Em um afago aos motoqueiros, Bolsonaro decretou isenção de pedágios para as motos nas próximas concessões.

A essa altura do campeonato todo mundo sabe que essa meia entrada dos motoqueiros será paga pelo resto da sociedade.

Mas é pior que isso. A medida tem um efeito cascata.
O raciocínio é simples.

Toda concessão precisa calcular o preço de pedágio. O valor cobrado deve ser o suficiente para:
(i) pagar os custos de operação das estradas, e;
(ii) atingir o retorno sobre o capital investido firmado em contrato.

E como ela estabelece esse preço?
As concessionárias estimam quanto vai gastar na operação e manutenção e também estimam qual deve ser a movimentação das estradas.

Elas dividem esses gastos que terão pelo número de veículos que passa nas estradas (adicionando alguma margem de lucro firmada em contrato) e pronto.
Esse é o preço de equilíbrio do pedágio.

Quando Bolsonaro promete isentar motociclistas. O que a concessionária faz?

Para cobrir essa meia entrada, ela tem que ajustar o valor das tarifas dos demais. Ou seja, zera o pedágio das motos, MAS aumenta dos carros e caminhões.
Alguém poderia sugerir: "Ah, mas não precisa aumentar dos outros, basta tirar essa perda do lucro das empresas".

Economia funciona na base de que as regras serão cumpridas.

Que empreendedor iria investir em um país ou setor que muda suas regras do dia pra noite? Nenhum.
Pois bem. Aí o Ministério da Infraestrutura disse que ia aumentar apenas em 1% a tarifa para os demais.

Primeiro que não faz sentido algum. Qual justificativa para dar subsídio para motoqueiro?

Porque o dono de uma BMW ou Harley-Davidson deve ter isenção e o dono do Celta não?
O pior é que para isentar o motoqueiro, Bolsonaro vai encarecer a produção. Ou seja, todos os caminhões transportando mercadorias agora o farão a um custo maior.

"Ah, mas 1% é pouco...". Não, não é.

E além disso, aumentar a tarifa de todo transporte tem um efeito em cascata.
TODA VEZ que o caminhoneiro passar na estrada ele vai pagar esses 1% a mais. Pense num automóvel sendo fabricado.

Passou um caminhão levando borracha? 1% a mais. A borracha virou um pneu e vai ser transportado? 1% a mais. O alumínio virou o carro? 1% a mais...
Ou seja, para beneficiar um pequeno grupo com privilégios concentrados, os custos serão pagos por toda sociedade de maneira difusa.

Resultado: nossa indústria fica menos competitiva. Se da porteira pra dentro conseguimos ser bons, da porteira pra fora existem essas bizarrices.
Para beneficiar um pequeno grupo sem a menor justificativa econômica, afetamos todo o país.

Geramos desigualdade a medida que donos de motos caras tem isenção às custas dos demais. Perdemos competividade porque nossos produtos ficam mais caros.

E vamos ficando mais pobres.

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27 May
O Vereador @RubensNunesMBL fez um Projeto de Lei (PL) que dá 5% de desconto no IPTU pra quem adotar um cachorro abandonado.

Ainda que a intenção seja boa, vou dizer porque acho um PL ruim e qual seria uma forma muito melhor de combater esse problema BASEADO EM EVIDÊNCIAS.
A primeira coisa a se deixar claro é que temos que parar de achar que discordar de algo é ruim. Que tudo tem que haver consenso. Pelo contrário, é através do Dissenso que se evolui.

Eu devo ter 90% de convergência com os valores do Rubinho. Mas acho esse PL ruim. Apenas isso.
Quando li esse PL, a primeira coisa que pensei foi "hummmm, esso projeto vai alterar em muito o comportamento dos agentes. Tá com cheiro de feito Cobra."

Como é um termo conhecido (pra quem não conhece vale pesquisar ) vou usar outro exemplo: O Grande Massacre de ratos de Hanoi.
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22 May
UM "GUIA" DE COMO SE COMPORTAR EM REDES SOCIAIS.

Uma dúvida comum do nosso dia a dia em que envolve interações com pessoas é: "como eu devo agir e responder às ações dos outros?"

Isso, basicamente é o tema de estudo da Teoria dos Jogos. Como eu ajo? Tem um método.
Eu já falei aqui da Lei de Monastério (@lmonasterio) dos dois desvios padrões.

