É parte do projeto desmobilizatório o contato frequente com a morte para a naturalização da mesma.
Eu cresci em uma comunidade onde parte significativa dos garotos que jogaram bola comigo, morreram em esquinas próximas à minha casa. Lá ficavam, e todos nós víamos.
A primeira vez é traumatizante, a segunda também, a terceira nem tanto, até acostumar. Não com a morte, mas com a tristeza, a frequência.
Eu vi primo, tio, amigo, colega, vizinho, todos morrendo nesse projeto que na prática não faz nada além de tirar vidas. Inclusive inocentes...
Esse povo que sofre com a morte, é o povo que não tem tempo pra pensar sobre ela. Precisa sobreviver, e sobrevive no limite. Jornadas imensas de trabalho, salários mínimos, às vezes menos que o mínimo.
É preciso comer. Há bocas para alimentar. Como processar os traumas?
Há de se conviver com o fato de ser o alvo. RG na carteira. Nota fiscal do celular no bolso. Nada é seu se não for provado. Você é preto! Você não pode ter. Você não pode ser.
Nos jornais, os brancos nos escrevem. Na TV, os Brancos nos falam. Nos jornais, os pretos estão banhados de sangue. Na TV, os pretos são satirizados.
Como sonhar? idealizar?
Resta sobreviver: trabalhar, comer, pagar, levantar as mãos, apanhar, abaixar a cabeça, trabalhar, comer.
Não é apatia, é sobrevivência. Ainda assim, a favela grita. Por vezes, só. Por vezes, escancarando que até os que se dizem aliados, no fim, sentem menos as vidas negras do que os ônibus queimados.
A fumaça chama a polícia. A polícia traz a bala. A bala traz silêncio.
Não é apatia, é sobrevivência. A favela é o retrato do apartheid brasileiro. Não existe Estado ali. Prefeito, governador e presidente são como personagens de um contos mitológicos que muita gente jura ser real, mas no fim é só um conto.
Portanto, você que é cidadão brasileiro. Aquele cidadão cuja independência do Brasil se propôs a representar, você que poderia botar fogo no Brasil, já que estamos falando de medidas imediatas. Você pode parar sua cara no cano do fuzil da guarda nacional e falar bonito. Nós não.
Organização política, mobilização por um poder popular e de combate aos mecanismos que protegem e perpetuam as violências que se mantém desde a escravidão...
assim como a luta contra a perpetuação do ódio de raça e classe, que por séculos possibilita um homem negro ser morto na porrada na frente das câmeras, poucos meses depois de uma criança negra ser morta em casa. Não, nem todo Seu José tem condição de encarar isso de frente.
O morro luta! A arte negra denuncia no samba, no funk, no rap, no grafite, nas vestes, nos cabelos, nos esportes. A luta tá lá, a denúncia tá lá. A sobrevivência tá lá.
Não despreze o povo que foi escravizado por mais de 300 anos, jogado à própria sorte, e até hoje é colocado pra escanteio. Entre descaso, assassinato e preconceito, o povo negro tá lutando.
Aqui não é Estados Unidos. Aqui é Brasil.
E o Brasil odeia quem é a sua maioria.
Quanto a mim, os meus e os nossos negros e negras, continuamos.
Com um alvo na testa e ainda assim sorrindo, cantando, com medo e coragem, fazendo arte, ganhando menos e fazendo muito mais.
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No país que não há racismo e estão tentando o importar pra cá, completam-se hoje 110 anos da Revolta da Chibata.
Marinheiros negros tomam o controle dos mais poderosos navios da marinha e apontam os canhões para a capital do Brasil (Rio) após um marinheiro sofrer 250 chibatadas.
A marinha brasileira, relegada ao abandono após a Guerra do Paraguai, se vê em meio a um Brasil explodindo em revoltas nos primeiros anos da república, desfalcando cada vez mais as forças armadas. Dessa forma, negros e pobres são cada vez mais recrutados para a marinha.
Repleta de marujos negros, a marinha parecia não ter se tocado que a escravidão foi findada 22 anos antes, e importou para si não só tratamento, como condições de trabalho e também castigo semelhantes ao modelo escravista.
