Thread by @thiamparo

No artigo na Folha de hoje, Demétrio Magnoli defende o marco temporal como “interpretação óbvia” (não é) e “determinação constitucional” (não está na CF/88). Está tecnicamente errado. 1) anais da Constituinte relevam o que “originário” significa; 2) marco foi inventado p/ 1 caso.

Antes de escrever sandices, Magnoli deveria ler sobre técnicas de interpretação constitucional, p.ex. literal (está na CF?); teleológica (interpretação leva a fim constitucional?); expansiva (progressivamente implementa direitos?); originalista (o que a Constituinte dizia?).

Magnoli em seu texto faz crer que a tese do marco temporal está evidente na CF (não está), e no STF (não está, foi inventado para 1 caso não erga omnes). Seria legal se ele tivesse pesquisado que “originário” significa terras ancestrais (ver anais da Constituinte).

Magnoli faz uma falsa oposição entre direitos de povos indígenas a suas terras e “pobres do campo”. Vamos lá: 1) extrativismo e grilagem que destroem terras indígenas não irá desenvolver “pobres do campo”; 2) violência no campo precariza tanto pobres qto indígenas. É uma asneira.

Quando a CF/88 menciona “terras tradicionalmente ocupadas” e a define como as que os indígenas ocupam “em caráter permanente”, a CF/88 impõe direito subjetivo a estas terras, dever do estado de demarca-las e dever dos demais de não retira-las. Qlquer constitucionalista sabe disso

Estou farto de ter que estudar anos e anos de interpretação constitucional comparada, fazer doutorado nisso, dar aula disso e ter que escutar na TV e ler no jornal pessoas que não sabem nada, absolutamente nada da área mas falam com a arrogância que só o privilégio impõe.

E se formos falar de interpretação originalista - o que nem é usada no Br. - vamos lá. A expressão “direitos originários” já estava no anteprojeto Arinos da CF/88, e nem foi debatida exceto na Subcomissão sobre indígenas para significar terras ancestrais. senado.leg.br/publicacoes/an…

E, sendo eu um constitucionalista negro, é muito fácil que digam “lá vai ele defender uma política identitária”. É fácil desmerecerem a tecnicidade de homens não-brancos. Não, o que estou fazendo é aplicando conhecimento técnico s/ interpretação de direitos constitucionais.

Outro ponto: qdo a CF diz terras tradicionalmente ocupadas, a CF não ignora o passado autoritário do país contra indígenas, tampouco ignora que demarcar terras é um dever-poder da União, não uma benesse discricionária. Recai sobre o Estado, não sobre indígenas, o ônus da inação.

Nem precisa dizer que sou a favor 100% da liberdade de escrever e falar o que quiser, o que inclui a liberdade de passar vergonha, e 100% a favor da pluralidade - que não existe - no debate público, cadê os diversos advogados/as indígenas que falaram no STF nos jornais e na TV?

Sugiro ler análise jurídica de @jusuindara sobre a ausência de consolidação de precedentes a favor do marco temporal. jota.info/opiniao-e-anal…

Leiam a entrevista do advogado indígena @luizeloyterena da @ApibOficial que defende a inconstitucionalidade do marco temporal na @folha. www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/…

Vejam a sustentação oral da advogada indígena @PataxoSamara no STF sobre inconstitucionalidade do marco temporal

https://twitter.com/pataxosamara/status/1433231449612853248

Vejam o poder desta foto, da sustentação oral do advogado indígena Ivo Cípio no STF e da mobilização histórica contra o marco temporal

https://twitter.com/JoeniaWapichana/status/1433174362430099458