"NUNCA brigue se o adversário estiver a mais de dois desvios padrão de você em QUALQUER dimensão: conhecimento, ideologia, inteligência ou porte físico."

É perder nosso tempo escasso...
Mas e aqueles que precisamos responder? Há estratégias pra isso.

- Regra de OURO: faça com os outros o que você quer que seja feito com você.
- Regra de PRATA: NÃO faça com os outros o que você NÃO quer que seja feito com você.
- Regra de BRONZE: faça aos outros o que te fazem.
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17 May
O que você faria se fosse o Primeiro-Ministro e soubesse que iam bombardear uma cidade do seu país?

Isso aconteceu com Churchill em 1940. A atitude dele mostra a visão de um estadista, coisa que falta ao Brasil.

A DIFERENÇA DE SACRIFICAR UM POUCO DO HOJE POR UM AMANHÃ MELHOR...
Em 1940, no auge da II Guerra Mundial, os Britânicos haviam acabado de decifrar o código secreto militar nazista “ENIGMA”.

A Enigma era uma máquina de escrever que gerava códigos criptografrados. O código, utilizado entre pelos alemães, colocava os Nazistas em grande vantagem.
O código foi decifrado por Alan Turing em 1940. E uma das primeiras mensagens interceptadas era que os alemães estavam prestes a bombardear a cidade de Coventry, 150 km de Londres.

A ação mais óbvia era que Churchill (primeiro-ministro britânico) evacuasse a cidade rapidamente.
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8 May
PRECISAMOS FALAR DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DE IGREJAS EVANGÉLICAS.

Para os fanáticos que pensam binariamente e vão problematizar, NÃO É SOBRE FÉ OU RELIGIÃO, é sobre economia.

É sobre como a imunidade banca o enriquecimento de poucos às custas de muitos e deixa o BRASIL +INJUSTO.
No Brasil, as igrejas e centros religiosos estão entre as instituições às quais a Constituição garante imunidade tributária.

Isso significa que nem União, nem estados e municípios podem cobrar deles qualquer tributo que tenha incidência sobre o patrimônio ou renda.
Sendo mais específico, Igrejas e centros religiosos de qualquer natureza NÃO pagam IPTU, IPVA e Imposto de Renda.

Qual a justificativa?
Uma delas é que a imunidade existe para proteger a liberdade religiosa e permitir que todos os grupos de pessoas possam exercer sua fé.
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6 Apr
BRASILIA: O VERDADEIRO PALÁCIO DE VERSALHES DE LUIS XVI, EM PLENO BRASIL 2021...

Quem estudou a Revolução Francesa se impressiona com a alienação da corte de Luís XVI sobre a
realidade francesa.

Vemos por aqui algo muito semelhante em Brasília. Só que 230 anos depois.
Um dos exemplos são as férias de fim de ano de Bolsonaro. R$ 2,3 milhões para passar 17 dias no Guarujá. Ou seja, R$ 135 mil por dia.

Antes que os passadores de pano reclamem, isso não é sobre Bolsonaro. Dilma Rousseff visitou 13 países em 2019, gastando R$ 544 mil em diárias.
Collor gastou, em 2019, R$ 961 mil em viagens. Lula utilizou R$ 2,5 milhões do fundo eleitoral para pagar advogados de sua defesa.

As despesas dos seis ex-presidentes somaram R$ 5,9 milhões em 2019.

Ou seja, não é sobre um presidente ou um partido específico.
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3 Apr
Eu gosto muito do Rappi. Tem gente que acha que é o mal do capitalismo. Que a empresa explora as pessoas etc.

Pra mim, ele dá oportunidade e renda pra uma classe que não teria outra alternativa se não fosse essa empresa. Pessoas que estariam desempregadas ou em empregos piores.
O Rappi conecta 2 tipos de agentes na sociedade.

1. Existe um grupo de pessoas que tem dinheiro, mas não tem tempo. Esse grupo estaria disposto a pagar alguém para fazer suas compras, ir na farmácia.

2. Existe um outro grupo que possui tempo sobrando, mas não tem dinheiro.
Eles estão dispostos a - em troca de alguma renda - fazer as compras de alguém, ir na farmácia ou comprar gelo pro seu churrasco.

Ou seja, um DEMANDA TEMPO E OFERTA DINHEIRO.
O outro DEMANDA DINHEIRO e, em troca, OFERTA TEMPO.

Boom! Temos a possibilidade de criar um mercado!
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