Frequentemente, pegamo-nos desprevenidos quando lemos "variante nova do SARS-CoV-2", "mutação encontrada em tal local", e imediatamente nos preocupamos com as implicações disso. Nesse fio, quero te dar uma perspectiva dentro da virologia sobre isso, trazendo essas notícias
Bora?
Tão simples e tão impactantes, seja de forma positiva, seja de forma negativa. Estão presentes muitos anos antes de o primeiro da nossa espécie conhecer este planeta. São seres vivos? Qual sua relevância?
Só causam doenças ou também podem propiciar adaptações interessantes para as espécies em que se hospedam? ? Essas são algumas das perguntas direcionadas aos vírus, os quais, independente do debate, despertam muitas curiosidades e são alvos de investigações há décadas.
Os vírus são constituídos de uma estrutura básica: o seu ácido nucleico, que concentra todas as informações necessárias para construí-lo e fazê-lo funcionar, bem como uma porção que envolve e protege esse material genético, chamado de capsídeo.
O conjunto deles é chamado de nucleocapsídeo. No entanto, vírus que infectam animais podem apresentar uma outra camada que é constituída de moléculas de gordura (os fosfolipídeos), chamada de envelope.
Dessa forma, podemos dividir os vírus em envelopados (com a presença do envelope) ou vírus nus (sem envelope, apenas com o nucleocapsídeo)
Recentemente, escrevemos um texto comentando sobre a importância dos vírus na evolução das espécies. Muito dessa importância se dá pela capacidade que os vírus têm de introduzir seu material genético no genoma (material genético) do hospedeiro.
Essa característica permite que o vírus faça a célula trabalhar para ele, produzindo moléculas necessárias para ele, seja para construir novos vírus, seja para alguma ação dentro da própria célula.
Normalmente, quando ouvimos essa afirmação, pensamos imediatamente que isso trará malefícios para nós - e, de fato, muitas vezes traz
No entanto, benefícios relevantíssimos já foram documentados relacionando com alguns vírus, como é o caso da sincitina, uma molécula biológica relacionada com um papel auxiliar de impedimento do sistema imunológico da mãe em atacar o feto em formação.
Então, a primeira coisa que precisamos registrar é: os vírus têm capacidade de integrar seu material no nosso genoma e isso pode ter consequências positivas ou negativas. Mas como isso é passado de uma geração a outra?
Se essa integração ocorrer nos gametas, ou seja, em células como espermatozoides e ovócitos, essa informação pode ser passada para a próxima geração
Um artigo publicado no repositório de pré-impressões (preprints) bioRxiv levanta a hipótese de que o SARS-CoV-2 pode utilizar de uma enzima que faz um DNA a partir do seu RNA viral (a transcriptase reversa) para inseri-lo no nosso material genético
O estudo utilizou dados publicados de células infectadas com o vírus e com células de pacientes que tiveram COVID-19 para embasar a hipótese.
Nestes estudos, os pesquisadores encontraram RNA “quiméricos”, ou seja, que tinham as informações do vírus e algumas informações da própria célula, o que poderia indicar uma integração entre o material genético da célula e do vírus.
Outros estudos apontados pelo artigo mostram que o próprio SARS-CoV-2 poderia induzir a presença da transcriptase reversa dentro da célula, para fazer esse trabalho.
Dessa forma, a partir dessas hipóteses, o artigo sugere que isso pode estar por trás de certas pessoas manterem uma positividade para o teste a RT-qPCR (ou teste molecular da COVID-19), ainda que tenham se recuperado.
Naturalmente, o estudo é muito preliminar (os dados encontrados são somente em células), mas utiliza de um mecanismo conhecido de retrovírus (vírus de RNA, como o SARS-CoV-2) e necessita de maior investigação.
Outra característica marcante dos vírus são as mutações e adaptações que podem sofrer, gerando versões diferentes do mesmo vírus. Elas podem acontecer de forma espontânea ou induzida e quando acontecem, nos referimos a uma nova variante viral.
A própria interação entre vírus e vírus, ou vírus e células pode induzir essas modificações. Quando reunimos um conjunto de vírus que apresentam essa mesma variação, chamamos de cepa viral.
Essas variações podem ser vistas em pequenas diferenças na sequência do material genético ou ainda diferenças nas propriedades funcionais e estruturais.
Essas mutações podem ter efeito prejudicial para o vírus ou não. Já ouvimos falar de variantes do SARS-CoV-2 anteriormente, e, recentemente, mais uma foi descoberta no Reino Unido.
Chama a atenção o fato de que os níveis da variante são mais altos em locais em que há mais casos. Ao que sabemos, não há indicações de que essa variante nova seja capaz de ser mais transmitida, +
causar sintomas mais graves ou até mesmo ficar fora da proteção trazida pelas vacinas em desenvolvimento para COVID-19. Neste último caso, existem fortes indicativos que as vacinas da COVID-19 são capazes de reconhecer variantes do SARS-CoV-2, +
por serem desenhadas para instruir nossas células a reconhecer uma porção do vírus que vem apresentando pouca mutação em diferentes cepas.
