Olá pessoinhas, tudo bem com vocês?
Depois do Fio de ontem sobre Baiacus, decidi falar sobre arraias de água doce, outro bichinho fofo que também já foi marinho um dia.
Segue o fio!
As arrais de água doce são peixes cartilaginosos, parente bem próximos dos tubarões. Ambos estão dentro do mesmo grupo, Elasmobranchii. Há alguns animais que parecem um meio termo entra arraia e tubarão, o tubarão-carpete é um exemplo deles.
📷Kristian Laine
São animais bem peculiares, sua característica mais marcante é sua forma achatada e suas nadadeiras peitorais que se modificaram projetando-se para as laterais e envolvendo quase todo o corpo do animal. A boquinha dela fica na parte ventral do corpo, e os olhos na dorsal.
Na região Neotropical (América do Sul), nós temos a família Potamotrygonidae (potamo= rio/ trygon= arraia). Essa família possui quase 40 espécies válidas distribuídas em 5 gêneros, sendo o gênero Styracura de água salgada, então não vamos falar dele hoje.
São animais de reprodução sexuado e vivíparos (gestação interna). Os machos possuem dois Clásperes, órgão sexuais que usam na cópula.
Imagem 1: clásper de um macho a direita/ clásper ausente na fêmea a esquerda
Imagem 2: arraia em trabalho de parto 📷Wallice Duncan
Existem arraias de água doce em outros lugares do mundo, que são até maiores. No continente asiático tem o gênero Himantura, com animais enormes.
A hipótese biogeográfica mais aceita atualmente é que esses animais entraram no continente por inclusões marinhas há 20 milhões de anos atrás, uma vez dentro do continente foi possível se diversificar em diferentes habitats.
Os gêneros de água doce neotropicais são Potamotrygon, Paratrygon, Heliotrygon e Plesiotrygon. São amplamente distribuídas no continente. O maior gênero é o Potamotryngon, tendo aproximadamente 30 espécies, com diferentes cores e marcas.
📷Potamotrygon motoro
Elas são exploradas comercialmente pelo aquarismo, sendo exportadas até mesmo para fora do país. Popularmente chamadas de arraias-fogo, devido a coloração marcante.
Em ambientes aquáticos de alta competição, o meio seleciona mecanismos de defesa marcantes para os organismos, no caso das arraias, elas desenvolveram toxinas que são inoculadas por seus ferrões encontrados na cauda.
São encontrados de 1 a 3 ferrões, são rígidos, calcificados e trocados periodicamente. Eles possuem a única função de defesa, jamais sendo usado para predação. Os acidentes com pessoas ocorrem quando esses animais são pisados.
📷Claire Sorenson
O reflexo delas é muito rápido, assim que uma pessoa pisa sobre ela a cauda leva o ferrão automaticamente na perna ou no pé. Os acidentes geralmente não são fatais, mas são desagradáveis, todos os relatos contam que a dor é insuportável, além+
De ocasionar infecções e necrose no local, devido as toxinas e bactérias associadas ao tegumento que reveste o ferrão. Não coloquei a foto aqui pois é conteúdo sensível, mas segue o link caso você seja curioso
Ainda não existe um antídoto para veneno de arraias, por dois fatores.
1: Toxinas de peixes não são tão bem estudadas quanto as de animais terrestres como serpentes, escorpiões, aranhas, etc. As pesquisas sobre esses animais é algo recente, que está se desenvolvendo.
2: As toxinas encontradas nelas são muito complexas, há uma grande variedade de compostos, que variam até mesmo dentro de uma mesma espécie. Isso dificulta muito na produção de um antídoto específico para arraias.
As ferroadas são tratadas com antibióticos e anti-inflamatório (e reza kkkkkk). Nas regiões mais isoladas são usados medicamentos caseiros. Em comunidades ribeirinhas tradicionais o fígado e ferrão delas são usadas na produção de remédios caseiros para asma, reumatismo e artrite.
A maior espécie que nós temos é a Paratrygon aiereba, popularmente conhecida como arraia-maçã ou arraia-disco, por cauda do seu formato. Ocorre na Bolívia, Peru e Equador, Norte do Brasil no Rio Amazonas e seus afluentes, Baixo Rio Tocantins, e Venezuela, na bacia do Rio Orinoco
Acidentes com elas são extremamente raros, pois seu ferrão fica na base na cauda, muito difícil ela conseguir ferroar uma pessoa.
📷Michael Tobler
Ao contrário do que muitos pensam, arraias não são animais agressivos, como dito lá em cima, seu ferrão é para defesa, você não vai ver uma arraia nadando atrás de alguém para ferroar.
O que acontece é que outro mecanismo de defesa dela é a camuflagem, eles ficam paradinhas na lama.
📷Shirley Guimaraes.
As pessoas entram na água desavisas e acabam pisando em cima da coitada, obviamente ela vai se defender, ocasionando os acidentes. Mas existe um meio infalível usado há muito tempo e que não falha, anotem aí...
Entre em rios arrastando os pés. Sim, só isso... A ferroada é um reflexo delas quando são pisadas, se elas perceberem que alguém está chegando, vão simplesmente sair. O único fator que gera uma ferroada no pé/perna é pisando em cima.
Obviamente existem os acidentes que ocorrem de outras formas quando os animais são importunados, mas são coisas que podem ser evitadas.
Enfim, esses animais são magníficos e merecem respeito assim como qualquer outro ser vivo. Eles sofrem muito pela ignorância, as pessoas temem o que não conhecem e acabam matando sem necessidade.
Estou à disposição para tirar dúvidas sobre esses peixinhos :)
Referências: ARRAIAS DE ÁGUA DOCE (Chondrichthyes –Potamotrygonidae): BIOLOGIA, VENENO E ACIDENTES. 2013, Juliana Luiza Varjão Lameiras e colaboradores