Eu queria poder, no #DiadaConscienciaNegra , falar sobre nós. Sobre cultura, arte, poder e legado, e a eternização da nossa história por nós, que sofremos com uma historiografia embranquecida que fez de tudo pra nos apagar.
Mas somos atravessados por Carrefour e mais uma morte.
20 de Novembro deveria ser uma data para exaltar e relembrar Zumbi. Sua figura representando a luta, a resistência e estratégia de todo um povo que foi violentado e escravizado.
Mas, atravessados por mais um assassinato, Não foge à mente como Zumbi foi brutalmente assassinado.
Queria poder falar do samba, da sua identidade, ligação com o morro e seu poder formador da cultura brasileira.
Mas não temos esse direito no dia 20. Somos obrigados a lembrar que o samba denunciou violências, assassinatos e abandono do estado nos morros. Foi a nossa voz.
O @pretozeze falou no Roda Viva algo que penso há tempos e me chamou atenção: a falta de análise que gera a fala preconceituosa sobre o voto do povo carioca.
A atuação nas urnas do carioca do subúrbio, da favela, muitas vezes não se trata nem de voto, mas de pequenas conquistas.
O @pretozeze falou coerentemente sobre a atuação e influência de grupos armados.
A presença de tráfico e milícia é sintoma da ausência do estado. E a ausência é total. Presença física, serviços, estrutura.
A mudança de representação no Estado para muitas pessoas nada significa.
Para quem não tem saneamento básico decente e só tem serviços básicos precários (quando não negados), pouco importa o prefeito. Às vezes, importa um pouco, o vereador.
O cara da comunidade que vai botar um poste, fechar um esgoto, inaugurar um campinho de futebol com churrasco...
O Agente Laranja, usado pelos EUA, foi a arma de mais um dos vários crimes cometidos no Vietnã, o ambiental, até hoje causando impactos na natureza e na vida das pessoas.
Crimes contra a humanidade, contra a natureza e Guerra do Vietnã nessa thread com algumas imagens fortes:🧵
O Vietnã, dividido entre norte (Hanói) e sul (Saigon), tem a interferência dos EUA em seu processo de independência após os "Viet Minh", liderados por Ho Chi Minh, vencerem a França e os expulsarem do país.
Os EUA interferem patrocinando, treinando e enviando soldados para fortalecer Saigon.
O objetivo é anticomunista: derrotar Hanói, Ho Chi Minh e os Vietcongs (anteriormente Viet Minh)
Goste ou não, o capitalismo na América Latina sempre esteve debaixo do arbítrio do imperialismo, e não se fala em democracia quando o liberalismo ensina a jogar pessoas pretas dentro da prisão para serem mãos de obra de empresas que lucram com o encarceramento.
Quando países da América Latina demonstram qualquer sinal de "ameaça" aos interesses do imperialismo, o que ocorre? Intervenção!
Brasil (1964), Chile (1973), Uruguai (1974) e Argentina (1976) são exemplos.
Achar que vive em um Estado capitalista independente é ingenuidade.
Sim, os EUA de Lyndon B. Johnson têm papel preponderante no golpe de 64.
Um ou dois discursos de Jango favoráveis a uma reforma agrária vira ~ameaça comunista~ e dá em golpe que culmina em duas décadas de autoritarismo, tortura e assassinatos.
Liberalismo não é assassino, sei...
Por que antagonizar Martin Luther King e Malcolm X é perpetuar uma prática racista?
A suposta influência de ambos em X-Men, posteriormente atribuída à relação entre T'Challa e Killmonger em Pantera Negra faz sentido?
Minha ideia sobre isso aqui 👇🏿👇🏿
O maior inimigo do racismo é a organização do povo negro. Tanto no Brasil, como nos EUA, a história mostra o poder de mudança e combate do povo negro quando conscientizados e mobilizados.
O modus operandi racista visa antagonizar e dividir, para que enfraqueça assim a nossa luta
Durante séculos de luta contra a escravização no Brasil, nomes como Ganga Zumba e Zumbi dos Palmares tornam-se símbolos de orgulho, resistência e esperança para o povo negro.