Vacinas transformaram nossa saúde. E hoje quero fazer um apanhado geral sobre o histórico delas, para te mostrar o quanto estudamos elas, o quanto evoluímos com elas, o quanto conseguimos proteger nossa sociedade e o impacto delas nisso.

Vem comigo? 🌻
A @WHO estima que 2–3 milhões de vidas são salvas a cada ano pelos programas de imunização, contribuindo para a redução acentuada da mortalidade de crianças< 5 anos em todo o mundo: de 93 mortes por 1.000 nascidos vivos (1990) para 39 mortes por 1.000 nascidos vivos em (2018)
Em países com altas coberturas vacinais, muitas dessas doenças responsáveis pela morte de crianças simplesmente desapareceram. Observem as notificações (eixo Y) pelo tempo (eixo Y). No gráfico, é assinalado quando a vacina foi introduzida, e o ano.

Fantástico, não é?
As vacinas exploram um mecanismo elegante do nosso sistema imunológico, mas complexo: lembrar da infecção que passou, para responder melhor e mais otimizado no futuro. O sistema imunológico tem mecanismos para reconhecer o "inimigo": o agente infeccioso
Quando o agente infeccioso infecta nosso corpo, nossas células, partes dele, também conhecidos como antígenos, são responsáveis por estimular nosso sistema imunológico que os percebe como "opa, isso não pertence ao corpo não!"
Alertas são acionados na forma de moléculas, que sinalizam para essas células do sistema imunológico que estamos lidando com uma infecção. A linha de frente, conhecido como sistema imune inato, age e tenta neutralizar o invasor. E frequentemente é bem sucedida nisso.
No entanto, algumas infecções podem acometer mais intensamente as pessoas, ou perdurarem por mais dias. Imagine o vírus que fica dentro da célula, pode levar tempo para ser detectado, e enquanto isso ele segue infectando e danificando células vizinhas. E agora?
Um sistema de defesa altamente especializado é acionado, depois de um tempo: o sistema imune adaptativo. Os antígenos que mencionei são apresentados para eles, e essas células passam a se dividir e a formar clones de si, para atacar especificamente o invasor
Num curso normal (sem vacina), estamos fazendo tudo isso E LIDANDO COM A DOENÇA, não é mesmo? Que está acometendo diferentes locais do corpo, transmitindo para infectar outras pessoas... um caos. Imagina se tivéssemos uma vacina?

É o nosso caso!
A vacina vai estimular essas células especialistas apresentando os antígenos de uma forma controlada e segura. Sem desenvolver a doença. É como se a vacina, com essa entrega, dissesse "Pessoal, aqui está todas as infos do inimigo. Treinem. Se o virem, já sabem o que fazer!"
E dentro das células que estão sendo treinadas, parte delas vão registrar essas informações, tornando-se células de MEMÓRIA. São capazes de responder novamente, caso o corpo seja novamente desafiado ou infectado pelo agente infeccioso em questão.
Dessa forma, podemos definir uma vacina como um produto biológico que pode ser usado para induzir com segurança uma resposta imune que confere proteção contra infecção e/ou doença na exposição subsequente a um patógeno.
Nessa imagem, podemos observar como é essa resposta desencadeada pelas vacinas. Não é por acaso que os linfócitos T CD4 são chamados de auxiliares. Olhem como eles são importantes para ajudar na diferenciação de outras células, que terão papel chave na neutralização da infecção!
A proteção de uma vacina é medida em ensaios clínicos (1,2,3) que relacionam as respostas imunológicas ao antígeno da vacina a desfechos clínicos (como prevenção de infecção, redução da gravidade da doença ou diminuição da taxa de hospitalização)
Nessa tabela adaptada, observamos diferentes apresentações de vacinas, que variam desde a utilização de organismos inteiros (atenuados, inativados, "mortos"), a fragmentos desse organismo, entregando proteínas ou material genético para a célula construir a proteína
Vacinas que não utilizam organismos atenuados ou inativados, no geral, utilizam adjuvantes, para induzir uma resposta imunológica mais ampliada, aumentando o que chamamos de imunogenicidade (capacidade de desencadear a resposta imunológica).
Além de adjuvantes, também temos conservantes, emulsificantes/estabilizantes, para garantir sua conservação e estabilidade!
Ao encontrar um vírus, por ex, o sistema imunológico de quem foi vacinado contra esse patógeno específico é capaz de montar uma resposta imune protetora de forma mais rápida e robusta.
Em alguns casos, os níveis de anticorpos após a vacinação primária permanecem acima do limite protetor e podem fornecer imunidade por toda a vida.

