Artigo recente analisou dados inéditos referentes a 145 países ao longo de 170 anos e concluiu: industrialização é o principal fator por trás da democratização no mundo.
Nem o mero crescimento da renda, nem a redução da desigualdade, nem a educação explicariam melhor.
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Isso ocorreria porque a industrialização aumenta o tamanho e a capacidade de mobilização dos trabalhadores urbanos e da classe média, ao mesmo tempo em que reduz os incentivos e a capacidade das elites de se oporem ou de enfraquecerem a democracia.
Por quê?
i) trabalhadores industriais estariam mais vulneráveis a choques negativos e, assim, precisam influenciar o governo para implementar políticas de proteção social. Parte dos agricultores pode retornar à agricultura de subsistência. Elites usam seu estoque de riqueza;
ii) trabalhadores industriais tendem a preferir eleições justas e livres, ao invés de um regime autocrático que se comprometa a implementar políticas favoráveis a eles, porque concessões de um governo controlado pela elite tradicional não podem ser asseguradas no longo prazo;
iii) produção industrial depende de muitas pessoas trabalhando juntas em organizações grandes, complexas e impessoais, aglomeradas em áreas urbanas. Trabalhadores precisam desenvolver capacidades que estimulam a cooperação e que acabam facilitando a mobilização política.
Aliás, em artigo de 2019, autores analisaram mais de 100 anos de protestos políticos em 150 países e concluíram que os movimentos dominados por trabalhadores industriais superaram todos os outros na promoção da democracia;
iv) trabalhadores industriais também tendem a defender Judiciário independente e Estado de direito. Isso porque, ao contrário dos mais pobres, eles possuem propriedades. E, ao contrário da elite, têm menos meios para defendê-las (como evasão de divisas ou compra de influência).
Fukuyama (2014) já mostrou que os sistemas judiciais ocidentais só se tornaram eficazes, independentes e imparciais após a Revolução Industrial ter gerado uma classe média independente do Antigo Regime e com verdadeiro interesse na aplicação do Estado de direito;
v) a industrialização pode reduzir a resistência das elites à democratização porque as cadeias produtivas industriais tendem a ser relativamente mais longas e mais complexas, de modo que repressões violentas devem gerar prejuízos econômicos mais graves; e
vi) em sociedades pré-industriais, elites costumam extrair riqueza de grandes latifúndios e da mineração, capitais imobilizados que são mais facilmente taxados ou expropriados. Em sociedades industriais, ativos intangíveis como tecnologia e know-how assumem maior importância.
O autor @samvannoort mostra que industrialização é importante tanto para a criação quanto para a consolidação da democracia. Em democracias tradicionais (como 🇬🇧, 🇺🇸, 🇫🇷, 🇩🇪 e 🇸🇪), o emprego industrial normalmente permaneceu alto muitas décadas após a democratização.
Isso não é boa notícia para o 🇧🇷. A participação do emprego industrial vem caindo aceleradamente desde os anos 1980 (uma das maiores quedas do mundo).
Isso não seria um problema se nossos empregos industriais tivessem se transferido para serviços modernos, como nos países ricos. Segundo @samvannoort, tais empregos apresentariam características próximas daquelas mencionadas anteriormente referentes aos empregos industriais.
No entanto, como serviços modernos tendem a estar ligados à indústria, seja como inputs (finanças, design, P&D), seja como outputs (marketing, logística), nossa desindustrialização precoce tem levado a um aumento maior do emprego em serviços tradicionais. bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/…
Esses empregos são geralmente informais, precários, não exigem qualificação significativa da mão de obra e costumam estar espalhados em milhares de micro e pequenas empresas. Tudo isso dificulta a ação coletiva.
"A China exibe alguns dos sintomas semelhantes que afetaram o Japão, incluindo o rápido declínio do crescimento de 10% para 6% na última década, bolhas imobiliárias, crescimento estagnado da produtividade e o envelhecimento da população"
Tema gerou ótima discussão!
Quatro comentários:
➡ A China não é o Japão. Só pra ilustrar, estima-se que a 🇨🇳 possui 1.137 vezes mais recursos minerais no seu subsolo do que o 🇯🇵.
A probabilidade de um país superar o subdesenvolvimento é muito baixa
Novo artigo de @IsabellaMWeber e outros mostra que a estrutura produtiva que um país tinha há mais de 100 anos praticamente determina sua posição atual na hierarquia global
Os autores criaram uma base inédita de comércio internacional para a era da globalização do séc. XIX, discriminando os dados o máximo possível para identificar os bens específicos que cada país exportava. Assim, puderam apurar a complexidade das estruturas produtivas de cada país
A intuição é que, se um país consegue produzir competitivamente muitos produtos que poucos outros países conseguem produzir, pode-se dizer que aquele país desenvolveu uma estrutura produtiva complexa (o conhecimento produtivo é amplo e está enraizado e disseminado na sociedade)
O NIS possui até um Departamento cuja função é garantir que as tecnologias permaneçam no país
De 2014 até 2019, o NIS reportou 123 casos de vazamento de tecnologia da Coreia. 83 foram para a China
"Garantir o sucesso da Samsung é uma questão de importância nacional para Seul"
A Samsung elaborou um sofisticado sistema para impedir o vazamento de tecnologia. Por exemplo: em um laboratório, o papel usado em máquinas copiadoras contém lâmina de metal, parte de um sistema de detecção que busca impedir que os funcionários imprimam informações confidenciais
Quão autônomos/independentes eram os Banco Centrais (BCs) dos tigres asiáticos nos anos 1980, quando exibiam elevado crescimento econômico e reduziam rapidamente a distância para o mundo desenvolvido?
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Em 1992, Cukierman, Webb e Neyapti criaram uma medida de independência dos Bancos Centrais, analisando a legislação de 50 países.
Consideraram os seguintes aspectos: (i) nomeação, duração do mandato e demissão do Presidente do Banco Central; jstor.org/stable/3989977…
(ii) formulação da política monetária (se cabia ao governo e se o BC possuía algum papel); (iii) objetivos do BC (se apenas estabilidade de preços ou se permitia outros, como pleno emprego); e (iv) limitações para o BC financiar o governo.
A tradicional estratégia chinesa era limitar em 50% o controle de multinacionais estrangeiras, oferecendo seu mercado interno em troca de capital, expertise e tecnologia
Nesse fio, explico por que a estratégia ainda não gerou os resultados pretendidos
A Tesla usou seu status como produtora de carros mais valiosa e mais avançada do mundo, e se beneficiou da ameaça de isolamento comercial imposta pelos EUA à China, para conseguir o controle total sobre a subsidiária
A fábrica gigante em Shanghai foi construída em tempo recorde
A história da indústria automobilística chinesa é uma ótima aula sobre as razões que fazem ser tão difícil para um país pobre atingir alto nível de desenvolvimento, mas também sobre as oportunidades que surgem quando se tem ambição e visão.
Primeiramente, não é à toa que a indústria automobilística é considerada estratégica em tantos países. A cadeia de fornecimento é longa (elevado número de partes e peças e de serviços terceirizados), cria muitos empregos com bons salários e incorpora e gera inovação e tecnologia
A primeira vez que foi elaborada uma estratégia para o desenvolvimento da indústria automobilística na China foi em 1994.
A meta era criar de três a quatro conglomerados automotivos com "competitividade internacional" até 2010, com marcas e tecnologia nacionais.