Apresentei Karatê Kid para Nina e para minha sobrinha. Curtiram muito. E vou dizer: não é nostalgia, não; o filme é maravilhoso e ponto.
O Sr. Miyagi é a coisa mais linda do mundo.
Hoje foi a vez de apresentar Karatê Kid 2 para as meninas (minha filha e minha sobrinha). Também curtiram muito. Eu devo ter visto esse filme no cinema umas 15 vezes quando foi lançado. E vou dizer: continua funcionando muito bem.
Acho que muita gente subestima o que Ralph Macchio faz nesses filmes. Ele projeta uma sinceridade, uma gentileza, como Daniel LaRusso que se torna fácil acreditar em sua devoção a Miyagi e em sua vontade de honrar o mestre.
E Pat Morita... bom, o sr. Miyagi é um daqueles personagens instantaneamente icônicos. A cena entre ele e Macchio logo após a morte do pai de Miyagi, quando estão sentados diante do mar, é de uma força notável. Tanto pela gentileza de Daniel quanto pela dor muda de Miyagi.
Igualmente eficaz é a performance de Tamlyn Tomita como Kumiko (acho que eu passei meses apaixonado por ela depois de ver o filme), que se torna uma personagem bem mais interessante e complexa do que a de Elisabeth Shue no primeiro (e da qual gosto também).
E o que são as trilhas compostas por Bill Conti para esses dois filmes, meu deus. Lindas demais, com um uso de instrumentos de sopro (flautas?) que evocam um contraste com a música pop da época sem se tornarem estereotipadas em sua influência do universo de Miyagi.
Gosto também de como o filme não se preocupa em tentar superar as sequências de luta do primeiro, investindo um longo tempo no desenvolvimento e nas relações entre os personagens, compreendendo que se nos envolvemos nos conflitos é porque amamos aquelas pessoas.
Pra finalizar, me chamou a atenção o instante em que Daniel comenta que "15 mil americanos morreram aqui em dez dias", se referindo à guerra, e Miyagi imediatamente acrescenta: "E 150 mil japoneses. Por que somos tão estúpidos?".

Isso pode parecer bobo, mas lembrem-se da época.
O filme foi lançado em plena era Reagan, quando a "virilidade" era traduzida por violência e guerra. Um ano antes, Rambo tinha "redisputado" a guerra do Vietnã e vencido; e aqui eles não hesitam em equiparar o desperdício de vidas de soldados japoneses ao falar dos americanos.
E não é qualquer personagem que comenta isso, mas o símbolo de sabedoria Miyagi - e em resposta ao aprendiz Daniel-san, que demonstra perceber o que o mestre quer dizer (e Daniel é, vale lembrar, o protagonista com o qual o público se identificava).
Isto, por sinal, não foi um momento único da franquia: há, em Karatê Kid, uma menção clara aos campos de concentração criados em solo americano pra manter os japoneses (e descendentes) presos durante a Guerra. A esposa de Miyagi morreu num deles por falta de atendimento médico.
Aponto isso porque gosto sempre de lembrar que todo filme é político, já que a ARTE é política em sua essência. Quando Rambo redisputa a guerra do Vietnã ou Daniel LaRusso aprende que as vidas dos soldados japoneses também importavam, isto é política.
De modo geral, porém, o Cinema mainstream norte-americano da década de 80 exibiu um conservadorismo óbvio, o que torna momentos como os de Karatê Kid 1 e 2 ainda mais notáveis.
(E antes que perguntem de novo, comentei as três temporadas de Cobra Kai neste fio: )