Como sabemos a duração? A partir da fase 4 de investigação, em que acompanharemos a população vacinada e a sua resposta imunológica.
Naturalmente, a proteção direta do indivíduo é um foco das vacinas. Porém elas vão muito além disso. Elas nos trazem a proteção de uma SOCIEDADE.

Meu fio explicando em detalhe:
Sabemos que nem todos são indicados a se vacinar e que não existem vacinas 100% eficazes, mas felizmente, se um número suficiente de indivíduos em uma população for vacinado, e se a vacinação impede não apenas o desenvolvimento de doença (cont.)
mas também a própria infecção, a transmissão do agente infeccioso pode ser interrompida e o nº de novos casos pode cair significativamente, como resultado da proteção indireta de indivíduos que de outra forma seriam suscetíveis
Para doenças altamente transmissíveis (sarampo ou coqueluche) ~95% da população deve ser vacinada para prevenir surtos de doenças, mas para organismos menos transmissíveis, uma % menor de cobertura vacinal pode ser suficiente para ter um impacto substancial (polio ≤86%).
Para influenza, o limite para imunidade de rebanho é altamente variável de estação para estação e também pode variar pela variabilidade na eficácia da vacina a cada ano. A cobertura da vacina, de 30–40%, já terá um impacto nas epidemias de influenza sazonal, por exemplo!
No caso da COVID-19, mesmo uma vacina com eficácia mais baixa, mas capaz de prevenir doenças graves e hospitalização pela doença terá um impacto substancial na saúde pública! Estratégias com diferentes vacinas podem nos permitir explorar maiores proteções na sociedade
[ FIO EM CONSTRUÇÃO ]
Aqui, a @TaschnerNatalia e o Mauricio Nogueira comentam de uma forma BRILHANTE como vacinas, mesmo que tenham uma eficácia mais próxima de 50%, podem nos ajudar e muito com a pandemia:
Agora, falando de segurança e efeitos adversos em vacinação: Apesar da impressão pública de que as vacinas estão associadas a preocupações específicas de segurança, os dados existentes indicam que as vacinas são MUITO seguras como intervenções para proteger a nossa saúde
Os efeitos colaterais comuns, particularmente aqueles associados à resposta imune inata precoce às vacinas, são cuidadosamente documentados em ensaios clínicos. Em vários fios meus vocês encontram a descrição e as % desses efeitos para vacinas da COVID-19 threadreaderapp.com/user/mellziland
Embora as pessoas temam que efeitos colaterais raros possam não ser identificados em estudos clínicos, o desenvolvimento da vacina é RIGIDAMENTE controlado e sistemas robustos de vigilância pós-comercialização estão em vigor em muitos países, que visam detectá-los caso ocorram.
Talvez porque as vacinas funcionem tão bem e as doenças que elas previnem não sejam mais comuns, que tem havido várias associações espúrias feitas entre as vacinas e várias condições de saúde não relacionadas, que ocorrem NATURALMENTE na população.

Já pararam pra pensar nisso?
Para eu alegar que a vacina X gerou um efeito Y, eu preciso de um estudo epidemiológico muito cuidadoso e robusto para detectar associação de causa e consequência. Muitos do que alegam efeitos estão vendo ASSOCIAÇÕES TEMPORAIS e não de causalidade.

Os efeitos colaterais graves das vacinas são muito raros, com anafilaxia sendo o mais comum desses efeitos colaterais raros, ocorrendo após menos de UMA EM UM MILHÃO de doses.
Indivíduos com alergias conhecidas e histórico de respostas intensas devem comentar sobre seus casos com profissionais de saúde. Ainda, se ocorrerem, esses casos são prontamente gerenciados se as vacinas forem administradas por profissionais de saúde treinados.
Apesar de relatos enganosos generalizados sobre as ligações entre a vacina contra sarampo, caxumba e rubéola e o autismo no final da década de 1990, não há evidências de que qualquer vacina ou seus componentes causem autismo!