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25 May
Você sabia que existem Baiacus de água doce que ocorrem no Brasil?
Hoje vou falar um pouquinho sobre os peixinhos que eu estudo.
Segue o fio!
Ao contrário do que muitos pensam, existem peixes da família Tetraodontidae (tetra= quatro/ odonto= dente) em rios brasileiros. A hipótese mais aceita atualmente é que esses animais entraram no continente através de transgressões marinhas, 15-20 ma atrás, durante o Mioceno+
Isso ocorreu com outros animais também, um exemplo que eu gosto muito de usar são as arraias, parentes dos tubarões que se adaptaram muito bem a água doce. No Brasil nós temos a família Potamotrygonidae, comportando mais de 30 espécies de arraias de agua doce.
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24 May
Você sabia que mais de 60% da matriz energética do Brasil é vinda de Usinas Hidrelétricas? Atualmente em território nacional nós temos mais de 700 usinas operantes, que geram e distribuem energia elétrica para o país. Mas você conhece os impactos ambientais causados por elas?
Hoje vou falar para vocês dos impactos ambientais negativos oriundos da instalação de usinas, principalmente sobre a Ictiofauna, que depende dos cursos d’água para sobreviverem e são afetados diretamente por esses empreendimentos.
As usinas hidrelétricas são grandes estruturas geradoras de energia feitas em rios, onde usam a força mecânica da água para impulsionar as turbinas que geram energia. Para garantir o controle do fluxo de água, são construídos barramentos que resultam em grandes reservatórios. Image
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23 May
Olá pessoinhas.
Depois de deixar vcs tristes falando um pouco sobre o desastre do Lago Vitória, hoje vou falar sobre um dos peixes mais incríveis que já nadou nas águas do nosso planeta, o Celacanto!
Primeiramente, o que seria exatamente um Celacanto???
Bem, Celacantos fazem parte de um grupo chamado Actinistia, presente dentro da Classe dos peixes Sarcopterygii, um grupo bem peculiar.
Existem duas principais Classes de peixes ósseos (Osteichthyes) elas são: Actinopterygii e Sarcopterygii, dentre as diversas diferenças que distinguem esses grupos, a principal delas são as nadadeiras +
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21 May
Você provavelmente já deve ter ouvido falar sobre "Introdução de Espécies". Essa é uma das maiores causas de extinções que existem, e hoje eu vou contar um caso pra vocês;
Vamos falar sobre a introdução da Perca do Nilo no segundo maior lago do mundo, e o desastre que isso gerou; Image
O Lago Vitória é o maior corpo de água doce do continente africano, e um dos maiores do mundo, com mais de 68 mil metros quadrados. Ele se encontra sob a jurisdição de 3 países: Tanzânia, Uganda e Quênia, sendo sua maior parte na Tanzânia; Image
Um lago gigante e isolado dentro do continente, é de se esperar que haja uma biodiversidade e um alto grau de endemismo. Esse ambiente proporcionou a evolução de muitos animais. Ali são descritas mais de 190 espécies endêmicas, a maioria ciclídeos, e grande parte já foi extinta.. Image
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26 Apr
As BARATAS são IMPORTANTES para o planeta TERRA?

Por mais que sejam animais que causem medo e repulsa em muita gente, as baratas tem um grande papel em processos essenciais para a vida no planeta Terra. Na thread de hoje, iremos pontuar qual a importância destes bichinhos!
Antes de tudo, é importante pontuar que a menor parte das espécies de baratas causa danos ao ser humano. Das cerca de 4600 espécies que existem, menos de 1% pode transmitir doenças ou danificar a agricultura. As outras 99% são "limpinhas" e devem ser preservadas!
LIXEIRAS NATURAIS?

Baratas urbanas realizam decomposição de restos (incluindo cadáveres) produzidos pelo ser humano. Estes restos, que ocupam lixões e esgotos, contribuem para a poluição do ambiente. Assim, baratas e outros decompositores contribuem para um meio ambiente limpo.
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25 Apr
QUEM SÃO OS ORTÓPTEROS?

A ordem Orthoptera é composta por gafanhotos, grilos, esperanças e paquinhas. Com algumas exceções, estes animais são conhecidos principalmente por duas características: saltos ágeis para a fuga e locomoção e capacidade de emissão de sons.
Os membros desta ordem estão divididos em duas subordens:
> Caelifera - gafanhotos e taquarinhas
> Ensifera - grilos, esperanças e paquinhas
Uma base de dados interessante que pode ser utilizada para ter conhecimento da Taxonomia desta ordem é o Orthoptera Species File (orthoptera.speciesfile.org), que possui imagens e informações sobre sistemática, bioacústica, distribuição etc.
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