graves serão hospitalizados com ou sem teste, e serão tratados como COVID19 mesmo que o resultado seja negativo.
Quando não há benefício, tudo o o que sobra é risco. E nesse caso o risco é enorme. Dezenas de milhares de pessoas sintomáticas saindo de suas casas no período de maior infectividade para aglomerar em UBS/UPAs/PA/consultórios e conseguir uma requisição médica para um exame.
Sem falar nos altíssimos custos ao sistema público e privado de saúde em usar EPIs para encontros médicos desnecessários. E esses preciosos testes, extremamente escassos em um país pobre como o Brasil, geram resultados que são ignorados pelas autoridades.
O tweet da @luizacaires3 me chamou a atenção pelo número de comentários de pessoas dizendo que estão pagando do próprio bolso para realizar os testes. Isso é um absurdo. E também é um absurdo que seja necessário uma requisição médica para a coleta.
O benefício coletivo dos testes só existe caso sejam acessíveis facilmente por grande parte da população, e não aumentem paradoxalmente o risco de transmissão ao se indicar que pessoas sintomáticas saiam de suas casas no período de maior infectividade.
Importante citar que máscaras não *impedem* a transmissão, apenas reduzem o risco. Pessoas sintomáticas devem ficar em casa, e não confiar que sua máscara de tricot ou sua queixeira de plástico (!) irá impedir a contaminação do motorista do Uber ou da atendente da farmácia.
Uns podem dizer que uma razão para testar é devido a solicitação de empresas para afastamento durante auto-isolamento. Incorreto, pois se a empresa negar afastamento dos resultados negativos, 3 em cada 10 infectados voltarão ao trabalho para infectar a chefia.
Para resumir, caso apresente *algum* desses sintomas:
➡️ Febre
➡️ Tosse
➡️ Perda do olfato ou paladar
🏡 Fique em Casa
📞 Solicite ajuda de amigos para compras/remédios
📞 Busque orientação da SMS ou Plano de Saúde sobre agendamento de testes
📞 Informe seu empregador
Adendo: várias críticas (válidas) dizem que as recomendações do fio não são praticáveis no Brasil. Infelizmente o vírus não dá a mínima para a política ou para as regras trabalhistas brasileiras. O que escrevi é sabido desde Março, e aplicado por diversos países. ….
Acho que muitos se ofendem, ou se sentem culpados, em não poder seguir as recomendações que escrevi. O objetivo não é fazer ninguém se sentir mal, e sim informar quais medidas internacionalmente reconhecidas são necessárias para reduzir a transmissão do vírus na sociedade.
Brasileiro está tão acostumado a estar “sozinho” no mundo, que acha que precisa resolver todos os problemas da sociedade individualmente. Nesse caso é impossível, e pra isso existe governo, pra isso existe congresso e pra isso existe o judiciário. Precisamos saber o que cobrar.
Para um compilado de perguntas e respostas sobre COVID19:
Tutorial de como quebrar o protocolo de um clinical trial. A razão do estudo ser cego é justamente para que não existam diferenças comportamentais entre os dois grupos. gauchazh.clicrbs.com.br/geral/noticia/…
Se participantes descobrirem que de fato receberam a vacina, podem se sentir “mais tranquilos”, tomar menos cuidados e acabar se expondo mais... e se infectar mais, já que vacinas não são 100% protetoras.
Isso diminuiria a diferença entre o grupo intervenção e grupo controle, podendo até mesmo levar a conclusão de que a vacina não funciona, mesmo tendo funcionado.
Relato de caso interessantíssimo publicado ontem: paciente americano imunocomprometido apresentou COVID19 e manifestou 3 recorrências sintomáticas comprovadas, com partículas virais intactas (“vírus vivo”) até quase 5 meses após a infecção inicial.
Esse não é um caso típico e não deve ser interpretado como tal. Paciente com doença autoimune grave diagnosticada 22 anos antes, em tratamento crônico com múltiplos imunosupressores, anticorpos monoclonais, corticóides e anticoagulantes.
Em suas várias reinfecções, recebeu Remdesivir, Regeneron, Hidroxicloroquina e altas doses de corticóides. Apesar de efetivos em reduzir a carga viral, não impediram as recorrências.
Sugestão de pauta para os amigos jornalistas: acurácia de oxímetros portáteis vendidos no Brasil. Colegas médicos, notaram alguma mudança na qualidade das leituras dos oxímetros recentemente?
A saturação de oxigênio mostrada é resultado de um algoritmo matemático que requer a correta aferição da frequência cardíaca. Se a FC estiver incorreta ou for instável (ex: arritmia) no aparelho, a saturação calculada será também incorreta.
Profissionais de saúde entendem essa e outras limitações (esmalte de unha, temperatura da mão, movimento, tensão no pulso, etc) e acabam fazendo alguns ajustes até conseguir uma medição que julguem adequada.
Um cidadão comum, chamado Jair, que manifesta sintomas e é confirmado com COVID19 tem 80% chance de apresentar uma gripinha, e 98% de chance de sobreviver. Mas ele vai dar crédito ao tratamento milagroso que recebeu. Por isso fiz uns cálculos aqui. Segue o fio.
Primeiro dia da reabertura de bares e restaurantes ontem no 🇬🇧. Após quase 4 meses isolado, decidi tomar café da manhã em um restaurante em Londres para ver como seria a experiência de comer fora de casa pela primeira vez em tanto tempo.
Primeira coisa foi a obrigatoriedade de passar álcool gel na mão de todos que entram. E a restrição no número de pessoas dentro do estabelecimento. Até aí tudo bem. Mas nenhuma fila, o que nos surpreendeu.
Poucas mesas e bastante espaço entre elas. Detalhe que esse é um restaurante que era sempre lotadíssimo nos sábados de manhã em Notting Hill.
Estudo publicado hoje na Nature Medicine mostra que 60% dos pacientes verdadeiramente assintomáticos mas infectados pelo SARS-CoV-2 possuem lesões pulmonares identificáveis na tomografia. (N=37)
Além disso, os pacientes assintomáticos eliminam resíduos virais por mais tempo que os sintomáticos [leves]. Mas isso *não* quer dizer que sejam infecciosos por mais tempo (provavelmente não), embora mais estudos sejam necessários.
Pacientes assintomáticos tem títulos (quantidade) de anticorpos detectáveis em geral menores do que os sintomáticos.