E tenho dito.
O risco de hospitalização, morte ou morbidade a longo prazo devido a doenças (que temos vacina) é tão alto, que os riscos de efeitos colaterais comuns e raros estão compensados DE LONGE pelas reduções massivas de doenças alcançadas por meio, é claro, da vacinação.
A avaliação contínua da segurança da vacina após o licenciamento é importante nesse aspecto e acontece há anos, para todas as vacinas que hoje estão disponíveis para nós, mostrando que as investigações nos ensaios clínicos são robustos para garantir segurança e eficácia
Desafios para o sucesso da vacinação:
- Acesso às vacinas: é relevante que as autoridades garantam a compra das vacinas para o país, é um direito da população e o Estado deve garantir a saúde dela. Além disso, temos o SUS para essa distribuição
- Comunicação: é relevante termos boas campanhas de vacinação, conscientizar a população, associando diferentes veículos (TV, Rádio, jornais, comunicados oficiais), jornalistas, cientistas, divulgadores científicos para mostrar pra sociedade que é seguro e eficaz
- Relação transparente com a população: associado a uma comunicação com dados científicos e acessível, é relevante que autoridades consigam solucionar dúvidas e hesitações da população de forma clara e respaldada em ciência
- Mais de uma vacina: precisamos, sobretudo, ter a ciência de que só uma vacina não vai nos ajudar. Temos uma grande população pra imunizar, temos grupos prioritários e diferentes vacinas sendo aprovadas. Precisamos de estratégias, no PNI, em detalhe, para isso
- Um PNI detalhado, robusto e sobretudo, abrangente: não preciso comentar muito além disso, certo? Precisamos de um PNI nota 10, com estratégias em detalhamento.
- Seringas e logística: é inadmissível que nessa altura do campeonato a gente não tenha acordos ou tenha comprado seringas e insumos para vacina o suficiente. Da mesma forma, equipar o SUS com freezers adequados para a cadeia de frio.
- Cobertura vacinal: precisamos de uma boa % da população que vá se imunizar. Justamente para a proteção das pessoas suscetíveis que não poderão se vacinar, pelo motivo que for. Leia aqui, para saber mais:
Por fim, queridos, a imunização protege as populações de doenças que anteriormente ceifavam a vida de milhões de pessoas a cada ano, a maioria crianças. Doenças que eram muito comuns, que talvez a minha geração nem se dê conta do quanto, afinal, eu sou da geração do zé gotinha
O acesso às vacinas é um dos maiores obstáculos, e a melhoria da infraestrutura, conscientização e aumento do envolvimento da comunidade serão essenciais para melhorar isso, e novas plataformas de distribuição que eliminem a necessidade de uma rede de frio podem ter bons frutos
Há uma crescente % da população que é hesitante ou cética quanto à vacinação e isso requer um engajamento para promover transparência sobre as lacunas de conhecimento existentes e estratégias para superá-las.

Você está na distância de 1 tuíte de um cientista. Lembre-se disso
E o impacto dessa população hesitante é tão grande e assombroso, que estamos vendo baixas coberturas vacinais para vacinas que já estão aprovadas para outras doenças, e estamos vendo essas doenças circulando novamente.
E é um desafio para a COVID-19, da mesma forma:
A pandemia da COVID-19 nos mostrou que juntos, somos capazes de dar respostas rápidas, seguras, robustas e que precisamos entender que vivemos em sociedade e temos responsabilidades sociais quanto a saúde dessa sociedade. Proteger a socierdade não fere sua liberdade individual.
Muito pelo contrário, uma sociedade protegida e saudável garante que a gente possa ir e vir e fazer o que gostamos, estando protegidos e sabendo que estamos controlando agentes infecciosos, graças às vacinas!
Estamos passando por um momento que as medidas de enfrentamento se fazem necessárias, e vão continuar se fazendo mesmo quando começarmos a vacinar, até atingir a cobertura vacinal. E precisamos engajar porque se não, estamos expondo muita, muita gente.
E parte dessas pessoas vão hospitalizar e parte delas vai ir a óbito. São centenas de óbitos todos os dias. Vidas perdidas, irrecuperáveis por uma doença EVITÁVEL. Que a gente nunca perca nossa humanidade a ponto de relativizar isso ou achar que outras doenças matam mais.
Que raio de raciocínio é esse?!