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27 Jan
Não sei se vocês estão acompanhando o que está acontecendo na bolsa de valores dos EUA com as ações da GameStop, uma cadeia de lojas especializadas em games, mas é algo muito interessante. E instrutivo.
Vou tentar resumir: um subgrupo do Reddit que reúne pessoas interessadas em ações e na bolsa de valores (mas não ligadas a nenhum grande fundo de investimentos) decidiu investir nas ações da GameStop como uma ação conjunta e passaram a comprá-las loucamente.
Eles escolheram a GameStop por dois motivos: 1) (e isto é suposição) por simpatia pela empresa; e 2) (isto é fato) porque ao valorizarem as ações da franquia, eles trariam um prejuízo bilionário a grandes investidores e fundos de investimentos.
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5 Jan
Para quem foi pré-adolescente e/ou adolescente na década de 80, Karatê Kid foi um fenômeno tão memorável quanto Indiana Jones, De Volta para o Futuro ou Rambo. Lembro que a antecipação pelo segundo filme era enorme - e acabei vendo no cinema várias vezes.
(Não vou comentar o terceiro filme e muito menos o quarto, mas tenho imenso carinho pelos dois primeiros até hoje.)
Justamente por ter tanto carinho pelos dois primeiros filmes que evitei ver Cobra Kai até hoje; eu temia que a série manchasse de alguma forma minha memória afetiva dos originais. (Isso mesmo tendo visto o vídeo "Sweep the Leg, Johnny" umas 500 vezes e amado.)
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3 Jan
Vi agora a thread do "bean dad" que está tomando conta do twitter (pra quem não viu, um pai fez uma longa thread contando como se recusou a abrir uma lata para a filha para que ela aprendesse a usar o abridor. Ela tem 9 anos e ficou seis horas com fome até conseguir).
É claro que ele, embora tivesse achado que iria arrasar, está sendo massacrado. Sim, ele foi duplamente babaca: por deixar a filha ficar com fome tanto tempo só pra ensinar uma lição boba e por depois contar a história no Twitter como se fosse algo fantástico.
O Twitter, como sempre faz, está reagindo com uma falta de proporção absurda. Inclusive acusando o cara de "abuso infantil". Porque é pra isso que essa merda aqui serve: pra que possamos nos sentir superiores apontando como os outros são horríveis. (Estou fazendo isso agora.)
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2 Jan
Uma bobagem que eu levo a sério é a escolha do primeiro filme que vejo em cada ano. Pra não arriscar começar o ano de cinéfilo mal, prefiro não arriscar e sempre revejo algo que eu ame. Se possível (quando lembro), tento também terminar com um título que dialogue com o primeiro.
Em 2019, por exemplo, comecei e terminei o ano com Satoshi Kon. Image
Já em 2020, eu pretendia rever Os Três Enterros de Melquiades Estrada no dia 31 para remeter ao título sensacional do primeiro filme do ano, Traga-me a Cabeça de Alfredo Garcia. Mas acabei sem tempo depois de passar o dia escrevendo sobre Soul e o texto de Números e Estrelas. Image
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29 Dec 20
Eu gostei de Jogador No 1 (mais do filme do que do livro), mas a continuação, lançada há poucos meses, é ruim de doer. Todos os personagens são insuportáveis (incluindo o casal principal, Wade e Samantha), a narrativa é prolixa ao extremo e o desfecho é tolissimo.
O livro consiste basicamente de um monte de gente que decorou trivias da cultura pop e se orgulha de ficar recitando-as em detalhes uns para os outros. Sim, o primeiro também era assim, mas ao menos a história nos apresentava aos conceitos interessantes do OASIS.
Ler Jogador No 2 é ficar preso em uma sala com um bando de idiotas que confundem cultura com curiosidades e que se acham inteligentíssimos porque decoraram detalhes irrelevantes de livros, filmes e músicas. Não é à toa que jamais discutem os TEMAS das obras, só trivias.
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28 Dec 20
Quem me acompanha há algum tempo sabe que considero a HFPA, que promove o Globo de Ouro, uma piada de mau gosto. Aliás, não é exclusividade minha: eles são vistos como picaretas também em Hollywood (dito isso, há alguns jornalistas dignos na associação, mas são minoria).
Aliás, já escrevi sobre o assunto no Cinema em Cena (cinemaemcena.com.br/coluna/ler/224…).
Pois bem: vi agora que a HFPA decidiu que "Minari" só pode concorrer como "Filme de Língua Estrangeira" no Globo de Ouro. Embora seja uma produção totalmente norte-americana. (A maior parte do longa é em coreano.)

Curiosamente, isso não se aplicou a Babel e Bastardos Inglõrios.
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