E, ainda que em algum momento alguma variante muito diferente surja, a atualização, principalmente das vacinas de RNA, é algo muito factível, dado que necessita atualizar a fita de RNA com a nova variação e dar sequência a produção do imunizante.
Por fim, é necessário aumentar nossa compreensão e vigilância de novas variantes, para tentarmos estar no “mesmo passo” em que esses eventos acontecem.
Recentemente, um modelo animal foi proposto em um artigo publicado na revista Science, em que, após a passagem de amostras de SARS-CoV-2 vindas de humanos para camundongos, o vírus se adaptou neste novo hospedeiro,
gerando um painel de mutações adaptativas, especialmente a troca de um aminoácido no domínio de ligação ao receptor (RBD, receptor binding domain), que é um dos alvos das vacinas da COVID-19.
A eficácia protetora de uma vacina candidata a COVID-19 que foca no RBD foi testada usando esse modelo, validando-o como uma forma de estudar eficácia das vacinas em variações do SARS-CoV-2.
Iremos conviver por bastante tempo com o SARS-CoV-2, e as vacinas sem dúvida serão uma ferramenta crucial de proteção da sociedade.
Mas precisamos olhá-las com a serenidade e responsabilidade de quem entende que precisaremos usar máscara, seguir com cuidados, por um bom tempo.
Da mesma forma que nossos estranhos familiares (os vírus), também somos uma espécie que sofre adaptações e podemos abstrair essas medidas como uma adaptação social para uma convivência menos agressiva e conturbada,
até chegar um ponto em que a pandemia de 2019/2020 ficará na lembrança, junto das outras que vencemos, juntos.
Fiozinho com apoio e revisão do sempre pertinente @MarceloBragatte 🌻
Não faz muitas semanas atrás que o mundo respondeu uma pergunta importantíssima, talvez uma das mais relevantes feitas em 2020: podemos obter vacinas seguras e eficazes contra COVID-19.
A matéria começa recaptulando o fatídico 31/12/2019, em que funcionários de saúde em Wuhan, China, relataram um misterioso conjunto de casos de pneumonia que deixou 27 pessoas doentes. Em 08/01/2020, a relação com o SARS-CoV-2 havia sido feita
Quando falamos de medidas de prevenção e cobertura vacinal, estamos falando de impactar a transmissão de um agente infeccioso. Hoje, o vírus da COVID-19 circula muito intensamente, aumentando o espalhamento na população, com elevado nº de novos casos e óbitos
As medidas de prevenção, como distanciamento físico e uso de máscaras, etc, reduzem/desaceleram essa transmissão, diminuindo o nº de novos casos. É uma estratégia importante e impacta no nº de novos óbitos em decorrência da doença.
Ainda nessa figura, existe 2 casos para a 3ª situação: 1) Ter vacina mas não ter distanciamento/uso de máscara 2) Ter vacina e ter distanciamento/uso de máscara
Nos primeiros meses da vacinação, manter a adoção de medidas de enfrentamento (máscara/distanciamento) será CRUCIAL
O plano encontra-se organizado em 10 eixos, a saber: 1) Situação epidemiológica e definição da população-alvo para vacinação; 2) Vacinas COVID-19; 3) Farmacovigilância; 4) Sistemas de Informações; 5) Operacionalização para vacinação; 6) Monitoramento, Supervisão e Avaliação;
7) Orçamento para operacionalização da vacinação; 8) Estudos pós-marketing; 9) Comunicação; 10) Encerramento da campanha de vacinação.
Reunião sobre a apresentação do Plano Nacional de Vacinação (PNI) encerrada. O que não vimos?
O Plano Nacional de Vacinação
Alguns pontos:
Quando o PR diz que iremos em breve voltar ao normal com as vacinas, infelizmente pessoal, está errado. Só começaremos a experimentar um normal após atingir COBERTURA VACINAL.
Vacina é uma estratégia populacional. Enquanto não tiver muita gente vacinada, a transmissão do vírus seguirá elevada. Achar que após receber a vacina poderemos voltar ao normal é, infelizmente, uma ilusão. Apenas atingindo a cobertura vacinal é que poderemos pensar nisso
O @US_FDA disponibilizou um arquivo com os dados da Moderna, a nossa outra candidata a vacina da COVID-19 que usa RNA mensageiro! Ela será avaliada nos próximos dias pelo órgão! Vamos dar uma olhadinha no documento?
Hoje foi um dia muito emocionante e fico lisonjeadíssima de estar entre as vozes sobre ciência dentro do contexto da COVID-19 em 2020! Essa rede de divulgação tem muitos, mas muitos cientistas de altíssima qualidade e estar entre eles é um privilégio imenso!
Tive o prazer de me aproximar dessas pessoas, que integram o top5 desse ranking que aparece no recorte deste estudo é algo que não imaginava em 2019 que estaria contecendo em 2020. E é fruto de muita, mas muita dedicação! @oatila@luizaraujo_@otavio_ranzani@MBittencourtMD
Formei amizades incríveis que quero levar para a vida, conheci mulheres cientistas e jornalistas inspiradoras e que são mentoras nessa jornada, compartilhando seus conhecimentos e experiências, como a @TaschnerNatalia@dogarrett@binerighetti@veramagalhaes e tantas outras