Não estamos competindo que doença é pior que a outra, estamos numa pandemia com centenas de mortes EVITÁVEIS sendo perdidas. Mortes que podem vir da sua família, da pessoa que você mais ama, que pode se contaminar pelo descuido do outro.
Se você tem dúvida sobre vacinas, ainda está hesitante, converse com especialistas, mas especialistas que se baseiam em ciência! Conversem com pessoas que estão a par do tema. Questionem! Não abram mão do senso crítico ou sejam levados por opiniões e paixões
Para terminar, deixo a excelente referência que me inspirou e me forneceu as figuras lindas para adaptar para este fio: nature.com/articles/s4157…

E desejo a todos um 2021 com SAÚDE, somado a consciência, proteção e HUMANIDADE.

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More from @mellziland

30 Dec 20
Saiu o artigo com os dados de fase 3 da Moderna 🚀
Publicadíssima na @NEJM o estudo contou com a participação de 30.420 participantes num ensaio clínico randomizado, cego e controlado por placebo!

Vamos dar uma espiada!
Link do trabalho: nejm.org/doi/full/10.10…
Já tinha comentado, em detalhamento, os dados da Moderna aqui nesse fio do documento submetido ao FDA, no momento da análise - e agora já aprovadíssima - vacina candidata de RNA mensageiro da Moderna

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30 Dec 20
Mais um vídeo excelente da @TaschnerNatalia e do Maurício Nogueira explicando sobre as eficácias das vacinas da COVID-19 !

Pontos relevantes
- qualquer vacina de 50% ou mais de eficácia vai nos ajudar, e muito
- essas vacinas são capazes de interromper a cadeia de transmissão do vírus
- essas vacinas evitam casos graves! E se considerarmos isso, já é algo maravilhoso
O que precisamos?
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30 Dec 20
Oi você! Tá meio confuso sobre eficácia de vacinas? Como chegamos nesse valor?

A @TaschnerNatalia - que faz absolutamente tudo - nos presenteia com esse texto maravilhoso sobre eficácia de vacinas.

Dá uma lidinha e se curtir, compartilha!

revistaquestaodeciencia.com.br/questao-de-fat…
Destaco:

"... Isso já muda a forma como encaramos a proteção que as vacinas podem gerar na sociedade. Podemos dizer, ok, uma vacina de 50% de eficácia não é tão boa quanto a de 95%, mas tem o potencial de prevenir doença grave e morte."
"Ou seja, mesmo que as pessoas fiquem doentes, a chance de desenvolver um quadro grave e morrer cai significativamente. Isso já é um sonho de consumo: transformar a COVID-19, de fato, em uma gripezinha. Uma gripezinha é manejável."
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30 Dec 20
Notícia importante! É uma vacina que está sob análise aqui no país, com acordo de transf. de tecnologia. O regime aprovado em UK foi o de 62% de eficácia (2 doses inteiras), prevenindo 100% dos casos graves de COVID-19.

E hoje tem reunião da Anvisa com a Pfizer!
O regime de meia dose + dose inteira que acusou eficácia de 90% não se sustenta nesse momento. Falta a inclusão de mais participantes com idade acima de 55 anos.

Recentemente publiquei um fio comentando sobre o último anúncio da AZ
Ali, fala-se que estudos adicionais foram feitos. Mas ainda não sabemos dados de fato sobre isso. Não foram divulgados amplamente, apenas noticiado no Sunday Times.

Comunicação científica complicada. Mas sem dúvida, é uma aprovação importante aqui para o Brasil
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30 Dec 20
Pedido feito hoje (29/12/2020) à @anvisa_oficial

Não temos dados completos disponíveis de fase 3 então é bem difícil comentar sobre ela. Argentina iniciou hoje a imunização com ela em seu território.

Será que,dessa forma, saberemos mais dos dados?

cnnbrasil.com.br/saude/2020/12/…
Relembrar é viver:

Dados de fase 1/2: threadreaderapp.com/thread/1304455…
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29 Dec 20
Novavax anunciou ontem (28/12/2020) o início, muito esperado por sinal, de seus estudos clínicos de fase 3 para verificar a eficácia de sua vacina candidata nos EUA!

Alguns comentários abaixo deste GIF que realmente é nosso desejo
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